segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Evolução Política do Brasil: colônia e império


  • Sobre o autor: Caio Prado Júnior nasceu em 11 de fevereiro de 1907 em São Paulo. De origem abastada, Caio formou-se em Direito pela Faculdade do Largo de São Francisco em 1928. Decepcionado com a Revolução de 30, filiou-se ao Partido Comunista do Brasil (PCB) em 1931, onde teria uma longa atividade política. Presidiu em São Paulo a Aliança Nacional Libertadora (ANL) e após o fim do Estado Novo seria eleito deputado estadual pelo PCB. Junto com Monteiro Lobato, fundou a Editora Brasiliense e durante a Ditadura Militar foi perseguido e preso pelas forças reacionárias. Como intelectual, foi um dos pioneiros na análise da sociedade brasileiro com base na teoria marxiana. Dentre suas principais obras, além desta que resumiremos abaixo, podemos citar: a) Formação do Brasil Contemporâneo; b) A Revolução Brasileira; c) História Econômica do Brasil; d) O que é Filosofia. Caio Prado faleceu em São Paulo no dia 23 de novembro de 1990. 


Evolução Política do Brasil: colônia e império - Caio Prado Júnior - Editora Brasiliense




Introdução - O presente livro foi publicado em 1933 e tinha como objetivo fazer uma síntese da história do Brasil. A obra revolucionou à historiografia brasileira ao trazer uma perspectiva onde o protagonista dos acontecimentos não eram mais os grandes personagens que representavam as classes dominantes, mas as massas com suas pautas reivindicatórias. Livro fino, é dividido em 04 capítulos. São eles: 01) A Colônia, analisando o país de 1500 até os conflitos contra os holandeses; 02) A Colônia, analisando o país dos conflitos contra os holandeses até à Independência em 1822; 03) A Revolução, analisando o país da vinda a partir da vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil até o Segundo Reinado; 04) O Império, analisando todo o Segundo Reinado até a Proclamação da República em 1889. 

Já no prefácio (correspondente a sua 1º edição em 1933), Caio Prado afirma não ser à obra uma história do Brasil. Por seu pequeno tamanho, seria um simples ensaio sobre os principais acontecimentos históricos que marcaram o país. Esse ensaio trás uma perspectiva histórica diferente, sua análise não se baseia na simples descrição de fatos históricos enaltecendo figuras ligadas as classes dirigentes. O formato de ensaio, curto e resumido também é interessante por conseguir abarcar uma maior variedade de leitores que uma obra mais específica, grande e com riquezas de detalhes não poderia alcançar. 

Capítulo 01 -  A Colônia

Esse primeiro capítulo é dividido em quatro partes, resumidas abaixo: 
  • Caráter Geral da Colonização - Burguesia comercial portuguesa; rápido abandono; Capitanias Hereditárias; Governos Gerais; Sesmarias; Inexistência de Feudalismo. 
  • A Economia Colonial - Predomínio rural; Grande propriedade agrícola; Comércio frágil e ambulante; Industria frágil e necessidade de importar dos engenhos; Combate a pequena propriedade rural. 
  • A Sociedade Colonial - Senhor de engenho; Pequenos proprietários; Semiescravos; Escravos.
  • Estatuto Político da Colônia - Senhores de engenho; Câmaras Municipais. 
Em Caráter Geral da Colonização, Caio Prado vai debater os primeiros anos da colonização brasileira, indo de 1500 até a instituição do Governo Geral. De imediato, o autor destaca a dificuldade encontrada por Portugal (país pequeno, pouco populoso e que vivia do comércio) em explorar um grande e desconhecido território como o Brasil. A expansão portuguesa, liderada por sua burguesia comercial, não tinha como motivo principal o excesso populacional. Pelo contrário, a burguesia portuguesa saía do país em busca de lucro que no seu próprio território não era possível obter. O início da hegemonia portuguesa começa em 1415, quando ocupam Ceuta em África. De lá, chegam na Ásia e são nas Índias onde encontram produtos valiosos. Logo, o objetivo de Portugal era dominar o comércio com as Índias. O achado de Pedro Álvares Cabral não era a prioridade portuguesa e por isso os 30 primeiros anos foram de total abandono da região. Porém, por conta das ameaças francesas que já contrabandeavam na costa brasileira, Portugal decide finalmente ocupar o Brasil mesmo que servisse apenas como território reserva para possíveis necessidades futuras. 

A coroa portuguesa instala então o sistema das Capitanias Hereditárias, dando a colonos oriundos de Portugal a responsabilidade para explorar e defender o território. O mesmo fizeram nas colônias de Açores e Madeira, entretanto, diferente desses locais aqui as Capitanias Hereditárias não deram certo. O território brasileiro era extenso para uma empreitada privada dar conta de sua preservação e exploração. Por isso, "quando é instituído o governo geral (1549) pode-se dizer que praticamente só vingara a colonização em Pernambuco, ao norte, e São Vicente, ao sul" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 13). Para Caio Prado, o sistema de Capitanias Hereditárias tinha semelhanças com o feudalismo tendo em vista que o donatário não poderia obter direito sobre à terra que era apenas cedida pela coroa. (Caio não aprofunda no texto, mas antes de receber a terra, o donatário assinava a Carta de Doação que dava a ele o direito de passar a sesmaria recebida para seu filho mas sem o direito de venda. Em troca, deveria fundar vilas, estabelecer a ordem e construir engenhos no local. E também assinava a Carta Foral, onde legitimava um conjunto de impostos a serem pagos para a coroa). Porém, esse ensaio de feudalismo foi morto com o fim do sistema das Capitanias Hereditárias e com a implantação do Governo Geral que teria a Bahia como sede.

E o que exploraria o colono nesse novo território? Basicamente a superfície do solo e seus recursos naturais, tendo em vista que não tínhamos um avanço civilizatório parecido com as Índias que detinha um forte desenvolvimento do comércio. Logo, os portugueses que até então se dedicavam majoritariamente ao comércio se voltam para à agricultura e à pecuária. Já sob o Governo Geral, Caio afirma que as relações feudais existentes nas Capitanias Hereditárias são extintas, pois a sesmaria tornara-se alodial ao proprietário saindo de qualquer tipo de relação dependente. A obrigação era explorar a terra doada e pagar simples impostos como a Ordem de Cristo. E quem eram os colonos que recebiam as terras? Eram colonos abastados, aqueles que tinham condições de explorar a terra sendo esse o interesse da coroa. Logo, diferentemente do ocorrido no feudalismo na Europa, a mera posse da terra não significava muita coisa. Enquanto que lá o poder era centrado na posse da terra, aqui era centrado nos meios de se explorar essa terra ganhando assim uma formação diversa da européia. 

A Economia Colonial, se baseava na grande propriedade agrícola mantida sob trabalho escravo e objetivando a exportação de seus produtos. Como exemplos dessa grande propriedade agrícola, Caio cita: as lavouras de cana, os engenhos de açúcar e a pecuária nos latifúndios. Tudo isso mantido sob o trabalho escravo, primeiro do indígena e posteriormente do negro. A pequena propriedade não teria espaço fértil no Brasil Colônia e por um conjunto de motivos. O principal é que "o trabalho livre de pequenos lavradores não podia concorrer na rude tarefa do desbravamento de uma terra ainda virgem e nas primitivas culturas e produções aqui adotadas com o grosseiro trabalho escravo" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 13). O alto custo para montar um engenho, por exemplo, que necessitava de grande investimento (mão-de-obra e equipamentos) impossibilitava o crescimento desses pequenos produtores. Por fim, os pequenos produtores ainda encontravam um mercado interno pífio que impossibilitava o consumo dos seus produtos. Nos anos iniciais do Brasil Colônia, a população residente era majoritariamente composta por escravos ou semiescravos. A grande propriedade rural produzia de forma suficiente para seu consumo, não necessitando de abastecimento externo. Para completar, a comunicação arcaica (onde basicamente se vivia num certo isolamento); inexpressividade dos centros urbanos contribuía para a ruína do pequeno produtor e constantes conflitos com os indígenas e grandes proprietários formam uma teia de dificuldades para os pequenos produtores aqui reunidos. 

Seguindo os princípios do materialismo histórico e dialético de Karl Marx, o autor constata que A Sociedade Colonial é apenas um reflexo da produção material. Logo, quem está no topo da sociedade colonial não poderia ser outra classe a não ser os senhores de engenho, donos das grandes propriedades agrícolas e que lucravam bastante com o privilégio do Brasil ser até então o único exportador de açúcar do mundo. A massa popular era composta pelos escravos, indígenas e depois negros. O trabalho escravo indígena foi a primeira forma encontrada pelos colonos, tendo algumas tribos até se voluntariado ao trabalho. Sobre a mão-de-obra escrava indígena, Caio destaca um pouco mais. Primeiro relatando o papel das chamadas "bandeiras", onde os portugueses adentraram no interior do Brasil com o intuito de forçar os índios a trabalharem. Depois ele debate o surgimento dos jesuítas - religiosos que queriam inserir o índio na civilização de forma pacífica - que irão entrar em conflito com os interesses dos senhores de engenho. É instituído uma "proteção" legal aos índios, sendo esses escravizados só por meios de "guerras justas". A verdade é que o trabalho indígena, antes mesmo de ser proibido por Pombal no Século XVIII, já era evitado nas grandes propriedades rurais tendo em vista a indisciplina do índio para o trabalho escravo. Ele era pouco resistente, indisciplinado e facilmente conseguia fugir. Com isso, a mão-de-obra negra ganhou hegemonia no trabalho escravo. 

Sobre a mão-de-obra negra, não se sabe ao certo quando começou sua instalação. Mas sabe-se que foi desde os primeiros anos do Brasil Colônia, tendo em vista o uso do negro como escravo em Portugal. Diferente dos índios, o negro não tinha a proteção da Igreja e eram comparados a bestas. Além do pequeno proprietário (raro) que já mencionamos, temos os chamados agregados. São homens pobres, escravos libertos ou mestiços livres, que vivem em função da grande propriedade agrícola. Eles ocupam atividades que vão desde mensageiros até seguranças do latifúndio. Dentre esses agregados encontramos os rendeiros, homens que alugam as terras do senhor de engenho pagando em dinheiro ou em produtos e sendo totalmente dependentes destes. Ainda encontramos os assalariados, pessoas com um mínimo de conhecimento técnico e que trabalhavam nos engenhos como os feitores. Como podemos observar, a estrutura social do Brasil Colônia era simples e fruto de uma economia agrária e fundada na grande propriedade agrícola. Temos, 
"De um lado os proprietários rurais, a classe abastada dos senhores de engenho e fazenda; doutro a massa da população espúria dos trabalhadores do campo, escravos ou semilivres. Da simplicidade da infra-estrutura econômica - a terra, única força produtiva, absorvida pela grande exploração agrícola - deriva a estrutura social: a reduzida classe de proprietários, e a grande massa que trabalha e produz, explorada e oprimida" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 28/29). 
O Estatuto Político da Colônia não poderia estar em outras mãos a não ser dos senhores de engenho, aqueles que dominavam a economia e estavam no topo da sociedade colonial. Seu domínio político seria apenas uma consequência, sendo legitimado pela completa omissão ou desinteresse que a metrópole tinha do Brasil. O que bastava a metrópole era ter portugueses aqui, explorando o território e defendendo-o de estrangeiros. Não era a prioridade da coroa a exploração do Brasil e por isso os senhores de engenho terão carta-branca nos anos iniciais da colonização. Era uma espécie de reconhecimento por aqueles que "desbravavam o território - ou faziam-no desbravar - conquistando-o palmo a palmo aos indígenas e aventureiros de outras nações que aqui se instalavam" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 30). A principal e única instância de poder do Brasil Colônia eram as Câmaras Municipais, descentralizadas por toda colônia e completamente dominadas pelos senhores de engenho que eram os únicos que tinham o direito a voto. Nessas Câmaras eles decidiam basicamente tudo relativo a colônia, até mesmo proporem ou recusarem impostos reais. Essas Câmaras não tinham uma unidade, tendo cada região a sua. Encerrando o primeiro capítulo, Caio conclui que nessa fase inicial da sociedade colonial então em formação a principal característica política era a descentralização, tendo apenas um domínio comum na teoria. 

Capítulo 02 - A Colônia

Esse segundo capítulo é dividido em duas partes:
  • Novas Condições Econômicas - Crescimento econômico; descoberta do ouro; Portugal em crise; parasitismo lusitano.
  • Novas Formas Sociais e Políticas - Declínio dos latifundiários; crescimento da burguesia comercial; declínio das Câmaras Municipais; ascensão dos Governadores; aguçamento das rivalidades entre brasileiros e portugueses.
Em Novas Condições Econômicas, podemos observar as mudanças econômicas que sofreram Brasil e Portugal no fim do Século XVII. A paz que reinou no início do processo, tendo em vista o inimigo comum que eram os indígenas e em seguida a ocupação holandesa, acabou com a expulsão dos últimos em 1654. As diferenças entre os brasileiros e os portugueses começam a se acentuarem, primeiro pelo crescimento econômico da colônia não só com a exportação do açúcar mais também pela descoberta do ouro em fins do Século XVII. E segundo pela crise que vivia Portugal, fracassado o comércio com as Índias de que tanto dependiam. O crescimento da colônia e a crise da metrópole, faz com que surja o fenômeno do parasitismo lusitano.

Buscando sugar a colônia em crescimento, Portugal passa a aumentar as restrições comerciais do Brasil que já existiam desde o início da colonização. Não só ocorreu um aumento quantitativo, mais também qualitativo com uma maior fiscalização do que saía e entrava em solo brasileiro. Em 1661, Portugal proíbe que o Brasil comercialize com estrangeiros. Em 1684 proíbem a ida de qualquer navio brasileiro a portos estrangeiros. E em 1711 chegam a proibir que brasileiros vão a países estrangeiros. A coroa, com essas ações, limitava o comércio brasileiro a Portugal que passava a ser o intermediário de todas as negociações. O controle da coroa aumenta no decorrer do século XVII e tem seu auge após a descoberta do ouro e depois do diamante. Destaca o autor que "o regime das minas era o mais opressivo possível. Proibia-se a qualquer pessoa a entrada e saída dos distritos dos mineiros sem expressa licença das autoridades; as perquisições  nos domicílios dos moradores para a descoberta de desvios eram constantes; havia um regime especial para fiscalizar a extração e condução do ouro; fechavam-se todas as estradas que levavam às minas..." (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 37). Para completar a asfixia, a metrópole impedia qualquer desenvolvimento industrial do Brasil, evitando os prejuízos dos manufatureiros lusitanos. 

É claro que essas mudanças econômicas, trariam consigo mudanças sociais e políticas. É o que Caio debate em Novas Formas Sociais e Políticas. As mudanças econômicas ditas acima, terá como resultado imediato a formação de uma nova classe social na colônia: a burguesia comercial que foge da crise vivida na metrópole. Essa burguesia comercial passa a concorrer com os já instalados proprietários rurais. Esse conflito fica nítido quando observamos o crescimento da cidade do Recife, vinculada ao comércio, em detrimento de Olinda que era onde se concentrava a aristocracia. Nessa conjuntura, o comércio do açúcar sofre uma queda pela concorrência que o Brasil passa a sofrer de outras colônias. A América Central, sob domínio espanhol ou inglês, também passava a produzir o produto. Era a queda dos grandes proprietários rurais. Já a nova burguesia comercial que surgia, se distanciava da agricultura e não tinha capital suficiente para arcar com as despesas que essa produção exigia. Essa leva de imigrante partiam para as recém-descobertas minas ou rumavam para o comércio onde tinham mais contato. No comércio, esses imigrantes encontraram privilégios estabelecidos pela coroa e logo dominariam a atividade. Essa situação onde os estrangeiros dominam o comércio do Brasil permanece até a Independência, sendo os comerciantes nativos prejudicados pela coroa. 

Surge então uma oposição entre comerciantes reinóis, representantes e principais beneficiados do reino que proibia a atuação de comerciantes estrangeiros no Brasil, e os grandes proprietários de terra outrora dominantes na colônia. A concorrência internacional do açúcar, o foco na recém-descoberta mineração e os prejuízos causados pelas guerras holandesas foram os fatores principais do declínio dos latifundiários que se viam endividados. Os credores? Os comerciantes reinóis. O conflito mor que exemplifica bem essa oposição é a Guerra dos Mascates (1710-1711) que ocorreu na capitania de Pernambuco envolvendo os proprietários rurais ligados à Olinda e os mascates (comerciantes portugueses) ligados a Recife. 

No plano político, os grandes proprietários encontram de imediato o crescimento da influência dos comerciantes reinóis nas Câmaras Municipais. Mas o destaque desse período é a queda de influência das Câmaras Municipais que vão dar lugar a representações mais incisivas da coroa sobre a colônia, sendo os governadores seus representantes diretos. Esses governadores, antes omissos, aparecem como figuras mais ativas e autoritárias a partir de fins do século XVII. "Já não são mais os humildes funcionários que se curvam ante as câmaras, atendendo prontamente a seus desejos, e usando da maior diplomacia para não melindrar os colonos todo-poderosos" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 43). Estava posta o conflito que permearia o Brasil Colônia e que teria na Independência, em 1822, seu desfecho final. Com as próprias palavras do Caio, podemos resumir essa segunda fase da era colonial: 
"A nossa evolução política segue portanto passo a passo a transformação econômica que se opera a partir de meados do século XVII. Esta transformação, que se define pela maior penetração econômica da metrópole, repercute no terreno político pelo desaparecimento gradual da nossa autonomia local do primeiro século e meio da colonização. Desloca-se a autoridade das mãos dos proprietários territoriais, a antiga classe dominante, para as da Coroa portuguesa. E é nesta que ela vai se consolidar. Despojam-se as câmaras sucessivamente, como vimos, de todas as suas prerrogativas, e a elas se substitui a onipotência dos governadores" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 44).
Capítulo 03 - A Revolução

O mais longo dos capítulos, Caio Prado divide-o em sete partes: 
  • D. João VI no Brasil - Vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil; Abertura dos portos para os ingleses; Revolução do Porto; formação do Partido Português e Brasileiro.
  • Organização do Estado Nacional: a Assembléia Constituinte de 1823 - Monarquia como instrumento da classe dominante; projeto constituinte de 1823; fechamento da Assembléia Constituinte por D. Pedro I.
  • O Primeiro Reinado - Constituição de 1824 e poder nas mãos do Partido Português.
  • A Menoridade - Abdicação de D. Pedro I; Isolamento dos que querem a recolonização do Brasil; disputa política entre grandes proprietários rurais x setores populares sem propriedade; período regencial.
  • A Revolta dos Cabanos no Pará e a Regência de Feijó
  • A Revolta dos Balaios e a Agitação
  • A Trajetória Reacionária de 1837 a 1849 - Golpe da Maioridade; trono assumido por D. Pedro II.
A vinda da família real portuguesa é debatida por Caio Prado em D. João VI no Brasil, sendo esse acontecimento central na Independência do Brasil. Para o autor, nos diferenciamos dos demais países do continente pois nosso processo de independência surgiu através de um acordo, pacífico e não foi oriundo de uma luta armada. Nossa independência surge de um processo capitaneado pelo próprio governo metropolitano e o começo desse processo acontece em 1808 com a vinda da coroa portuguesa ao Brasil. Na conjuntura internacional, tínhamos Portugal em franca decadência. A fuga da família real portuguesa das tropas napoleônicas é o exemplo claro dessa fragilidade lusitana. Inversamente, a Inglaterra se erguia como a principal potência mundial e desejava a abertura do comércio brasileiro, então monopolizado pelos portugueses. Após abandonar sua terra natal e rumar para sua colônia com ajuda inglesa, o governo lusitano se viu cada vez mais dependente da Inglaterra. Com isso, após embarcados em solo brasileiro, a primeira iniciativa dos portugueses foram abrir os portos brasileiros para "nações amigas", vulgo, a Inglaterra. Por isso, Caio considera que "a independência brasileira seria antedatada de quatorze anos, e se contaria justamente da transferência da Corte em 1808" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 47)

As ações de D. João VI, beneficiando os ingleses e praticamente selando a Independência do Brasil, gerou inconformismo em Portugal. Protestando contra essas medidas, estoura a chamada Revolução Constitucional do Porto, que teria "uma de suas preocupações máximas consistirá em reconduzir o Brasil ao antigo regime de colônia" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 48). A frágil indústria portuguesa, não teria a mínima chance de concorrer com a sofisticada e desenvolvida indústria inglesa que agora tinha liberdade para atuar no Brasil. Era o fim do parasitismo lusitano. No Brasil, a burguesia comercial ligada aos interesses coloniais e que imigraram para à colônia após o fim com o comércio nas Índias, se levantaram a favor da Revolução do Porto e contra as medidas de D. João VI. Com a eclosão e repercussão da Revolução do Porto, as forças políticas no Brasil se organizaram da seguinte forma: 
  • Partido Português - setores vinculados aos benefícios causados pelo regime colonial, basicamente composto pela burguesia comercial portuguesa e todas as forças residentes na metrópole; 
  • Partido Brasileiro - setores prejudicados pelo regime colonial, basicamente composto pelos grandes proprietários de terra residentes no Brasil e que se mostrou contra as ideias da Revolução do Porto. 
As massas populares, composta por escravos ou semiescravos, ainda não tinham organização suficiente para se rebelar contendo pautas próprias. Já no embate entre o Partido Português e Brasileiro, "a reação recolonizadora, embora contando com o apoio da metrópole e das cortes portuguesas, será levada de vencida porque não era mais possível deter o curso da História" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 50). E é nesta conjuntura que avançará a emancipação política do Brasil e só apenas ela, sem qualquer tipo de reforma mais profunda que venha a beneficiar os setores populares da rígida sociedade colonial. O instrumento político do Partido Brasileiro será D. Pedro, filho de D. João VI que por conta da Revolução do Porto teve que retornar a metrópole.

Saindo dos antecedentes e partindo para o processo transitório que resultaria na Independência formal do Brasil em 1822, Caio debate em Organização do Estado Nacional: a Assembléia Constituinte de 1823, os meandros que resultaram na formação do Império Brasileiro. Respeitando sua concepção materialista e marxista da história, Caio adverte para o fato de que "é a superestrutura política no Brasil-Colônia que, já não correspondendo ao estado das forças produtivas e à infra-estrutura econômica do país, se rompe, para dar lugar a outras formas mais adequadas, às novas condições econômicas e capazes de conter a sua evolução" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 51/52). A Independência do Brasil que surge nessa evolução, é tratada por Caio Prado como resultado de um "arranjo político" negociado entre os setores dominantes da sociedade colonial, sem qualquer participação e benefício para os setores populares. Logo, a monarquia brasileira que surge com D. Pedro é um mero instrumento do Partido Brasileiro e por isso consiste numa formação histórica totalmente diferente da dada na Europa após o fim do Feudalismo. O Estado Nacional não é base para a monarquia, pelo contrário, a monarquia que vira instrumento desse Estado. 

Em 1822, o ocorre a Independência do Brasil da forma ordeira e negociada já debatida. E o que ocorre depois? Em 1823, ocorre a chamada Assembléia Constituinte que teria como função debater a constituição a ser vigorada no mais novo país independente. Caio Prado analisa os debates que brotam dessa Assembléia Constituinte, reforçando o caráter classista de sua análise sobre os acontecimentos. A Assembléia Constituinte foi fortemente influenciada pelas constituições inglesas e, principalmente, francesas. As ideias de Jean-Jacques Rousseau eram moda na elite nacional à época. O que os brasileiros pretendiam eram soberania nacional e liberdade econômica, princípios básicos das constituições burguesas e liberais que surgiram na Europa no século XVIII. Porém, diferente da Europa, os legisladores aqui eram formados por proprietários rurais e não pela burguesia industrial ou comercial. Dentre os pontos do projeto constitucional debatido em 1823, temos a forte xenofobia. Era preciso rechaçar o estrangeiro, principalmente o português, como forma de fortalecer o processo de emancipação política. Se não bastasse as tropas portuguesas resistentes na Bahia, Pará e Província Cisplatina, D. Pedro que era português e herdeiro direto do trono lusitano. Logo, era mais que necessário para os representantes do Partido Brasileiro se distanciar cada vez mais de sua antiga metrópole. Como resultado, tivemos no projeto constitucional "naturalização limitada, incompatibilidade dos naturalizados para os cargos da representação nacional" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 55). Limitar os poderes do imperador e do direito de voto, basicamente restringindo aos grandes proprietários de terra, também eram ideias em voga. Em suma, a nova constituição pensada no projeto constitucional de 1823 centrava suas forças em: afastar-se de Portugal, silenciar as classes populares e a burguesia comercial então beneficiada pela antiga estrutura colonial, concentrar o poder nas mãos do parlamento reduzindo assim as atribuições do imperador. Era o liberalismo aos moldes dos latifundiários escravistas. 

Essas ideias proferidas pelos brasileiros no projeto constitucional não agradou D. Pedro que, com medo de virar figura decorativa, vira às costas para seus antigos aliados e se solidariza com seus compatriotas portugueses que passam a defender poderes absolutos ao imperador. Após a independência, as diferenças existentes no chamado Partido Brasileiro se intensificam e ocorre uma divisão entre suas fileiras. A parte majoritária e que tinha atuação forte no projeto constitucional, era a dos grandes proprietários de terra que eram figuras socialmente conservadoras. Já a parte minoritária, composta por democratas radiciais vinculados a setores das classes populares, acreditavam que o processo de independência poderia servir para a eclosão de uma revolução que viesse a destruir as heranças coloniais por meio de reformas sociais profundas. Para Caio, essa parte minoritária buscavam mais destruir que construir, não tendo sua radicalidade a construção de um projeto real de poder. 

Agora próximo dos portugueses, D. Pedro fecha a Assembléia Constituinte em novembro de 1823, ação que vem significar uma recolonização do país. Logo, eis o dilema durante do O Primeiro Reinado: a tensão da recolonização do Brasil, tendo em vista a aproximação entre D. Pedro e os portugueses ligados aos interesses metropolitanos. Fechada a Assembléia Constituinte, D. Pedro chama uma comissão para elaborar um projeto constitucional em 40 dias. E "o novo projeto conservou em linhas gerais o sistema do anterior e do comum das constituições da época, de que aliás fartamente se inspirou. Constituiu sua única inovação de vulto a introdução de um quarto poder, o moderador, ao lado do executivo, legislativo e judiciário" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 61). As funções do Poder Moderador eram basicamente outorgadas sendo poder do imperador nomear senadores, ministros e vetar qualquer proposta do Poder Legislativo. Basicamente, a constituição outorgada em 1824 implantava uma espécie de governo absoluto do imperador. O Partido Português, então, governa durante o Primeiro Reinado implantando a supressão da liberdade de imprensa, loteando os cargos públicos e dominando o Banco do Brasil fundado em 1808. A tensão da recolonização e à farra dos portugueses, fizeram toda a opinião pública se voltar contra D. Pedro que - mesmo tentando acalmar os ânimos da oposição brasileira, oferecendo pastas em seu ministério - não arrumou outra saída a não ser abdicar para que assim se evitasse uma revolução no país. 

Em A Menoridade, Caio vai debater a conjuntura do país após a abdicação de D. Pedro I em 07 de abril de 1831. Primeiramente, Caio Prado trata o Primeiro Reinado como um período de transição onde as antigas forças coloniais resistem à nova situação política no país, mas são derrotadas pelas forças nativistas que com a abdicação de D. Pedro I se veem vitoriosas rumo a construção do Estado Nacional Brasileiro. A partir da abdicação, os que querem a recolonização se isolam da cena política, pois suas ideias de volta ao passado se tornam completamente irrealizáveis. Com isso, a disputa política é transferida para uma briga interna do Partido Brasileiro: o embate entre os grandes proprietários de terra x os setores populares sem propriedades. Passado o 07 de abril, as classes proprietárias e majoritárias do Partido Brasileiro passam a reprimir as ações políticas radicais dos setores populares sem propriedades. E, dentro desses setores populares, encontramos uma classe média ponta de lança na abdicação do imperador que se distancia dos movimentos iniciados por sua ação política quando esses ganham simpatia e participação das camadas mais baixas da sociedade brasileira. Por isso suas ações se limitam a tomada de poder local, não ganhando nenhuma dimensão nacional. Enquanto as camadas mais baixas da sociedade colonial, era impossível por suas condições objetivas de vida, que viessem a liderar de forma responsável um movimento. E, apesar de representarem 50% da sociedade brasileira:
"Os escravos, além de seu baixo nível intelectual - grande parte vinham diretamente das selvas africanas, e por isso em nada se diferenciava das populações ainda em completo estado de barbárie de que provinha - eram divididos por profundas rivalidades tribais do seu habitat de origem; muitas vezes nem ao menos falavam o mesmo idioma. Não formam por isso uma massa coesa, e não raro vemo-los tomarem armas uns contra os outros" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 67).
Já no dia seguinte a abdicação do imperador, os proprietários de terra se viam tendo que combater duas frentes: primeiro as possíveis reações dos portugueses e segundo as revoltas populares que assolaram o país. Mesmo que desorganizados, esses movimentos contestatórios causavam alvoroço e representavam uma ameaça revolucionária a setores que estavam satisfeitas com a simples emancipação política do Brasil de Portugal. Logo se cria a Sociedade Defensora da Liberdade e da Independência Nacional e em 03 de maio de 1831 se institui a regência, tendo o autoritário padre Diego Antônio Feijó como Ministro da Justiça. Entre as pautas dos revoltosos, estavam: reformas na constituição com o intuito de torná-la mais inclusiva, suspensão de funcionários públicos de origem portuguesa, exoneração do Ministro da Justiça e proibição da imigração portuguesa por 10 anos. Em meio as revoltas populares, os restauradores se organizam na Sociedade Conservadora (caramurus, como ficaram conhecidos) e tentam tirar proveito da instabilidade política do período regencial. Fracassados seus planos, são duramente reprimidos e que significa a exclusão quase que completa de suas forças na cena política nacional.

Em A Revolta dos Cabanos no Pará e a Regência de Feijó, Caio Prado trás pela primeira vez na historiografia brasileira o acontecimento político da Cabanagem. Em A Revolta dos Balaios e a Agitação Praieira, o autor também revoluciona ao trazer a Balaiada e a Revolução Praieira para a análise histórica. Eram, até então, acontecimentos esquecidos pela historiografia oficial. Em resumo, elencarei abaixo os principais pontos desses acontecimentos destacados por Caio Prado:
  • Cabanagem - Apesar de um movimento desorganizado, Caio destaca a Cabanagem pela amplidão que tomou. O Pará, sempre se mostrou rebelde por se manter sob domínio português após a Independência do Brasil. Apenas em agosto de 1823 é que o governo imperial consegue tomar o poder dos lusitanos na região. Após todo o Primeira Reinado de paz, surgem as revoltas. Com a regência em voga, os primeiros homens nomeados pela mesma não conseguem sequer embarcar em Belém para governar. Apenas na segunda tentativa, se instala Lobo de Sousa que de forma autoritária e propondo alistamento em massa, logo daria as bases para a eclosão do movimento. Das agitações pela retirada de Lobo de Sousa, logo a classe média se afasta do movimento por sua radicalidade, mas isso nada impedi do movimento tomar o poder. Tomado o poder em Belém, nomeiam Félix Malcher que logo se inclinaria para as forças regenciais. Deposto e executado, Malcher dar lugar a Francisco Vinagre que logo repetiria seu antecessor. Novamente traídos, os cabanos tomam novamente o poder, mas logo seriam trucidados pelas forças regenciais. Apesar da derrota, Caio Prado destaca a Cabanagem como "o mais notável movimento popular do Brasil. É o único em que as camadas mais inferiores da população conseguem ocupar o poder de toda uma província com certa estabilidade" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 77)
  • Balaiada - Diferente da Cabanagem, a Balaiada que estourou na província do Maranhão não conseguiu tomar o poder se limitando apenas em dominar regiões. Sua base social eram de trabalhadores rurais, ligados à pecuária. Porém, o movimento se inicia nas cidades através dos conflitos entre latifundiários e classe média urbana. Foi através do jornal Bem-Te-Vi que a classe média incendiou a província, mas logo se afastaria do movimento que causou por conta da simpatia ganha dos setores mais baixos da sociedade. Em vez de organizar uma centralização, a Balaiada logo se enveredou pelo caudilhismo onde ocorria "a cristalização de grupos sertanejos em torno de chefes, formando assim apenas bandos armados que percorrem o sertão em saques e depredações" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 79). O resultado desse tipo de ação foi a distância das massas com o crescimento desse "bandoleirismo" e a fácil desarticulação do movimento que se encontrava desarticulado em pequenos grupos armados. Junto a isso, os balaios não souberam aproveitar os constantes levantes de escravos na região, podendo o movimento ganhar uma adesão quantitativa maior do que apresentou. Em 1840, logo seria totalmente reprimida pelo novo presidente da província: Luís Alves de Lima e Silva, mais conhecido futuramente como Duque de Caxias; 
  • Revolução Praieira - Em Pernambuco, imperava um forte concentração de terra onde a família dos Cavalcantis detinham a maior das posses. Junto a essa classe de proprietários rurais, somava uma burguesia comercial portuguesa que usava o intenso comércio na província como meio de enriquecimento. Aos brasileiros e, em específico, para as classes médias urbanas sobraria apenas descontentamento. Organizados na Rua da Praia, através do jornal Diário Novo, a classe média logo toma o poder da província com Chichorro da Gama que é indicado ao cargo de presidente em 1845. Começa uma série de repressões, tanto aos grandes proprietários rurais quanto aos comerciantes portugueses. Articulados, a reação reacionária logo retorna ao poder só restando aos revolucionários a resistência armada. Porém, diferente dos demais movimentos, a Revolução Praieira em Pernambuco tinha um programa (com luta pelo voto livre e universal, liberdade de imprensa, garantia de trabalho para brasileiros, limitação da ação dos comerciantes portugueses, extinção do Poder Moderador etc) mas não obtiveram homens suficientes e por isso foram facilmente reprimidos quando tentaram radicalizar. 
Por fim em A Trajetória Reacionária de 1837 a 1849, Caio Prado debate em como se comportaria a classe dominante após a repressão total dos movimentos populares que marcaram o período regencial. Passado esse período e dado o golpe da Maioridade, onde assume o trono D. Pedro II, a estabilidade reina no país com o silenciamento das classes populares. A centralização do poder e a reforma eleitoral que segregou ainda mais o direito ao voto, permitiram que as disputas políticas na segunda metade do século XIX se limitassem a classe dominante, então divididas entre "liberais" e "conservadores". 

Capítulo 04 - O Império

O último capítulo do livro é dividido em duas partes:
  • O Segundo Reinado - Fim do tráfico negreiro; disputas entre grandes proprietários rurais x burguesia comercial; debate pela abolição da escravidão. 
  • O Fim do Império - Inclinação do Império as pautas conservadoras em declínio. 
Em O Segundo Reinado, Caio Prado debate o reinado de D. Pedro II que vem assumir o Brasil após o Golpe da Maioridade deflagrado em 1840, pondo fim ao então período regencial. O Segundo Reinado será permeado pelo debate da abolição da escravidão que começa a ter fim com a inicial proibição do tráfico negreiro, exigido pela Inglaterra. O modo de produção estabelecido no Brasil, necessitava do trabalho escravo para sobreviver. Interesse antagônico aos dos ingleses que, já em outra fase do capitalismo, enxergava a importância de substituir trabalho escravo por trabalho assalariado. A partir de 1850, a Inglaterra exige o fim do tráfico negreiro no Brasil chegando a ameaçar atacar o país militarmente em caso de descumprimento das recomendações. Ela foi seguida pelo ministro Eusébio de Queirós que, num prazo de 02 anos, estancou o tráfico negreiro no país. Com o combate à prática, os capitais passaram a se transferir do tráfico de seres humanos para o comércio. A consequência disso foram "as emissões bancárias, de pouco mais de 1.000 contos em 1850, crescem para quase 20.000 em 1854" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 93). Junto a isso, temos o contato do Brasil com algumas invenções criadas durante a Revolução Industrial. As estradas de ferro chegam aqui em 1854, ligando Mauá a Fragoso. E telégrafo chega em 1852. Caio admite ser simplista vincular a proibição do tráfico negreiro ao contato do país com traços da modernidade que se desenvolvia na Europa, porém, é fato que a obediência às ordens ingleses fez o Brasil adentrar cada vez mais na economia mundial ganhando com isso benefícios. A partir de 1850, começa a se desenvolver no país uma burguesia endinheirada que aproveitava o momento de prosperidade econômica para juntar fortuna. 

A principal disputa no Segundo Reinado se configura entre: latifundiários dependentes do trabalho escravo de um lado e comerciantes burgueses de outro. Esses burgueses, eram donos do chamado "capital móvel" e tinham se adaptado as novas feições do capitalismo internacional. Por isso enriqueciam, o contrário dos proprietários rurais presos e dependentes do trabalho escravo que sofria forte impacto após o fim do tráfico negreiro. O debate trabalho escravo x trabalho livre, permeará todo o Segundo Reinado sendo o primeiro um empecilho para o desenvolvimento do país. Uma das consequências da permanência do trabalho escravo, eram os baixos índices de imigração que tinha o Brasil naquela época. Os latifundiários faliam, aos poucos. Sem o tráfico negreiro, o escravo tornava-se mercadoria cara e apenas os proprietários ligados ao café (produto agrícola em alta) conseguiam capital suficiente para se manter. E o café se concentrava no Sudeste (São Paulo e Rio de Janeiro), ocorrendo uma transferência de escravos para essas regiões. Logo, "não é pois de se admirar a primazia que teve o Norte na Abolição, quer alforriando seus escravos em massa, quer decretando-a como o Ceará e o Amazonas em 1884" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 98)

Após a Guerra do Paraguai, a situação do trabalho escravo no Brasil se torna insustentável e apenas nas regiões do café permanecia o regime. Isolados, minoria e se rendendo a nova conjuntura esses latifundiários escravocratas se viram varridos pela marcha da História tendo a Lei Áurea dado um ponto final apenas formal. Como Caio destaca, a libertação dos escravos aqui não surgiu de uma luta emancipatória e humana, mas de interesses puramente econômicos que exigiam das classes dominantes novos comportamentos. Era preciso modernizar a economia e ela foi modernizada com o fim do tráfico negreiro e a consequente fim da mão-de-obra escrava. Porém, as reformas deveriam se espalhar para o âmbito político e isso implicava uma reestruturação do Estado Nacional totalmente atrasado frente as novas demandas nacionais e internacionais. Estava chegando a hora de acabar com o Império... 

Em O Fim do Império, Caio Prado encerra sua obra debatendo rapidamente as razões de sua derrocada frente as forças republicanas. O Império se mostrou impotente frente a nova conjuntura e, baseado em estrutura arcaicas, apenas trabalhava com redução de danos retardando o avanço do país que mais cedo ou mais tarde viria. D. Pedro II é descrito pelo autor como uma figura comandada, um instrumento dos setores conservadores da sociedade brasileira e que "nunca passou de um bom, e mesmo se quiserem, de um ótimo burocrata" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 101). Entre avançar nas reformas progressistas propostas por setores da classe dirigente que se beneficiavam com a nova conjuntura, o Império optou por agradar os conservadores em declínio. Os liberais levantavam suas bandeiras de reformas das instituições de 1866, porém, foi opção de D. Pedro II seguir com a agenda conservadora em 1868. E isolado, resistente a marcha da História, só bastaria uma passeata militar para que a República fosse proclamada.  





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