sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Os Clássicos da Política 01


  • Sobre o autor: Francisco Correia Weffort nasceu em Quatá, São Paulo, em maio de 1937. Graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), Weffort foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT) e participou de cargos no Governo de Fernando Henrique Cardoso. Suas obras se encontram no campo da Ciência Política e entre as principais, podemos citar: a) O Populismo na Política Brasileira; b) Qual Democracia?; c) Formação do Pensamento Político Brasileiro. 


Os Clássicos da Política 01 - Francisco Weffort - Editora Ática




Introdução - O livro "Os Clássicos da Política 01" de Francisco Weffort é uma coletânea de textos, organizados pelo autor, de grandes nomes da teoria política clássica como: Maquiavel, Hobbes, Locke, Montesquieu, Rousseau e os Federalistas. São 06 capítulos, cada um para cada pensador citado. Weffort o que faz é organizar, compilar para fins puramente didáticos e voltados para estudantes universitários. Trata-se, por isso, de uma leve introdução sobre o pensamento político desses autores clássicos da teoria política. 

01) Nicolau Maquiavel: o cidadão sem fortuna, o intelectual de virtú - Maria Tereza Sadek - O texto aborda vida e obra de Nicolau Maquiavel, nascido na atual Itália em 03 de maio de 1469 e oriundo de família modesta. Seu pai, fora um advogado renascentista e iniciaria Maquiavel nos estudos dos clássicos que já aos 12 anos escrevia em latim e dominava a retórica greco-romana. No tempo de Maquiavel, a atual Itália era um território descentralizado e que por conta de invasões internas/externas se encontrava uma gama de pequenos Estados. Aos 29 anos, Maquiavel ocupou o cargo de segunda chancelaria na República Florentina, sendo demitido em 1512 quando a dinastia Médicis volta ao poder político na região. Preso, Maquiavel só consegue sair da cadeia através da ajuda de um amigo. Porém, permanece desempregado e vivendo uma espécie de exílio na própria terra. E foi morando numa pequena propriedade herdada do pai que Maquiavel vai fazer suas reflexões políticas. Escrito entre 1512 e 1513, a sua célebre obra "O Príncipe" revolucionária a forma de se enxergar política e teve como objetivo aconselhar os Médicis que se encontravam no poder. Sua tentativa era de retornar a postos no Estado, ganhando a confiança da dinastia que governava. Em 1527, os Médicis caem e os republicanos que assumem passam a enxergar mal Maquiavel que outrora dedicou livro para os monarcas. Decepcionado, faleceu em junho do mesmo ano. 

Após esse breve comentários biográfico, a autora entra na teoria política maquiavélica. O foco de Maquiavel é o Estado, sua preocupação é a garantia do funcionamento do Estado numa região marcada pela instabilidade política. Porém, não seria pensar o Estado como ele deve ser, mas como ele é. Maquiavel rompe com as perspectivas de Platão, Aristóteles e Santo Tomás de Aquino e parte para uma abordagem mais próxima de Tácito, Políbio e Tito Lívio. Ele substitui o "dever ser" da filosofia para o "ser". A estabilidade do Estado, seu objetivo, não é dada e sim construída pelos homens em busca de tranquilidade. Porém, essa estabilidade nunca teria validade eterna pois sempre existe a possibilidade de transformações. 

Depois dessa base teórica que Maquiavel segue, a autora parte para sua visão de natureza humana e história. Para ele, existia no homem uma natureza simuladora e que os conflitos são resultados disso. A repetição desses acontecimentos, dava para Maquiavel uma importância ímpar a história que era vista como "um desfile de fatos dos quais se deve extrair do juízo final, mas sim um desfile de fatos dos quais se deve extrair as causas e os meios utilizados para enfrentar o caos resultante da expressão da natureza humana" (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 19). A única força capaz de combater essa natureza era o poder que não tinha origem divina, mas mundana e por isso era repleta de contradições. Só o poder pode combater essa natureza humana simuladora, mas sem garantia de permanência total da ordem. Logo, a política é a constante procura por estabilidade que venha criar uma correlação de forças. 

Da escolha por democracia ou principado, Maquiavel era adepto da ideia de que onde existisse descentralização política era preciso um governo forte que teria na monarquia uma maior segurança. No principado o príncipe não seria um ditador, mas um fundador do Estado. Mas fundado esse Estado e criada as bases estáveis, o caminho para a República pode ser tomado. Para a Itália da época, Maquiavel era convicto da necessidade da figura de um príncipe para que lançasse as bases de uma estabilidade. Por fim, o texto encerra debatendo o conceito de virtú e fortuna em Maquiavel. Enquanto que para os idealistas como Platão e Aristóteles a virtú é uma deusa para "homens virtuosos", em Maquiavel se configura como uma qualidade que um governante deve adquirir para se manter no poder. A honra, a riqueza, a glória e o poder são tentações mundanas e não fruto de uma bondade celestial. O bom governante não é aquele que simplesmente se mostra o mais forte, mas sim aquele que possuí virtú ou amor/respeito dos governados. A força teria sua importância na virtú, pois o governante precisa passar a imagem de que tem condições de resistir a forças externas, transmitindo uma sensação de segurança. O agir de acordo com as necessidades é outro aspecto da virtú, tendo o governante que dosar a repressão e a compaixão. A conclusão da autora é que Maquiavel funda uma nova forma de fazer política, política essa que detém uma moral própria e não vinculada ao divino. A partir de suas reflexões é aberto um novo horizonte teórico que seria desenvolvido nos séculos seguintes. 

02)  Hobbes: o medo e a esperança - Renato Janine Ribeiro - Thomas Hobbes é o primeiro autor contratualista resumido nessa obra. Os filósofos contratualistas são aqueles que entre os séculos XVI e XVIII desenvolveram teorias sobre a origem e o estabelecimento do Estado que, segundo eles, seria firmado através de um contrato social em que os indivíduos estabeleceram as regras de convívio social. Basicamente, a teoria contratualista se baseia em três aspectos. São eles:
  1. Decifrar a natureza humana;
  2. Justificar o contrato social estabelecido;
  3. Explicar como se deu o tratamento com a propriedade em seguida. 
Hobbes, seguido a linha dos filósofos pré século XVIII, não acreditava que a história mudava o homem. Pelo contrário, a natureza humana existe a priori e é imutável. No estado de natureza, onde os homens convivem sem a presença do Estado, impera os conflitos generalizados. Por que? Porque o homem é opaco, logo, não sabe e nunca saberá a ação do outro. Tendo em vista o completo desconhecimento do outro, a racionalidade aponta para que se ataque primeiro a fim de evitar ser pego de surpresa. É a lei da sobrevivência. Para Hobbes esse estado de guerra generalizado é completamente racional no estado de natureza. O indivíduo hobbesiano busca primeiramente a honra, não a riqueza. A riqueza é apenas um meio, mas não o fim último. E o que seria a honra? A honra "é o valor atribuído a alguém em função das aparências exteriores"  (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 59). É imaginando ser forte, traído ou perseguido que o homem instaura um estado de guerra generalizado. 

E como colocar fim a essa guerra? Para Hobbes, tem-se a necessidade de instaurar o Estado. Mas não um Estado qualquer, sim um Estado centralizado e todo poderoso. Para que a ordem seja instalada é preciso que o governante tenha um poder ilimitado. O contrato social surge, então, dos súditos que escolhe um monarca que venha representar o Estado forte, armado e representante da ordem. Esse monarca não participa do contrato, ele é escolhido pelos súditos e por isso não tem nenhuma obrigação para com esses. 

Instaurado o contrato social, como fica a questão da igualdade e da liberdade? A igualdade em Hobbes gera a busca por interesses e consequentemente a guerra generalizada. Logo, seria suprimida após a vigência do contrato social. Enquanto a liberdade do súbito é deixar de obedecer a seu monarca a partir do instante que esse não garantir mais sua vida. Se a igualdade (ou seja, o estado de natureza) gera conflitos e o contrato social é vigorado para assegurar a vida desses súbitos, não há mais razão de obedecer caso o direito à vida for descumprido. Eis então a liberdade hobbesiana. Com as palavras de Janine, podemos resumir a liberdade do súbito da seguinte forma: 
"O soberano não perde a soberania se não atende aos caprichos de cada súdito. Mas, se deixa de proteger à vida de determinado indivíduo, este indivíduo (e só ele) não lhe deve mais sujeição. Os outros não podem aliar-se ao desprotegido, porque o governante continua protegê-lo. E pouco importa se o soberano fere o ex-súdito tendo ou não razão (afinal, repetimos, ninguém pode julgar o soberano)" (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 70).
O Estado hobbesiano é guiado pelo medo. Ou seja, é preciso incitar medo nos súbitos para que esses se mantenham ordeiros. O terror existe no estado de natureza, onde temo pela vida tendo em vista que não posso saber a ação do outro. Com a instauração da paz, através do Estado, o súdito deve respeito ao que foi instituído e o bom súdito (aquele bem comportado) não sofrerá represálias do soberano. Por fim, a propriedade fica nas mãos do soberano. Ele que detém as propriedades e tem o direito de fazer com elas o que deseja. 

03) John Locke e o individualismo liberal - Leonel Itaussu Almeida Mello -  John Locke foi contemporâneo da Revolução Inglesa que transformaria a Inglaterra numa monarquia constitucional ou parlamentarista. Sobre a ideia de natureza humana, Locke se distingue de filósofos como René Descartes que enxergavam uma essência humana a priori. Fundando o Empirismo, Locke afirma que o homem é uma tábula rasa e que por isso todo conhecimento deriva de experiência. 

O estado de natureza em Locke é completamente diferente do pensado por Hobbes. Para Locke, o indivíduo antecedeu a sociedade sendo o estado de natureza a condição plena de liberdade e igualdade entre homens. Porém, o estado de natureza não estava isento de conflitos e por isso fez-se necessário o Estado para resolvê-los. Os conflitos tem início em Locke: começa a partir do advento do dinheiro, quando a concentração de riqueza e a desigual distribuição dos bens maximiza os conflitos. 

Para resolver esses impasses, surge o contrato social que "é um pacto de consentimento em que os homens concordam livremente em formar a sociedade civil para preservar e consolidar ainda mais os direitos possuíam originalmente no estado de natureza" (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 86). Entre as ideias de Locke sobre a instituída sociedade civil, temos: livre consentimento para escolher a melhor forma de governo, controle do executivo pelo legislativo, controle do governo pela sociedade e proteção aos direitos naturais dos homens (a vida, propriedade privada e a liberdade). Por fim, caso o governo descumpra seu papel de proteger a propriedade, o indivíduo tem o direito de se rebelar e formar um novo contrato social. 

04) Montesquieu: sociedade e poder - Guilhon Albuquerque - O autor inicia destacando a importância que Montesquieu teve. Sua teoria, inspirada nos ideais iluministas, tiveram relevância até os dias atuais. Sua famosa teoria dos três poderes serviu como base para a maioria das constituições regidas mundo afora. 

Montesquieu parte de uma perspectiva diferente dos filósofos contratualistas. Enquanto os contratualistas se preocupavam com as razões que deram origem a formação do Estado e a sociedade civil, Montesquieu discute as formas de governo e como essas devem se postar na manutenção da estabilidade. Em suma, a teoria política de Montesquieu se resume em dois eixos: 
  1. Discutir os tipos e a natureza dos governos;
  2. A forma que esses governos devem encontrar na manutenção da estabilidade. 
Antes de entrar em sua teoria política em si, o autor destaca o conceito de lei para Montesquieu. Para o filósofo francês, as leis não são expressões divinas, mais representam relações necessárias entre diversas classes em que se divide a sociedade civil. Montesquieu revoluciona, assim, o conceito de lei. Em sua Teoria dos Três Governos, Montesquieu parte da natureza e princípio desses tipos. A natureza de um governo diz respeito a quem detém o poder e o princípio a justificação. Eis as formas de governos em sua teoria: 
  • A monarquia, regida pelo princípio  da honra. Seria um governo de um só, governando através de leis fixas;
  • A república, regida pelo princípio da virtude. Seria o governo do povo (se tratando de uma democracia) ou de parte dele (se tratando de uma república aristocrática);
  • O despotismo, regido pelo princípio do medo. Seria o governo de um único déspota que governa com base em suas paixões. 
Dentro da monarquia, em caso de corrupção, tínhamos uma tirania. Já dentro da república, em caso de corrupção, tínhamos uma oligarquia. A demagogia seria outra forma de corrupção da república. Em Montesquieu, a república teria difícil implementação pois se baseia na virtude dos homens e no máximo teria êxito num território pequeno. Na república os grandes não a querem e o povo não sabe conduzi-la, depende assim e republicanos virtuosos que são minoria. O despotismo gera constantes rebeliões e consequentemente instabilidade política. Frente a isso, Montesquieu como membro da nobreza francesa, enxerga no regime monárquico como o ideal. Mas não a monarquia absolutista defendida por Thomas Hobbes, sim uma monarquia parlamentar ou constitucional aos moldes ingleses. Por fim, Montesquieu enxergava a república como o governo do passado, a monarquia do presente a o despotismo a ameça que pairava sobre o futuro. 

05) Rousseau: da servidão à liberdade - Milton Meira do Nascimento - Último contratualista estudado, Jean-Jacques Rousseau é o autor que aparece ser o mais coletivista desses filósofos. De imediato Rousseau considera a essência humana boa, entretanto, o meio a corrompe. Ou seja, o homem é produto do meio social em que está inserido. 

Enquanto ao estado de natureza, Rousseau imaginava ser tranquila onde imperava a paz e a igualdade entre os homens. Essa felicidade seria recorrente a ausência de propriedade, sendo essa coletiva e à serviço de todos. O surgimento e avanço da propriedade privada colocaria fim a esse estado de natureza, decorrendo disso o surgimento da divisão social do trabalho. Essa mudança dividiu os homens entre proprietários e não proprietários, subordinados e poderosos, ricos e pobres. Com o surgimento das desigualdades, surgem os conflitos e o aparecimento do Estado é a institucionalização do poder de um punhado de poderosos que utiliza dessa nova instituição o meio de proteger sua propriedade privada. Logo, Rousseau critica o contrato social instituído e propõe outro que realmente sirva a maioria. 

O Estado deve representar a maioria, então soberanas. As leis devem da voz a vontade geral, sendo a expressão dessa soberania. Para Rousseau a vontade geral não pode ser representada, é o próprio povo que deve participar das leis constituintes. O legislativo e o executivo apenas praticam as leis pensadas coletivamente pela maioria. Coletivista, propõe o fim da propriedade privada como meio de combater a desigualdade e instituir a liberdade. Apesar de um grande visionário, Rosseuau era pessimista as suas propostas. Para ele, os homens perderam sua liberdade desde o fim do estado de natureza e com isso as chagas como o individualismo e o egoísmo tornaram-se hegemônicas. Isso dificilmente seria revertido. Suas ideias foram bastante seguidas pelo setor mais revolucionário da Revolução Francesa, os chamados Jacobinos. 

06) "O Federalista": remédios republicanos para males republicanos - Fernando Papaterra Limongi - O capítulo trata dos teóricos chamados de federalistas que ajudaram na construção da primeira Constituição dos EUA, logo após a guerra civil que libertou o país do jugo inglês. Alexander Hamilton, James Madison e John Jay são os teóricos federalistas abordados. Madison é o autor mais focado, tendo em vista sua maior influência que os demais. Hamilton, centralizador, não teve muitas de suas ideias postas em prática. A base filosófica dos federalistas foi o filósofo francês Montesquieu, já resumido aqui. 

O federalismo norte-americano nasce através de acordos políticos entre os estados, representando a convivência desses estados com a União Federal. Para Madison, a natureza humana era ambiciosa e por isso a razão da presença de um Estado era primordial na manutenção da ordem. Esse Estado, todavia, não pode ser centralizador pois daria brecha para que os homens usurpassem do poder. Segundo ele, os homens são governados por outros homens e não por anjos, sendo então necessário regular a máquina estatal. Essa descentralização política ocorreria com base na separação dos poderes pensada por Montesquieu. A diferença é que nos EUA não se tinha condições de instaurar um "governo misto" aos moldes ingleses, onde o Estado fosse dividido entre nobreza, oligarquia e povo. Nessa separação de poderes é preciso cautela para que nenhum deles se sobreponha ao outro. Numa república, o legislativo tende a ter uma autonomia maior sendo necessário a criação de mecanismos como o Senado além de um fortalecimento do judiciário. A lógica é que um poder regule o outro. 

Outro ponto discutido pelos federalistas são as facções, ou seja, a formação de oposição. A oposição é natural, tendo em vista a diversidade do pensamento humano e a desigual divisão da propriedade. Madison acreditava ser essencial dar voz a maioria, porém, governar para a maioria também seria uma forma de tirania. Logo, o remédio para males republicanos é buscar aumentar a área e o número de cidadãos sob a tutela do governo impedindo o desenvolvimento de qualquer extremismo. 







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