terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Sociologia Clássica: Marx, Durkheim e Weber

  • Sobre o autor: Carlos Eduardo Sell é um filósofo brasileiro catarinense com pesquisas na área da Sociologia Política, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica Alemã com foco em Max Weber. Graduou-se em Filosofia pela Fundação Educacional de Brusque em 1994. Cursou mestrado e doutorado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e o pós-doutorado pela Ruprechts-Karl Universitat Heidelberg. Escreveu vários livros, capítulos de livros e artigos. A obra analisada aqui teve sua primeira edição datada de 2001. Porém, a edição resumida brevemente abaixo é a 7º e foi organizada pela Editora Vozes que também publicou do autor: a) Introdução a Sociologia Política; b) Max Weber e a racionalização da vida. Atualmente Sell é professor adjunto do Departamento de Sociologia e Ciência Política da UFSC. 


Sociologia Clássica: Marx, Durkheim e Weber - Carlos Eduardo Sell - Editora Vozes




Introdução - A obra analisada tem cunho introdutório e pode ser utilizada por quem deseja iniciar-se no conhecimento da Sociologia Clássica, composta basicamente pelas ideias de Karl Marx, Émile Durkheim e Max Weber. Com a leitura, é perceptível que os três autores partem de caminhos diferentes e com isso desenvolvem análises não uniformes da realidade social. E essa diversidade de análises é comum da Sociologia e das Ciências Humanas de modo geral. Toda ciência que busca entender os mecanismos das sociedades humanas está fadada a eterna juventude, renovando constantemente conceitos a partir das mudanças históricas. A Sociologia Clássica não tem as mesmas preocupações da Sociologia Contemporânea, por exemplo. Enquanto a primeira, produzida entre o fim do Século XIX e início do Século XX tiveram as "sociedades nacionais" como base a segunda busca investigar outras problemáticas causadas pela "sociedade mundial".

O livro é dividido em 05 capítulos que serão resumidos abaixo, são eles: 1) Origens da Sociologia; 2) Karl Marx; 3) Émile Durkheim; 4) Max Weber; e 5) Sociologia Clássica: análise crítico-comparativa. Sell, a fim de facilitar o entendimento dos autores, faz um recorte. Eis o recorte feito pelo autor:
  • Teoria Sociológica: "métodos de estudo da realidade social" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 13), ou seja, se busca analisar a metodologia ou lente usada pelo autor que o possibilitou compreender os fenômenos sociais; 
  • Teoria da Modernidade: "interpretações quanto as características das relações sociais em tempos modernos" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 13), ou seja, a partir da metodologia usada mostrar as visões que os autores tiveram sobre os fenômenos sociais; 
  • Teoria Política: "discussão sobre os problemas e desafios da vida em sociedade" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 13), ou seja, a partir das visões obtidas mostrar quais as consequências identificadas pelos autores desses novos fenômenos sociais e suas propostas a fim de superar os problemas que surgiam.  
01) Origens da Sociologia - Carlos Eduardo Sell conceitua a Sociologia como uma ciência responsável pela reflexão da modernidade e que só surge a partir do desenvolvimento desta. Através do conhecimento sociológico que a modernidade tomou consciência de si mesma, enquanto novo período da história da humanidade que trazia consigo uma gama de transformações sociais, culturais, políticas e econômicas. Tendo isso como base, Sell destaca que o surgimento da Sociologia só foi possível graças a dois fatores:
  • Fatores Históricos: relativos a uma variedade de transformações ocorridas na estrutura social
  • Fatores Epistemológicos: relativos a transformações na forma de pensar e encarrar a realidade. 
Primeiro, vamos analisar os fatores históricos que influenciaram no surgimento da Sociologia. Para o autor, três foram os acontecimentos que contribuíram para o nascimento de uma ciência da sociedade. São eles: a) Revolução Industrial, trazendo modificações na economia; b) Revolução Francesa, trazendo modificações na política; c) Revolução Científica, trazendo modificações culturais. Vamos analisar ponto a ponto. A Revolução Industrial (a), modificou o âmbito econômico. O advento da maquinofatura implicou diversas mudanças como: aumento da produtividade, urbanização, surgimento de novas classes sociais (burguesia e proletariado), acelerou a noção de tempo e tudo isso acumulado a vários problemas de ordem social como o aumento da pobreza e dos conflitos políticos que tinham o recém proletariado formado como principal ocasionador. A Revolução Francesa (b), modificou o âmbito político. Esse grande acontecimento histórico teve seu desfecho em 1789 e proporcionou a queda do Absolutismo. Em seu lugar se erguia as democracias liberais que garantia o sufrágio eleitoral, os direitos do homem (conhecidos mais tarde como Direitos Humanos) e a valorização das noções de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Por fim, a Revolução Científica (c) veio modificar o âmbito cultural. Essa revolução começa no Século XV com o surgimento do Renascimento que, ligado ao campo das artes, buscou aguçar a ideia do Antropocentrismo (Homem no centro de tudo) em oposição. ao Teocentrismo (Deus acima de tudo). Porém, o Renascimento enquanto movimento cultural foi combatido e só veio ressurgir a partir do Século XVIII com outra roupagem, então chamada de Iluminismo e que tinha uma atenção maior as questões políticas. O Iluminismo permaneceu defendendo Antropocentrismo e acrescentou a ideia de Razão Humana que desenvolvida teria o papel de levar o homem a maturidade. Teóricos como John Locke, Jean-Jacques Rousseau, Voltaire e Montesquieu desenvolveram suas ideias nesse período e foram bastante importantes para a formação de uma futura ciência da sociedade. Resumindo esse processo, Sell faz a seguinte conclusão: 
  1. Aspectos Econômicos: 1.1) IDADE MÉDIA, Economia Agrária; 1.2) IDADE MODERNA, Revolução Industrial; 1.3) IDADE CONTEMPORÂNEA, Economia Industrial
  2. Aspectos Políticos: 2.1) IDADE MÉDIA, Regimes Monárquicos; 2.2) IDADE MODERNA, Revolução Francesa; 2.3) IDADE CONTEMPORÂNEA, Regimes Democráticos
  3. Aspectos Culturais: 3.1) IDADE MÉDIA, Teocentrismo; 3.2) IDADE MODERNA, Renascimento/Iluminismo; 3.3) IDADE CONTEMPORÂNEA, Antropocentrismo
Os autores clássicos da Sociologia produzem teorias no Século XIX e início do Século XX para tentarem responder a várias perguntas que surgiram após todas essas transformações. Eles foram os primeiros intérpretes da modernidade que surgiram e buscaram explicar as diferenças da sociedade do passado com a do presente, buscando solucionar problemas que pudessem afetar o futuro. Das perguntas que surgiram, o autor põe algumas em voga como: a) Quais as causas dessas transformações?; b) Para onde elas apontam?; c) De que modo elas alteram as formas de sociabilidade humana?; d) O que fazer diante desses novos fatos?. Tudo o que surgia rompia com o passado e mostrava novas formas de produção, de distribuição/exercício do poder e de encarar a existência/realidade. Por isso, os autores clássicos da Sociologia vão seguir esse caminho no desenvolvimento de suas teorias: a) Apontar as características da sociedade tradicional; b) Apontar os fatores que produziram as mudanças sociais; c) Por fim, apontar as características da sociedade moderna que eclodia. Disso, Sell nos mostra resumidamente um esquema de como os autores clássicos passearem por esses questionamentos: 
  1. Marx: 1.1) SOCIEDADE TRADICIONAL, Modo de Produção Antigo e Agrária; 2.2) MUDANÇA SOCIAL, Revolução Industrial; 3.3) MODERNIDADE, Modo de Produção Capitalista
  2. Durkheim: 1.1) SOCIEDADE TRADICIONAL, Solidariedade Mecânica; 2.2) MUDANÇA SOCIAL, Divisão Social do Trabalho; 3.3) MODERNIDADE, Solidariedade Orgânica
  3. Weber: 1.1) SOCIEDADE TRADICIONAL, Sociedades Teocêntricas; 2.2) MUDANÇA SOCIAL, Racionalização; 3.3) MODERNIDADE, Sociedade Secularizada. 
Encerrando essa primeira parte - que vem tratar dos fatores históricos - Sell trás à tona a oposição entre Robert Nisbet e Anthony Giddens no que diz respeito a natureza da Sociologia. Para Nisbet a Sociologia é uma ciência que nasce buscando uma nova harmonia social e, por isso, mostra-se essencialmente conservadora. Giddens discorda de tal visão e aponta que ela se firma em 04 mitos, são eles: 1) Mito do problema da ordem, tendo a Sociologia a tarefa de responder as questões trazidas por Thomas Hobbes (como os indivíduos podem viver numa sociedade sem entrar em constante conflito?); 2) Mito das origens conservadoras da Sociologia, ideia errônea de que essa ciência surge através de pensadores contrários aos empreendimentos da Revolução Francesa como De Bonald e De Maistre; 3) Mito da grande cisão, visão de que os ditos fundadores da Sociologia estariam mais preocupados em teorias globais sobre a sociedade enquanto seus continuadores buscaram investir em análises de microssociais ou de médio alcance; 4) Mito da divisão entre integração x coerção, imagina que a Sociologia está dividida entre uma corrente que busca propor uma integração voltada a harmonia social e outra que defende a coerção voltada para o incentivo de conflitos sociais. 

Agora vamos aos fatores epistemológicos. Basicamente, Sell aponta dois fatores que fizeram da Sociologia uma ciência. E o primeiro deles tem ligação com metodologia científica, a partir da adoção do método experimental. E o que foi esse método? O método experimental foi desenvolvido no Século XVI através das reflexões de filósofos como Galileu Galilei, Nicolau Copérnico e Isaac Newton que buscavam explicar os fenômenos naturais fora do crivo da religião. O método experimental segue um passo a passo que seria: a) Observação sistemática dos fenômenos; b) Criação de hipóteses; c) Experimentação; d) Generalização que seria a criação de leis ou teorias gerais sobre os fenômenos estudados. Foi adotando o método experimental que a Sociologia vai chegar ao segundo fator que proporcionou sua criação, a superação ou afastamento da Filosofia Social. Pensar sobre a sociedade e a vida nela vem bem antes de Marx, Durkheim e Weber. Entretanto, só a partir deles que o método experimental foi utilizado para a análise da vida social. Antes predominava a Filosofia Social que se limitava a criar hipóteses, mas sem observação empírica da realidade. Duas foram as fases da Filosofia Social, são elas: 1) Fase Antiga, representada pelas reflexões dos gregos Platão e Aristóteles; 2) Fase Moderna, representada pelas reflexões de Locke, Rousseau e Hobbes. Com a Sociologia a análise do social se abrange para além da simples busca de entender as razões que proporcionaram a existência do Estado e sua manutenção enquanto instituição. 

Porém, a Sociologia não é a única ciência social a fim de compreender a sociedade em que vivemos. Ela divide palco com uma gama de outras ciências como: a História, a Antropologia, a Ciência Política, a Psicologia, a Pedagogia, a Economia etc. Mas o que distingue a Sociologia das demais ciências sociais? Em busca da resposta, o autor cita o sociólogo alemão Jurgen Habermas que pontua "o marco distintivo da Sociologia é o fato de ela não ter se fixado em apenas uma das dimensões da vida social moderna" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 24). Logo, o objetivo da Sociologia é compreender a sociedade de uma forma global em suas estruturas, processos e interações. Eis o esquema criado por Habermas: Economia (Ciência Econômica) - Cultura (Ciência Antropológica) - Política (Ciência Política) - Comunidade Societal (Sociologia). Apesar de buscar uma explicação global da sociedade, existe um recorte dado pelo conhecimento sociológico que "concentrou-se primordialmente no estudo da organização social moderna" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 24). Se entende que existe uma descontinuidade entre a sociedade tradicional com a sociedade moderna, sendo papel dos sociólogos analisar essa última que é baseada na ideia de mudança. Entender as mudanças na modernidade é muito importante para compreender o objeto da Sociologia. Nenhuma sociedade mudou tanto e tão rápido quanto a moderna e isso ocorreu por conta de três processos apontados por Sell, são eles: 
  • Ritmo da mudança: estamos tratando do fator tempo. Nunca se mudou tanto e tão rápido quanto na modernidade tendo a inovação prevalência sobre a tradição; 
  • Escopo da mudança: estamos tratando do fator espaço. Além de obter transformações rápidas a modernidade trouxe transformações de âmbito global, ou seja, trás modificações que se expandem no espaço; 
  • Natureza da mudança: estamos tratando do fator essência. A modernidade trouxe consigo uma série de instituições sociais que praticamente não existiam na sociedade tradicional e por isso reforça sua natureza de descontinuidade com o passado. 
Antes de entrar nos clássicos, Sell faz uma análise sobre Auguste Comte, aquele que fundou a Sociologia (o termo Sociologia foi criado por Comte) enquanto saber científico que busca entender a sociedade. Inicialmente chamada por ele de Física Social, a Sociologia para Comte deveria utilizar dos avanços e ferramentas dos métodos científicos para formular leis gerais sobre a sociedade. Duas foram as influências teóricas de Comte, são elas: a) Condorcet, de onde ele tirou a ideia de que os métodos usados pelas ciências da natureza deveriam ser transferidas para a Sociologia em busca de leis sociais; b) Saint-Simon, de onde tirou a ideia de que a nova sociedade capitalista e moderna que surgiu deveria ter como base a união entre a ciência positiva (representada pelos cientistas e que substituiria o papel da religião no que tange a moral) com os empresários (representados pelos industriais que substituiriam o papel exercido pela aristocracia no mundo feudal) visando o desenvolvimento e a harmonia da nova ordem formada. A partir dessas influências, Comte fundará uma corrente filosófica chamada Positivismo que terá aplicações na Sociologia. O positivismo tem pelo menos dois sentidos segundo o autor, são eles: a) em seu sentido filosófico, significa a valorização do conhecimento científico em detrimento do conhecimento religioso; b) em seu sentido sociológico, significa a aplicação dos métodos das ciências naturais na compreensão dos fenômenos sociais. A Filosofia Positivista é representada pela Lei dos 03 estados que definem, historicamente, como o homem tratou de explicar a realidade em sua volta. São eles: 
  1. Estado Teológico: quando o espírito humano explica a realidade através de fenômenos sobrenaturais. Esse estado teria três fases: a primeira seria o Fetichismo (quando o homem confere poderes sobrenaturais a seres inanimados e aos animais), o Politeísmo (quando o homem confere certos traços humanos aos seres sobrenaturais) e o Monoteísmo (quando o homem concentra sua crença num único Deus);
  2. Estado Metafísico: quando o espírito humano substitui a religião pela filosofia, escolhendo explicar a realidade através de forças abstratas;
  3. Estado Positivo: quando o espírito humano substitui a filosofia pela ciência na compreensão da realidade. 
Logo, "a religião e a filosofia são etapas transitórias na evolução do saber humano e serão substituídas pelo avanço do conhecimento científico. Para a visão positivista, formas de conhecimento que não estejam fundamentadas no método experimental da ciência são destituídos de significado" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 31). Já a Sociologia Positivista em Comte estaria sendo representada pela hierarquização das ciências que para ele segue uma lógica linear da seguinte forma: 

Matemática - Astronomia - Física - Química - Biologia - Sociologia 

A Sociologia seria a última e mais completa ciência no estado positivo, sendo a junção de todas as Ciências Humanas e "sua função seria estabelecer um sistema completo de leis que explicassem o comportamento dos homens na sociedade" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 31). A metodologia da Sociologia Comteana, segue basicamente duas bases. São elas: 
  • Estática Social: estudo da ordem que deve reinar nas sociedades;
  • Dinâmica Social: estudo do progresso das sociedades. 
Tendo tudo isso em mente, Sell mostra que o objetivo da obra é entender as produções de três autores: Marx, Durkheim e Weber. Seu recorte é entender sua Teoria Sociológica (metodologia), da Modernidade (características), Política (desafios e propostas). Essas produções são rapidamente resumidas num esquema: 
  1. Teoria Sociológica: 1.1) Marx: Método Materialista-Dialético /  1.2) Durkheim: Método Funcionalista  /  1.3) Weber: Método Compreensivo-Explicativo
  2. Teoria da Modernidade: 2.1) Marx: Modo de Produção Capitalista  /  2.2) Durkheim: Divisão do Trabalho Social  /  2.3) Weber: Racionalização da Dominação do Mundo
  3. Teoria Política: 3.1) Marx: Revolução Comunista  /  3.2) Durkheim: Culto do Indivíduo  /  3.3) Weber: Liderança Carismática
02) Karl Marx - o filósofo alemão Karl Marx nasceu Trier em 1818 e faleceu em Londres no ano de 1883. Marx começa estudando Direito, desiste e se forma em Filosofia. Foi um seguidor das ideias de Friedrich Hegel e participou de um grupo intitulado esquerda hegeliana. Perseguido por participar da esquerda hegeliana e por ser próximo de Bruno Bauer, Marx tem seus planos de ser professor universitário frustrado e por isso parte para Paris onde começa a se dedicar de vez a militância política. Em solo francês, conhece seu parceiro Friedrich Engels. Também perseguido no país, parte para Bruxelas onde funda a Liga dos Comunistas. Por conta de atividades políticas clandestinas na Alemanha, Marx foge para Londres onde escreve O Capital (sua obra célebre) e funda a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT ou I Internacional). Dentre suas principais obras (além do O Capital já citado), podemos citar: A Ideologia Alemã, Manifesto do Partido Comunista e A Guerra Civil na França. Dentro de uma divisão do pensamento de Marx pensada por Louis Althusser, podemos pensar da seguinte forma sua trajetória intelectual: a) Jovem Marx (Marx filósofo); b) A Ideologia Alemã (escrito em 1846 e sendo um divisor de águas); c) Marx Maduro (Marx economista). Por fim, três foram as correntes teóricas que influenciaram o pensamento de Marx no Século XIX. São elas:
  • Filosofia Alemã: onde influenciado pelas ideias de Hegel, ele vai retirar o método dialético;
  • Socialismo Utópico Francês: onde influenciado pelas ideias de Saint-Simon, Charles Fourier e Roberto Owen ele vai retirar sua crítica ao capitalismo e avançará na formulação do Socialismo Científico
  • Economia Política Inglesa: onde influenciado por Adam Smith e David Ricardo, ele vai colocar o fator trabalho como base para se entender a esfera sócio-econômica que dar sustentação ao modo de produção capitalista. 
Vamos avançar no entendimento da teoria de Marx, começando pela sua Teoria Sociológica ou método de análise da realidade social. Dois conceitos são importantíssimos para entendermos a Teoria Sociológica Marxiana, são eles: a) Materialismo Dialético, baseado na ideia de Tese/Antítese/Síntese; b) Materialismo Histórico, baseado na ideia de Superestrutura e Infraestrutura.  

Antes de entrar no Materialismo Dialético de Marx, precisamos entender a teoria de Hegel. A influência da teoria hegeliana é forte em Marx. Mesmo criticando, Marx não deixa de bebe-lo. Por isso, antes de compreender a dialético marxiana se faz necessário passar pela dialética hegeliana. O que seria a dialética hegeliana? Para melhor entendimento, o autor divide esse conceito sob o aspecto ontológico e metodológico. Sob o ponto de vista do aspecto ontológico, a filosofia hegeliana postula a realidade como devir, ou seja, como palco de constantes transformações. Logo, Hegel se diferencia dos filósofos metafísicos já que na metafísica a realidade possui uma essência que permanece viva apesar das possíveis transformações. Eis então o famoso debate entre "ser" x "vir a ser", iniciado na Grécia Antiga com Heráclito e Parmênides. Mais por que a realidade está em constante transformação? Para Hegel, a realidade se transforma continuamente porque todo ser é contraditório e sua própria existência significa sua negação. Como exemplo, temos a flor que é a negação da semente e, por sua vez, é negada pelo fruto. Temos aqui o chamado princípio da contradição. Enfim, "para Hegel, a ideia de que todos os seres são contraditórios é um princípio que governa toda a realidade. É o fato de que todo ser é contraditório que explica a causa do movimento ou do devir contínuo" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 42). Podemos definir a dialética hegeliana sob duas bases:
  • A realidade é palco de constantes transformações;
  • E a causa dessas transformações é o princípio da contradição.
Dito isso e, ainda debatendo o aspecto ontológico da dialética hegeliana, tudo era pensamento ou ideia. Ou seja, a ideia era o que dava fundamento a realidade. Assim Hegel se distanciava da dicotomia pensamento x matéria, pois achava que a realidade seria a unidade desses opostos. No início, temos o pensamento puro ou a ideia. A ideia sai de si mesma, alienando-se e nesse instante temos a matéria, enquanto negação da ideia. Por fim e unindo esses opostos, temos o espírito. Ideia, matéria e espírito formam o que chamamos por Idealismo Absoluto em Hegel. Esses três polos se movimentam, são a própria realidade que se transforma constantemente. Em Hegel, "a história é o movimento do espírito (ou a ideia) que sai de si mesmo e retorna a si mesmo" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 42). Já sob o aspecto metodológico, a filosofia hegeliana se divide em três partes que dialogam com o que foi dito anteriormente: 
  • Tese: momento de afirmação, ideia em si;
  • Antítese: momento da negação, ideia fora de si;
  • Síntese: momento da superação, ideia em si e para si.
Dando essa base sobre Hegel, vamos ao Marx e sua dialética. Na visão marxiana, a estrutura da filosofia hegeliana não estava totalmente equivocada. O que restava era apenas substituir o fundamento do método dialético hegeliano que estava voltado para a ideia. Em Marx, o fundamento passa a ser a matéria. Partindo da matéria, Marx reformula a dialética hegeliana em prol das suas convicções. Em que estaria baseada a Ontologia Marxiana? Estaria baseada em cinco pressupostos, são eles:
  1. Produção da vida material, ou seja, só existe história humana se os humanos tiverem condições materiais de conduzi-la;
  2. Transformação da vida material, ou seja, o ato de satisfazer nossas necessidades e os instrumentos que utilizamos para tal criam novas necessidades sendo então o fundamento fundador da história;
  3. Reprodução dos homens, ou seja, os homens que buscam condições para sobreviver e que criam novas necessidades são os mesmos que buscam criar novos seres;
  4. Determinação das forças produtivas, ou seja, o modo como se produz determina as relações sociais;
  5. Consciência social, ou seja, a consciência humana existe através de uma teia de relações com outros homens sendo então um produto social.
No Materialismo Dialético de Marx, as partes se configuram da seguinte forma:
  • Tese: matéria/natureza;
  • Antítese: trabalho/homem;
  • Síntese: história/sociedade. 
Marx também se difere de Hegel no aspecto metodológico. Enquanto que em Hegel parte-se do concreto para chegar ao abstrato em Marx ocorre o inverso. O analista, com isso, parte do abstrato e suas generalizações para chegar ao concreto que por sua complexidade tende a ser mais completo e próximo da realidade. Enfim, vimos como Marx e Hegel pensam diferente no que tange ao uso do método dialético que será encontrado na teoria marxiana em conceitos como "contradições de classe", "mercadoria como síntese de valor de uso e de troca" etc. 

Porém, não foi apenas em Hegel que Marx foi influenciado. O filósofo alemão Ludwig Feurbach também exerceu poder sobre Marx e veremos suas contribuições a teoria marxiana agora. Feurbach, assim como Marx, foi um crítico de Hegel e buscou superar seu idealismo sob um ponto de vista materialista. Para ele, a religião representa uma forma de alienação do homem. Isso porque não foi Deus que criou o homem, mas o homem que criou Deus. Um Deus perfeito, onipresente e onisciente é apenas um retrato do que o homem pensa ser. Logo, a ideia de Deus afasta o homem de sua verdadeira essência e por isso não passa de uma alienação. Assim como faz com Hegel, Marx rompe com Feuerbach que não consegue identificar as causas da alienação e nem apontar soluções para o problema. Além disso, o materialismo de Feuerbach aponta para o indivíduo como ser isolado e não como sujeito protagonista de suas relações sociais. Ou seja, os homens são vistos como objetos dados e não como sujeitos ativos. Apesar das críticas, Marx leva para sua carreira intelectual o conceito alienação proposto por Feuerbach e é nos Manuscritos econômico-filosóficos que esse termo surge pela primeira vez em sua obra. Na teoria marxiana, alienação é significa estranhamento e ocorre quando os processos que envolvem o trabalho tornam-se independentes dos homens, alienando sua essência. O trabalho, que deveria satisfazer o homem, passa a impedir o desenvolvimento de sua própria natureza. A causa estaria no sistema capitalista que, regida pela propriedade privada, torna o homem e seu trabalho produtos da alienação. Em Marx, os efeitos da alienação no capitalismo seriam:
  • Alienação do produto do seu trabalho: ou seja, o produto que o trabalhador produz com seu trabalho não é dele, mais sim do proprietário dos meios de produção. Aqui o homem perde o controle sobre o que produz, do objeto do seu trabalho;
  • Alienação do processo de produção: ou seja, o trabalhador não controla os processos que resultam no seu trabalho que é gerenciada pelo proprietário. Aqui o homem perde o como se produz, meio pelo qual trabalha;
  • Alienação de sua própria natureza humana: ou seja, o trabalho que é o fundamento ontológico que faz o homem produzir história, não está mais a seu serviço. Aqui o homem perde o prazer pelo trabalho que está a serviço do capital e não dele;
  • Alienação das próprias relações sociais: ou seja, as relações entre os homens é mediada pelo capital. Aqui as relações sociais se baseiam na dicotomia empregado x empregador ou na simples mercantilização das relações sociais.
Temos, então: uma alienação do produto, da produção, do trabalho e das relações sociais. Marx leva a reflexão que Feurbach fez sobre a religião para o campo do trabalho, então central em sua ontologia. Da junção da dialética hegeliana com o materialismo feuerbachiano, temos o Materialismo Dialético de Marx. Sua teoria obtém duas correntes, a primeira foi a encabeçada por Friedrich Engels e Plekhanov e a segunda por Georg Lukács. Na primeira, o Materialismo Dialético é concebido como um conjunto de leis que explicam a sociedade e também a evolução da natureza. São elas: a) Lei da passagem da quantidade à qualidade; b) Lei da interpretação dos contrários; c) Lei da negação da negação. Já a segunda corrente, capitaneada por Lukács, enxerga a primeira como evolucionista e só enxerga capacidade da dialética ser aplicada a sociedade e não na explicação dos fenômenos naturais. Encerrando o ponto sobre o Materialismo Dialético, o autor enxerga que a obra de Marx desemboca no: a) Individualismo Metodológico, aqui é citado o Manifesto Comunista como obra que postula a valorização da práxis social e consequentemente dar centralidade ao indivíduo na história; b) Holismo Metodológico, aqui é visto Marx dando um enfoque maior as estruturas sociais sobre os atores sociais; c) Dialética entre indivíduo e sociedade, aqui a ambiguidade indivíduo x estrutura é superada através de uma concepção dialética da história humana. Apesar disso, a teoria de Marx é vista como "estruturalista" por se basear bastante nos fatores econômicos como condicionantes dos processos sociais.

O segundo conceito de grande importância na teoria sociológica marxiana é o de Materialismo Histórico. Dentro dessa perspectiva, a história é movida por homens produzindo em busca de sua sobrevivência. Ou seja, a história não é resultado de um Espírito Absoluto (Hegel) mais fruto do trabalho humano. É o modo de produzir que condiciona a vida social, política e cultural dos homens. Em Marx, "o estudo da sociedade tem seu fundamento na economia (vida material do homem), que é o elemento que condiciona todo o desenvolvimento da vida social" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 50). O Materialismo Histórico de Marx divide a análise social em dois aspectos, são eles:
  • Infraestrutura: sendo a soma das Forças Produtivas + Relações de Produção;
  • Superestrutura: sendo a soma da Superestrutura Política + Superestrutura Jurídica + Superestrutura Cultural ou Ideológica
A infraestrutura marxiana trata o trabalho como fator central na economia. Para sobreviver, os homens precisam satisfazer suas necessidades e é através do trabalho que eles conseguem tal objetivo. Trabalhando o homem transforma a natureza, se relaciona uns com os outros e se reproduz. Através do trabalho o homem deixa de ser um mero ser biológico e se torna um ser social, logo "a sociedade é justamente a síntese do eterno processo dialético pelo qual o homem atua sobre a natureza e a transforma" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 51). Temos então a seguinte fórmula:
  • Homem + Trabalho + Sociedade = o homem, através do trabalho, passa de um ser biológico para um ser social e é dessa busca por satisfação de suas necessidades que produz história. 
O conceito de trabalho e suas implicações recebe bastante atenção em Marx, por isso Sell trás o conceito de Processo de Trabalho. Basicamente, processo de trabalho seria a dimensão que o trabalho humano toma na história. Marx divide essa dimensão em duas partes, são elas: a) a relação do homem com a natureza; b) a relação do homem com outros homens. Na relação do homem com a natureza, a relação entre homem/natureza é mediada pela matéria-prima e instrumentos de trabalho que são auxílios que o homem utiliza para interferir na natureza. Essa relação é resumida da seguinte forma: 
  • Matéria-prima + Meios de Produção + Homens = Forças Produtivas
Em Marx, "as forças produtivas da sociedade correspondem a tudo aquilo que é utilizado pelo homem no processo de produção" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 51). Porém, a infraestrutura não se resume a produção em si. Dessa produção, emanam relações sociais e é onde entra a relação do homem com outros homens. No processo de produção o homem se relaciona com outros homens, pois o trabalho é coletivo e não individual. Dessas relações é que são baseadas as sociedades humanas em Marx. Surge então o conceito de relações de produção que "são as interações que os homens estabelecem entre si nas atividades produtivas" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 52). Para se compreender uma sociedade, faz-se necessário analisar dialeticamente a evolução das suas forças produtivas.

Já a superestrutura cumpre a tarefa de sustentar ou dar justificativa a infraestrutura. Em suma, a superestrutura se desenvolve a partir das relações de produção. Dentro dessa superestrutura, Sell destaca as Classes Sociais, o Estado e a Ideologia. As classes sociais "surgem quando um grupo social se apropria das forças ou meios de produção e se torna proprietário dos instrumentos de trabalho" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 52 e 53). A propriedade privada funda a divisão social em classes sociais. Em Marx, a sociedade capitalista e industrial reuniria basicamente a divisão entre proprietários x não proprietários personificada no embate entre burguesia x proletariado. Desse embate, surge então a chamada luta de classes, então motor da história humana. Para se manter vitoriosa dessa luta de classes, a burguesia (classe dominante por deter os meios de produção) precisa obter não só o domínio das ferramentas econômicas (infraestrutura) como também da política e ideológica (superestrutura). Buscando manter seu domínio no plano político, a burguesia cria e organiza o Estado que "é um instrumento criado pelas classes dominantes para garantir seu domínio econômico sobre as outras classes" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 53). Já no plano ideológico ou cultural, a burguesia utilizada da ideologia para manter sua hegemonia. Em suma, "a ideologia é definida então como um conjunto de representações da realidade que servem para legitimar e consolidar o poder das classes dominantes" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 53). É aqui que Marx afirma que as ideias dominantes são uma expressão da classe dominante.

Após conceituar infraestrutura e superestrutura, Sell avança no que tange ao Materialismo Histórico e mostra os tipos de modo de produção que Marx enumerou em suas obras. Para Marx, o estudo sobre as sociedades humanas só é válido com foco no modo de produção da sociedade estudada. Mas, dentro da história, existiram vários modos de produção que chocavam classes sociais diferentes e consequentemente se tinha um quadro diferenciado da luta de classes. Cada modo de produção, desenvolverá classes sociais específicas e dinâmicas diferentes da luta de classes. São 05 os modos de produção já existentes na história, são eles:
  1. Modo de Produção Primitivo: Marx chama de "propriedade tribal" na obra "A Ideologia Alemã". Temos nesse tipo de modo de produção: Ideologia: religião primitiva; Estado: organização tribal; Relações de Produção: propriedade coletiva (sem classes sociais); Forças Produtivas: cultivo comum da terra
  2. Modo de Produção Escravista: Marx chama de "propriedade comunal e estatal" em "A Ideologia Alemã" e "modo de produção antigo" em "Contribuição à Crítica da Economia Política". Temos nesse tipo de modo de produção: Ideologia: religião do Estado; Estado: impérios centralizados; Relações de Produção: senhores x escravos; Forças Produtivas: cultivo da terra com base na escravidão
  3. Modo de Produção Asiático: Marx chama de "modo de produção asiático" em "Contribuição à Crítica da Economia Política". Temos nesse tipo de modo de produção: Ideologia: religião de Estado; Estado: impérios centralizados; Relações de Produção: Estado x escravos; Forças Produtivas: propriedade estatal e escravidão.
  4. Modo de Produção Feudal: Marx chama de "propriedade feudal" em "A Ideologia Alemã". Temos nesse tipo de modo de produção: Ideologia: catolicismo; Estado: poder descentralizado em feudos; Relações de Produção: senhores x servos; Forças Produtivas: cultivo da terra/arrendamento
  5. Modo de Produção Capitalista: Marx chama de "propriedade capitalista" em "A Ideologia Alemã". Temos nesse tipo de modo de produção: Ideologia: cultura burguesa individualista; Estado: Estado parlamentar; Relações de Produção: burguesia x proletariado; Forças Produtivas: indústria
A análise do modo de produção capitalista é o foco de suas obras, sendo a produção burguesa a última forma antagônica do processo de produção social. Após analisar toda a teoria sociológica (aqui vista como sua lente teórica, seu método ou base para a análise social) em Marx, vamos a sua interpretação da Teoria da Modernidade. Ou seja, vamos aprofundar a visão marxiana da modernidade burguesa que aflorou na Europa após as revoluções burguesas e industrial. 

Marx se postava crítico a modernidade e ao sistema político, econômico e social que dela nasceu: o capitalismo. Em 04 livros Marx buscou analisar a origem, as características e as crises desse sistema. Esses livros compõe a obra "O Capital", principal projeto intelectual do autor alemão. Basicamente, a crítica marxiana do capitalismo gira em torno de duas teses: 
  • Tese da Exploração, ou seja, o capitalismo funciona com base na exploração de uma classe social e aqui Marx trás o conceito de Mais-Valia
  • Tese da Alienação, ou seja, o capitalismo faz a vida humana girar em torno do dinheiro e aqui Marx trás o conceito de Fetichismo da Mercadoria.
Sell adentrar nessas duas teses, mas antes faz um panorama da origem do capitalismo em Marx. É no livro I d'O Capital que Marx escreve sobre a origem do capitalismo. Para mostrar de onde veio esse sistema era preciso analisar a origem das duas classes sociais que o criaram: a burguesia e o proletariado. De onde surgiu uma massa de trabalhadores livres forçados a vender sua força de trabalho para sobreviver? E de onde surgiu um capital-dinheiro na mão de capitalistas? Sobre a origem do proletariado, Marx põe o avanço dos cercamentos como principal fator do seu surgimento. Usando à força, alguns proprietários expulsavam camponeses de suas terras. Com a intensificação desse prática, reproduzida pelo Estado e até pela Igreja, formou-se um "exército industrial de reserva, apto e disposto a trabalhar nas indústrias que passaram a se expandir nos séculos XVIII e XIX" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 59). Sem terra, os camponeses pobres eram obrigados a irem buscar empregos nas cidades que eram sede das indústrias nascentes. Surge então o proletariado. E os capitalistas? Esses, chamados de arrendatários capitalistas por empregarem em suas terras trabalhadores oferecendo a esses um salário, tiveram vários fatores a seu favor como: aumento do preço da lã, trigo e carne; inovações tecnológicas que aumentaram a produtividade e o aumento do mercado consumidor (composto por camponeses que compravam o que produziam). O dinheiro advindo da exploração colonial, ajudava esses capitalistas a investirem. Esse processo é chamado por Marx de acumulação de capital e deu origem a classe dos capitalistas. Cada país teve uma formação diferente, sendo a Inglaterra o modelo que Marx se baseia quando descreve a origem dessas classes sociais. 

 Traçando rapidamente a origem do capitalismo, Sell explica a tese da exploração em Marx que tem o conceito de Mais-Valia como central. O básico para se entender a economia capitalista é compreender a mercadoria. O capitalismo é um sistema produtor de mercadorias e toda mercadoria tem um valor de uso (tese) e valor de troca (antítese). O valor de uso se refere a capacidade da mercadoria em satisfazer as necessidades humanas, sendo então o conteúdo da mercadoria ou ela em si. Já o valor de troca é o valor dado a mercadoria, servindo para medir a capacidade que cada mercadoria possui para ser trocada por outra. A síntese daí surge quando a mercadoria reúne, dialeticamente, seu valor de uso e seu valor de troca. Daí surge um problema: como medir a grandeza ou importância do valor de uma mercadoria? Influenciado pela Teoria do Valor-Trabalho de David Ricardo, "Marx vai afirmar que o que determina a grandeza do valor é a quantidade de trabalho socialmente necessário ou o tempo de trabalho socialmente necessário para a produção de um valor de uso" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 60). Em suma, o tempo de trabalho usado na formação de uma mercadoria é o determinante para medir a importância do seu valor. No capitalismo, as mercadorias para serem trocadas entre si precisam de outra mercadoria: o dinheiro. O dinheiro no capitalismo serve como "equivalente geral", sendo então meio de troca para qualquer mercadoria. Ela é a mercadoria onde as outras representam seus valores. Então, "o dinheiro, assim, serve a dois propósitos: servir de meio de troca e de forma de valor (ou equivalente geral das mercadorias)" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 61)

Conceituados os dois elementos centrais na economia capitalista, mercadoria e dinheiro, Marx passa a estudar o processo de troca. No Processo de Circulação Simples ocorre a seguinte fórmula: M   D  M aqui o objetivo é a satisfação da necessidade, começando com um valor de uso e adquirindo outro. Aqui "o dinheiro é um meio de troca que serve para a aquisição de uma mercadoria que vai para a esfera do consumo" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 61). Já na Circulação Capitalista ocorre a seguinte fórmula: D  M  +D aqui o objetivo é o lucro. O dinheiro torna-se mais dinheiro na medida em que a mercadoria serve de valorização do capital. Em vez da necessidade, temos a acumulação como objetivo. E é a acumulação a lei absoluta da economia capitalista.

Mais de onde vem o lucro na circulação capitalista? A origem do lucro em Marx é no processo de produção e não no aumento do preço do produto, pois o que se ganha numa troca se perde em outra. Logo, o lucro se obtém no processo de produção que é onde encontramos um conceito central em sua obra: a Mais-Valia. A Mais-Valia seria quando o trabalhador trabalha mais que o necessário, sendo o trabalho excedente encaminhado para o bolso do patrão. Se sua jornada de trabalha são 6h e com 3h ele já paga seu salário, as 3h restantes vira lucro. Marx tipifica dois tipos de Mais-Valia, são elas:
  • Mais-Valia Absoluta: quando o lucro é obtido pelo aumento da jornada de trabalho
  • Mais-Valia Relativa: quando o lucro é obtido pelo aumento da produtividade
Já a Tese da Alienação se dá quando o homem torna-se objeto e a mercadoria um sujeito. Dessa confusão, Marx cria o conceito de alienação (no jovem Marx) e fetichismo da mercadoria (no Marx maduro). Na alienação, o homem passa a enxergar a mercadoria como um ente vivo distante do seu processo de produção. Ao mesmo tempo o homem tende a mercantilizar à vida e as relações sociais, ou seja, "no capitalismo em vez da produção estar a serviço do homem, é o homem que se encontra dominado pela produção" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 64).

Além de escrever sobre a origem e as características do capitalismo, Marx fala da sua crise. A crise do capitalismo em Marx é resumida por Sell pela teoria da Tendência Decrescente da Taxa de Lucro. O que isso significa? O capitalismo tem como essência a busca por acumulação e essa constante procura por acumulação reduz ela própria. A busca por lucro faz com que o burguês invista mais em produtividade e menos com o salário dos operários. A produtividade é medida pelo conceito de Capital Constante e o salário dos trabalhadores é medido pelo conceito de Capital Variável. Quando o capital constante (produtividade) supera o capital variável (salário pago aos trabalhadores), ocorre a queda da taxa de lucro, pois o lucro advém do tempo não pago aos trabalhadores. Afinal, o trabalho é a fonte de valor para Marx. Essa contradição é intrínseca ao capitalismo e levará a sua destruição como sistema político, econômico e social. Porém, Marx enxerga cinco caminhos que esse sistema pode percorrer para abafar essa crise. São eles:
  1. Aumento do grau de exploração da força de trabalho; 
  2. Redução do salário abaixo do valor; 
  3. Barateamento do capital constante; 
  4. Superpopulação relativa;
  5. Comércio exterior. 
Mas a simples crise econômica do capitalismo não gerará seu fim, segundo Marx. É preciso outros fatores como "consciência de classe, da organização política dos trabalhadores e de sua capacidade de realizar uma revolução que exproprie o poder político das classes burguesas" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 66)

Por fim, vamos a sua Teoria Política. Quando se fala de uma teoria política marxiana, divide-se em dois pontos: 
  1. Jovem Marx, ainda ligado ao hegelianismo, Marx critica as ideias de Hegel que enxergava o Estado como síntese dialética da sociedade (síntese da contradição entre família e sociedade civil). Para o jovem Marx, o Estado estava ligado as contradições da sociedade civil e que era preciso superar essas contradições. Além disso, Marx via o conceito de emancipação política como superficial e ligada aos ideais burgueses da Revolução Francesa. Para ele, era preciso ir além da igualdade, fraternidade e liberdade documental (ou seja, perante a lei) e realizá-lo no plano material (econômico) sendo então necessária uma emancipação social. As obras Crítica da Filosofia do Direito de Hegel e A Questão Judaica são bases dessa primeira fase; 
  2. Marx Maduro, já rompido com o hegelianismo, Marx desenvolve melhor os conceitos de classe social, luta de classes, Estado burguês etc. Aqui é quando ele se encontra com a economia política e passa a teorizar mais sobre o Socialismo que seria o sistema político, econômico e social que surgiria como superação ao capitalismo. As principais obras desse período são Manifesto do Partido Comunista, A Luta de Classes na França e A Guerra Civil na França
O conceito de classe social é central na obra de Marx. Sua teoria sobre o tema ficou inacabada, mas o pouco que escreveu no Livro III de O Capital Marx afirmou que três classes sociais eram fundamentais no capitalismo: a) Burguesia, proprietários de capital; b) Fundiários, proprietários de terras; c) Proletariado, vendedor da força de trabalho. Em Marx, "os conflitos sociais são expressões das contradições econômicas da sociedade, ou seja, da divisão da sociedade em proprietários e não proprietários dos meios de produção. Esta divisão econômica constitui o fundamento de toda divisão e luta política entre os grupos sociais" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 67). O conflito econômico entre as classes sociais é chamado por Marx de luta de classes que estaria presente em toda história humana, porém, em diferentes formatos pois "na medida em que transitamos de um modo de produção para outro, as forças produtivas são apropriadas por novas classes sociais, enquanto outras ficam excluídas dos meios de produção" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 68). Seu foco está na luta de classes que a sociedade capitalista, moderna e industrial desenvolveu. E essa luta está transfigurada entre burguesia e proletariado. No Manifesto Comunista, Marx destaca a relevância e o papel revolucionário que a burguesia desempenhou na derrubada da aristocracia feudal. Derrubado o Feudalismo, a burguesia desenvolveu o capitalismo e tornou-se a classe dominante. Porém, ela forjou o nascimento da classe social que a derrubará: o proletariado. O proletariado, antigos camponeses pobres que foram expulsos da vida rural através dos cercamentos, cumpre a tarefa histórica de derrubar a burguesia e também o capitalismo que a sustenta. Primeiro essa classe passa a atacar as máquinas, depois passa a defender seus direitos através dos sindicatos, se organiza enquanto classe social num partido político e no final desencadeia uma luta revolucionária contra a burguesia visando derruba-la. Porém, para realizar tal façanha é preciso desenvolver o que Marx chamou de consciência de classe. Ou seja, o indivíduo toma consciência que é um vendedor da sua força de trabalho e que essa força de trabalho é roubada por um burguês. Daí sente a necessidade de se organizar politicamente com o intuito de mudar essa realidade. Passa de classe em si para classe para si

Outro conceito bastante utilizado por Marx é o de Estado. O que seria essa instituição na visão marxiana? Nele, Estado representa um instrumento de dominação que uma classe exerce sobre outra. Em todas as suas configurações históricas, o aparelho estatal serviu de controle de um classe a fim de manter outra subjugada. Marx não idealizava o Estado como Hegel, enxergando nele uma instituição que representava os interesses gerais e o bem comum. Se para Hegel o Estado explica a sociedade civil em Marx é a sociedade civil - e suas contradições de classe presentes - que explica o aparelho estatal. E como se encontra essa sociedade civil? Dividida em classes sociais. Temos então uma teoria classista do Estado. Por fim, outros conceitos essenciais de Marx é o de Socialismo e Comunismo. Era grande a preocupação de Marx em não só compreender a sociedade capitalista como supera-la. Ele foi mais que um simples intelectual, foi também um árduo militante político. Para ele, era preciso superar o capitalismo através de uma revolução socialista que socializasse os meios de produção, acabando então com a propriedade privada. Essa revolução seria liderada pelo proletariado, após sua tomada de consciência de classe. O Socialismo em Marx é um sistema político, econômico e social de transição para uma etapa superior da humanidade: o Comunismo. Por enquanto que no Socialismo existe aspectos ou instituições que podemos ter no Capitalismo como o dinheiro, o Estado, a Polícia etc., no Comunismo temos a completa extinção dessas instituições. O Comunismo se pauta numa sociedade sem Estado e sem classes sociais. Proibindo a propriedade privada, aos poucos, as diferenças entre as classes sociais desapareceria. Sem classes sociais, a existência do aparelho estatal torna-se então inútil. 

03) Émile Durkheim - o sociólogo francês Émile Durkheim nasceu Epinal, cidade situada na região da Alsácia. Estudou no Liceu Louis Le Grand e na École Normale Superiéure em Paris, onde recebeu influência de professores como Fouster de Coulanges, Charles Renovier e Émile Boutrox. A tarefa intelectual de Durkheim foi, em fins do século XIX, constituir a Sociologia enquanto uma ciência. Contemporâneo a autores como Frédéric Le Play, René Worms e Gabriel Tarde conseguiu transformar a Sociologia em disciplina acadêmico em Bourdeux, onde trabalhou na primeira fase de sua trajetória intelectual. Na segunda, Durkheim trabalhou na cidade de Paris. Seu trabalho rendeu frutos e no futuro ele conseguiria fundar a chamada Escola Sociológica Francesa que exerceu bastante influência sobre a construção do conhecimento das Ciências Sociais, principalmente, a Sociologia e a Antropologia. Entre suas principais obras, podemos citar: a) A Divisão Social do Trabalho; b) As Regras do Método Sociológico; c) O Suicídio; d) As Formas Elementares da Vida Religiosa.

Entre os autores que estudaram suas obras, alguns como Talcott Parsons e Steven Lukes acreditam que a teoria sociológica durkheiminiana se divide em duas partes. A primeira quando trabalhava em Bourdeux, onde tinha uma forte influência materialista e positivista, e uma segunda após sua ida para Paris. Lá é onde Durkheim escreve "As Formas Elementares da Vida Religiosa", obra considerada culturalista para os analistas citados. Já Anthony Giddens e Robert Nisbet não acreditam nessa divisão da obra de Durkheim, achando que existe uma linearidade em seus escritos. Dentre as principais influências intelectuais em Durkheim, podemos citar:
  • O Positivismo, professado por Auguste Comte que trazia a razão humana e o conhecimento científico como único meio viável de explicar a realidade; 
  • O Evolucionismo, iniciado por Charles Darwim nas Ciências da Natureza e por Herbert Spencer nas Ciências Humanas, e sua ideia de evolução
  • O Idealismo, graças a sua influência em professores neokantianos durante seus anos como estudante. 
Partindo para sua Teoria Sociológica, podemos constatar que segundo o autor a obra de Durkheim tem como base dois princípios: 
  • Resgate a visão positivista de ciência, ou seja, para Durkheim a Sociologia deveria aplicar princípios metodológicos das Ciências da Natureza na explicação das sociedades. Se as sociedades fazem parte da natureza, então regidas por leis naturais, as sociedades humanas também estaria em volta de leis sociais que deveriam ser investigadas e desvendadas pelo sociólogo; 
  • Holismo Metodológico, ou seja, a ideia de que a sociedade e as instituições sociais que ela forja exerce a priori uma influência sobre o comportamento individual. Sobre esse o Holismo Metodológica, afirma Sell que "o que ele desejava ressaltar é que uma vez criada pelo homem, as estruturas sociais passam a funcionar de modo independente dos atores sociais, condicionando suas ações" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 81)
E como Durkheim desenvolve sua ideia de Holismo Metodológico? Na prática, ele afirmava ser necessário em qualquer pesquisa sociológica tomar os seguintes passos metodológicos: a) define o objeto a ser analisado; b) observa o objeto; c) classifica o objeto; d) explica o objeto. 

Sobre o ponto A, Durkheim afirmava que o objeto de estudo da Sociologia eram os Fatos Sociais. O que seria isso? Seriam formas de agir onde a consciência coletiva paira sobre a individual, fazendo exercer a influência do primeiro sobre o segundo. E quais as características dos Fatos Sociais? Eles apresentam duas:

FATOS SOCIAIS: a) apresentam uma exterioridade, ou seja, estão presentes na sociedade e influenciam diretamente o comportamento individual; b) apresentam uma coercitividade, ou seja, exercem sobre os indivíduos uma influência coercitiva/repressiva em caso de desobediência das regras postas pela sociedade. 

Definido o objeto da Sociologia, Durkheim passa mostra como devemos observá-los. Em sua teoria, "o sociólogo deve olhar seu objeto de estudo com o mesmo espírito de exterioridade com o qual os pesquisadores das ciências exatas compreendem a natureza" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 83/84). Em suma, Durkheim desejava dar a Sociologia o rótulo de conhecimento científico e por isso acreditava que o único caminho viável era tornar advogar a objetividade na análise social mantendo o sociólogo distante do objeto por ele investigado. Para realizar bem essa tarefa, caminhos são apontados como: a) se distanciar do conhecimento prévio, aquele produzido e compartilhado pelo senso comum; b) investigar um grupo previamente escolhido e que tenham similaridades; c) se esforçar para apresentar uma análise que se distancie da pura manifestação individual

Sobre a classificação dos Fatos Sociais, Durkheim enxerga dois formas principais. A primeira é a faceta normal dos Fatos Sociais, quando esse se apresenta com certa regularidade na vida social representando um estado de harmonia ou normalidade, e a segunda é a faceta patológica onde temos comportamentos desviantes do considerado comum. Por fim, após definido o objeto, sua observação e classificação é necessário explicá-lo. Em Durkheim a explicação dos Fatos Sociais não se faz a partir da projeção individual e identificar um fenômeno não significa sua explicação. Para explicar, a teoria durkheiminiana desenvolve o conceito de Função Social. Basicamente, a explicação dos Fatos Sociais devem ser acompanhados de dois passos. São eles: Passo 01) explicação causal, onde o sociólogo irá analisar a origem dos Fatos Sociais; Passo 02) explicação funcional, onde o sociólogo irá explicar a utilidade daquele Fato Social para a sociedade em que está inserido. Em suma, "o fundamental é identificar a que tipo de necessidade corresponde qualquer fenômeno ou fato social e de que forma ele contribui para produzir a harmonia social" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 86)

Em sua Teoria da Modernidade, Durkheim busca analisar as consequências da divisão social do trabalho (e da sua consequente autonomia individual) na integração entre os indivíduos. Sua preocupação, acima de tudo, era enxergar como os indivíduos se integravam nessa nova forma de sociedade que se desenvolvia na Europa. Para entender o antes e o depois, Durkheim divide a sua preocupação com a integração social em dois tipos de solidariedade social: a) Solidariedade Mecânica; b) Solidariedade Orgânica. Aqui enxergamos facilmente sua influência evolucionista, tendo em vista que um tipo de solidariedade corresponde a uma evolução da outra sendo a Orgânica a representante da sociedade moderna, industrial e capitalista em que ele estava inserido. Esses dois tipos de solidariedade representam formas de como os indivíduos se portam na sociedade, frente as instituições e grupos sociais que dela emana.

Na Solidariedade Mecânica, típica de sociedades homogêneas onde os indivíduos partilham de uma teia de ações e práticas semelhantes com a diversidade de funções sendo mínima, o que forja juridicamente é o Direito Repressivo que ao predominar a punição busca mostrar aos demais do grupo as consequências de quem viola as regras. O direito aqui não tem um objetivo de restabelecer a ordem, mas de punir. Já na Solidariedade Orgânica, típica de sociedades heterogêneas onde a diversidade de funções é presente, não é a consciência coletiva que impera mais a individual tendo em vista a autonomia dada ao indivíduo em meio a diversidade de funções. Porém, em Durkheim, é essa individualidade que cria uma nova moral. Logo, "a solidariedade orgânica não é um efeito indireto e mecânico da busca da satisfação dos interesses pessoais" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 91). Se assim fosse, não teríamos a formação de uma moral. Pelo contrário, o indivíduo se sente parte de um grupo e o grupo (leia-se sociedade) se sente responsável pelo indivíduo. Resumindo os aspectos desses dois tipos de solidariedade, conceito tão caro a teoria durkheminiana, podemos definir em palavras-chaves da seguinte forma:
  • Solidariedade Mecânica: Sociedades Tribais/Segmentadas/Homogêneas + Consciência Coletiva + Direito Repressivo; 
  • Solidariedade Orgânica: Sociedades Modernas/Industriais/Heterogêneas + Autonomia Individual + Direito Restitutivo + Divisão Social do Trabalho. 
E como Durkheim enxergou a mudança social de um tipo de solidariedade social para outro? Sobre a ideia e prática de mudança social, Durkheim acreditava que três aspectos contribuíam para as transformações sociais. São elas: 
  • Volume: aumento do número de indivíduos;
  • Densidade Material: indivíduos sobre um determinado território;
  • Densidade Moral: comunicação entre esses indivíduos. 
Se Marx tinha uma preocupação com o aspecto econômico no que tange a sociedade moderna, Durkheim concentrava suas reflexões no aspecto moral. Sua ideia de que os laços de integração entre os indivíduos estavam em crise, permeou suas reflexões sociológicas. Com isso, desenvolveu o conceito de Anomia Social que basicamente seriam desajustes encontrados na sociedade moderna que tiravam a harmonia social e por isso precisavam ser solução. Essas patologias sociais, termo cunhado pelo próprio Durkheim o que demonstra sua influência nas Ciências Naturais, se expressam de diferentes maneiras e são classificadas pelo sociólogo francês da seguinte forma: 
  • Divisão de Trabalho Anômica: aqui Durkheim critica as grandes crises econômicas e o antagonismo entre capital e trabalho como fonte de desestabilização e anomia; 
  • Divisão do Trabalho Forçada: aqui Durkheim critica as grandes desigualdades, tendo em vista que a guerra de classes fazia com que certos indivíduos fossem obrigados a aceitar determinada posição na divisão social do trabalho; 
  • Divisão do Trabalho Burocrática: aqui Durkheim critica a burocracia que não consegue atrelar especialização das funções a produtividade acarretando com isso mais um tipo de patologia social. 
O suicídio foi um fenômeno social bastante estudando por Durkheim, sendo um exemplo dessa sua preocupação com a integração dos indivíduos na sociedade. Buscando facilitar o entendimento sobre a temática, até então explicada exclusivamente sob aspectos psicológicos e individuais, ele divide os suicídios em 04 que estão subdivididos em 02 grupos. São os tipos de suicídio em Durkheim: 

Grupo Integração Social
  • Suicídio Egoísta, praticado por um excesso de individualismo e gerado por uma desconexão entre o indivíduo e os grupos e instituições sociais. Estado de melancolia e depressão gerado por grandes crises econômicas ou sociais pode ser considerado um exemplo;
  • Suicídio Altruísta, praticado por um excesso de coletivismo ao ponto do indivíduo aceitar sacrificar sua vida por um determinado grupo social. O sacrifício de soldados kamikazes pode ser considerado um exemplo; 
Grupo Regulação Social
  • Suicídio Anômico, praticado por uma ausência de regulamento social. Grandes guerras são exemplos desse tipo de suicídio; 
  • Suicídio Fatalista, praticando por um excesso de regulação social. Sociedades altamente disciplinadoras como a japonesa, pode ser um exemplo desse tipo de suicídio. 
Sendo assim, "no primeiro par (egoísmo x altruísmo), o que temos são problemas na ordem de integração social, de tal maneira que suas aspirações e desejos ficam anulados por uma disciplina excessivamente opressiva" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 94). Enquanto que "a segunda polaridade (anomia x fatalismo) diz respeito à dimensão da regulação social e envolve a capacidade da sociedade em controlar, mediante as normas morais, os desejos e as aspirações sempre infinitos dos indivíduos" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 94).

Por fim, sua Teoria Política tem aspectos que reforçam toda sua forma de analisar a sociedade moderna. No que tange ao campo moral em que está preocupado, o egoísmo deve ser combatido moralmente sem interferir no culto ao indivíduo que deve incentivar "a valorização da figura do homem e o respeito pela pessoa humana" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 101). Como solução ao excesso de individualismo, grande mal da modernidade, Durkheim tinha propostas que envolvia a formação de uma moral profissional. Seguindo a premissa de que a família e a religião estavam enfraquecendo, enquanto o Estado era uma instituição distante dos indivíduos, ele propõe que cada atividade social especializada formule um conjunto de normas a serem obedecidas. Essa moral profissional nova seria expressada através de corporações que teria o papel de apaziguar os conflitos entre capital/trabalho. Por fim, Durkheim fala dos papéis do Estado e da educação na formação de uma moral social mais adequada. O Estado, primeiramente, deveria permitir a representação profissional no parlamento como forma de fortalecer a moral profissional. Já a educação pública em Durkheim deve conter entre suas características a laicidade do ensino, racionalidade, disciplina e forte teor coletivista.

04) Max Weber - Maximiliam Carl Emil Weber nasceu na cidade de Erfurt, atual Alemanha. Sua vida acadêmica foi marcada por passagens em diversas universidades, como: a Universidade de Berlim, Heidelberg, Viena, Freiburg e Munique. Dentre sua vasta produção intelectual, podemos destacar obras como: a) A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo; b) Ciência e Política: duas vocações; c) Economia e Sociedade. No que tange as suas influências intelectuais, destaca Sell:
  • Na Filosofia, o pensamento de Immanuel Kant, os Neokantianos (Dilthey, Windelband e Rickert) e também do compatriota Friedrich Nietzsche. Dos primeiros herda a valorização do papel do sujeito, já do último pega sua visão pessimista da sociedade moderna; 
  • Na Economia, recebeu influência da chamada Escola Histórica de Economia principalmente das ideias de Carl Menger
  • Na Sociologia, fez parte e dialogou com a chamada Associação Alemã de Sociologia onde junto com autores como Georg Simmel e Ferdinand Tonnies fez-se pioneiro na pesquisa sociológica no país. 
Em sua Teoria Sociológica observamos com Weber uma diferença gritante em comparação com os outros autores clássicos da Sociologia. Nele, o foco é no sujeito sendo esse o elemento explicativo na explicação da sociedade. Essa ideia que parte do sujeito para o social é chamada por Sociologia Compreensiva, escola sociológica fundada pelo autor. 

As ideias de Weber partiam de uma crítica ao pensamento positivista que considerava ser possível explicar a sociedade com base na formulação de leis sociais. Sua epistemologia reúne outro modo de enxergar a realidade e concentra sua influência em dois filósofos Neokantianos: Wilhelm Dilthey e Wilhelm Windelband. Dilthey, acreditava que a grande diferença entre as ciências da natureza e as ciências humanas (divisão teórica evitada por teóricos positivistas que buscavam transpor ferramentas da primeira para a segunda) estava no plano ontológico. Ou seja, a diferença reside no objeto e na essência deste. A essência do objeto estudado pelas ciências da natureza tinha um caráter exterior ao homem, logo, partia-se para sua explicação. Enquanto que o objeto das ciências humanas se encontrava exterior e interior ao sujeito, partindo então para a compreensão. Aqui não se explica com base em leis, mas na busca do sentido das coisas. Por outro lado, Windelband afirma que a diferença entre essas ciências se encontra na sua epistemologia. Ou seja, se encontra no método utilizado para se estudar o objeto e não na essência do objeto. As ciências da natureza adotavam um método generalizante, enquanto as ciências humanas buscava um método idealizante. Por fim, ainda temos as ideias de Heinrick Rickert que afirmava que as ciências humanas eram movidas pelos valores do pesquisador, diferente das ciências da natureza que tinham uma feição mais impessoal. 

E o que conclui Weber diante dessas ideias? Simples, ele acreditava ser necessário unir o ponto de vista de todos os envolvidos. Isso porque "pelo método individualizante (também hermenêutico ou interpretativo), o cientista social seleciona os dados da realidade que deseja pesquisar, destacando a singularidade e os traços que definem seu objeto" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 113). Enquanto que "do método generalizante o princípio da causalidade (método explicativo ou naturalista) que busca estabelecer relações entre os fenômenos, evidenciando que determinados eventos podem ser explicados a partir de determinadas causas que geram este mesmo fenômeno" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 113). Na epistemologia weberiana, uni-se as duas perspectivas e enquanto uma busca selecionar os dados a outra explora as relações que esse tem com o objeto. Logo, 

Método Generalizante + Método Individualizante = Epistemologia Weberiana

Então, como podemos observar na prática essa epistemologia weberiana que reúne as reflexões neokantianas resumidas acima? Simples, a prática gira em torno do conceito de Tipos Ideais. A captação da realidade em Weber, diferente das formas pensadas por Aristóteles (de onde o positivismo vai beber) e Hegel (de onde Marx vai retirar). Para Aristóteles a explicação da realidade se encontra na própria realidade, já em Hegel a explicação da realidade se encontra numa relação dialética entre ela e o sujeito. Para Weber, influenciado aqui por Kant, a explicação da realidade está presente no sujeito. Estando no sujeito, é impossível alcançar na explicação total da realidade. É inacessível explicar a realidade em sua mais completa realidade. Por isso, o sujeito cria os tipos ideias como conceitos que procuram se aproximar da explicação da realidade. Sendo assim, "os conceitos típico-ideais são apenas um meio que o pesquisador possui para organizar a realidade de forma lógica, no plano do pensamento, sem a pretensão de traduzir exatamente a estrutura do mundo" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 114). Sendo um meio, encontrado pelo sujeito, de organizar logicamente à realidade os tipos ideias se dividem em duas esferas: 1) Esfera Subjetiva, onde através de uma construção mental o sujeito indaga; 2) Esfera Objetiva, onde de forma ideal ele busca criar conceitos que se aproximem da realidade. 

Além do conceito de tipos ideias, outro ponto a ser destacado é a própria metodologia de Weber na análise social. Sua visão passa pelo individualismo metodológico já pincelado aqui, seu ponto de partida é o sujeito. O ponto de partida em Weber é a análise dos comportamentos individuais que são englobados por ele no conceito de Ação Social. Sendo assim, a Sociologia se debruçaria pelo desenvolvimento e consequências das ações sociais. Ela deve compreender o curso e explicar os efeitos, sendo uma Sociologia Compreensiva-Explicativa. Mas o que seria ação social? Para Weber, seria uma ação que visa orientar-se para outrem sendo uma relação entre o agente com outros agentes. A Sociologia deve explicar e compreender o contexto das ações sociais, ou seja, "seu objetivo é compreender o significado da ação social e, desta forma, mostrar o que move estas mesmas ações" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 118). Usando os tipos ideias já explicados acima, Weber engloba as ações sociais em 04 tipos: 
  • Ação Social com relação a fins - ação motivada por objetivos racionais, utilitários e calculados pelo sujeito;
  • Ação Social com relação a valores - ação motivada por valores, sejam eles negativos ou positivos, com base em convicções alicerçadas; 
  • Ação Social afetiva - ação motivada por emoções do sujeito, denotando impulsividade; 
  • Ação Social tradicional - ação motivada por hábitos tradicionais executados quase sem nenhuma reflexão. 
O conceito de ação social é de extrema importância para Weber ao ponto de dar sentido a outros conceitos caros a Sociologia. Por exemplo, o conceito de relações sociais em Weber diz respeito as trocas de ações sociais. A estruturas sociais são as orientações dadas as ações sociais, por fim, as instituições sociais são as sistematizações das estruturas. 

Em sua Teoria da Modernidade, Weber busca explicar a origem, o desenvolvimento e as consequências da modernidade. Para isso, concentra suas críticas nas consequências que para ele se resumem a falta de liberdade e perca de sentido da vida. As ferramentas que ele utiliza são vários, desde o conceito de racionalização até o espírito do capitalismo sob forte influência protestante. 

A modernidade para Weber é resultado de um longo e complexo processo social por ele chamado de Racionalização. O processo de racionalização é dividido entre um lado positivo e outro negativo. Seu lado positivo foi o domínio do mundo pela ciência, já seu negativo se encontra na perca de liberdade e perca de sentido da vida a serem melhor explicados mais adiante. E qual a origem desse processo? Para Weber, o processo de racionalização tem origem na formação do capitalismo moderno que por sua vez receberá forte influência de um grande acontecimento histórico: a Reforma Protestante. Antes de mais nada é preciso deixar claro a perspectiva de capitalismo pensada por Weber. Sua visão desse sistema não era meramente econômica, pois seu objetivo é captar a moral que guiou o desenvolvimento desse sistema. A moral que desenvolveu foi a moral protestante, especificamente a calvinista e dessa relação entre ética protestante e conduta capitalista podemos tirar comportamentos como: sentido do dever, disciplina e dedicação ao trabalho. Em suma, "Weber está interessado em verificar qual a relação entre determinada religião e a conduta de vida adequada ao moderno sistema econômico capitalista-industrial" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 125)

Então, em que se baseia e qual a origem desse espírito capitalista que contém influência protestante? O espírito capitalista se define na organização empresarial do trabalho e na visão do trabalho como dever. Da Reforma Protestante, importantes acréscimos são feitos. De Martinho Lutero, principal líder do movimento religioso, a ideia de "vocação" é bastante ovacionada pois presumia que o indivíduo deve se dedicar com afinco as suas aptidões. Porém, o Calvinismo acrescenta a essa ideia um fator psicológico importante: a ideia da predestinação. No Calvinismo os homens são predestinados a salvação e a condenação, ou seja, já nascem marcados por uma ou por outra. Porém, somente Deus tinha conhecimento do caminho que iria ser trilhado pelo indivíduo. Não sabendo se iria ou não ser salvo, nasce então uma angústia. Daí, "a pregação advinda da práxis moral do calvinismo recomendava que o indivíduo tivesse como dever considerar-se salvo e, além disso, considerar o trabalho profissional sem descanso como meio mais eficiente para conseguir esta autoconfiança" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 128). O resultado dessa junção foi o desenvolvimento de um trabalho metódico, profissionalizado, racional e em busca da riqueza que não era mais condenada caso não fosse utilizada como meio de perversão. Temos então a formação de um homo economicus que será a base moral da ética capitalista. 

E quais as consequências desse processo de racionalização que formou a ética capitalista resumida acima? Temos o desencantamento do mundo moderno, representado pelo enfraquecimento das explicações mágicas do mundo. Em suma, 
"Se o puritano fez do trabalho um meio em busca da salvação, a racionalidade inerente ao mundo industrial moderno fez do trabalho uma atividade cujo fim é ele mesmo. Trata-se de uma racionalidade que aumentou a produtividade, mas escravizou o homem" (SELL, Carlos Eduardo. 2015, p. 139)
Por último, a Teoria Política weberiana gira em torno do que Sell chama de "Realpolitik". Ou seja, sua análise não é da política ideal mais sim da conquista realista e real pelo poder. Sua preocupação na política do seu tempo era com a utilização que aristocracia feudal alemã, chefiada por Bismark, tinha do Estado alemão. Suas ações, segundo Weber, aumentava a burocratização do Estado o que tornou sua grande preocupação. Sua ira era com a burguesia alemã, então incapaz de chefiar o Estado aos moldes do que fazia as burguesias francesas e inglesas. Para ele, a formação de lideranças era de extrema importância para a superação desse impasse. Inicialmente em 1917, num artigo chamado "Parlamento e Governo na Alemanha Reordenada", Weber propõe o fortalecimento do parlamento como caminho viável na construção dessas lideranças. Mas já em 1919, em outro artigo agora intitulado de "O Presidente do Reich", ele muda de posicionamento e passa a defender o presidencialismo como alternativa para a construção dessas lideranças chamados por ele no texto como "líder cesarista".

Entre os tipos de democracia pensados por Weber, temos: a) Democracia Grega; b) Democracia Parlamentar; c) Democracia Conselhista; d) Democracia Plebiscitária. Em sua teoria política faz-se necessário compreender alguns conceitos-chaves como:
  • Política: visto como a busca pela participação do poder; 
  • Poder: imposição de uma vontade numa relação;
  • Dominação: nível de aceitação do poder; 
  • Estado: instituição ou comunidade que detém o monopólio da violência. 
Dentro da dominação política, Weber (utilizando a ferramente dos tipos ideias) enxerga a existência de 03 tipos: 
  1. Dominação Legal: aquela legitimada por aparatos institucionais;
  2. Dominação Tradicional: aquela legitimada pela crença em hábitos tradicionais;
  3. Dominação Carismática: aquela legitimada pela virtude do governante





























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