sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Os Clássicos da Política 01


  • Sobre o autor: Francisco Correia Weffort nasceu em Quatá, São Paulo, em maio de 1937. Graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), Weffort foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT) e participou de cargos no Governo de Fernando Henrique Cardoso. Suas obras se encontram no campo da Ciência Política e entre as principais, podemos citar: a) O Populismo na Política Brasileira; b) Qual Democracia?; c) Formação do Pensamento Político Brasileiro. 


Os Clássicos da Política 01 - Francisco Weffort - Editora Ática




Introdução - O livro "Os Clássicos da Política 01" de Francisco Weffort é uma coletânea de textos, organizados pelo autor, de grandes nomes da teoria política clássica como: Maquiavel, Hobbes, Locke, Montesquieu, Rousseau e os Federalistas. São 06 capítulos, cada um para cada pensador citado. Weffort o que faz é organizar, compilar para fins puramente didáticos e voltados para estudantes universitários. Trata-se, por isso, de uma leve introdução sobre o pensamento político desses autores clássicos da teoria política. 

01) Nicolau Maquiavel: o cidadão sem fortuna, o intelectual de virtú - Maria Tereza Sadek - O texto aborda vida e obra de Nicolau Maquiavel, nascido na atual Itália em 03 de maio de 1469 e oriundo de família modesta. Seu pai, fora um advogado renascentista e iniciaria Maquiavel nos estudos dos clássicos que já aos 12 anos escrevia em latim e dominava a retórica greco-romana. No tempo de Maquiavel, a atual Itália era um território descentralizado e que por conta de invasões internas/externas se encontrava uma gama de pequenos Estados. Aos 29 anos, Maquiavel ocupou o cargo de segunda chancelaria na República Florentina, sendo demitido em 1512 quando a dinastia Médicis volta ao poder político na região. Preso, Maquiavel só consegue sair da cadeia através da ajuda de um amigo. Porém, permanece desempregado e vivendo uma espécie de exílio na própria terra. E foi morando numa pequena propriedade herdada do pai que Maquiavel vai fazer suas reflexões políticas. Escrito entre 1512 e 1513, a sua célebre obra "O Príncipe" revolucionária a forma de se enxergar política e teve como objetivo aconselhar os Médicis que se encontravam no poder. Sua tentativa era de retornar a postos no Estado, ganhando a confiança da dinastia que governava. Em 1527, os Médicis caem e os republicanos que assumem passam a enxergar mal Maquiavel que outrora dedicou livro para os monarcas. Decepcionado, faleceu em junho do mesmo ano. 

Após esse breve comentários biográfico, a autora entra na teoria política maquiavélica. O foco de Maquiavel é o Estado, sua preocupação é a garantia do funcionamento do Estado numa região marcada pela instabilidade política. Porém, não seria pensar o Estado como ele deve ser, mas como ele é. Maquiavel rompe com as perspectivas de Platão, Aristóteles e Santo Tomás de Aquino e parte para uma abordagem mais próxima de Tácito, Políbio e Tito Lívio. Ele substitui o "dever ser" da filosofia para o "ser". A estabilidade do Estado, seu objetivo, não é dada e sim construída pelos homens em busca de tranquilidade. Porém, essa estabilidade nunca teria validade eterna pois sempre existe a possibilidade de transformações. 

Depois dessa base teórica que Maquiavel segue, a autora parte para sua visão de natureza humana e história. Para ele, existia no homem uma natureza simuladora e que os conflitos são resultados disso. A repetição desses acontecimentos, dava para Maquiavel uma importância ímpar a história que era vista como "um desfile de fatos dos quais se deve extrair do juízo final, mas sim um desfile de fatos dos quais se deve extrair as causas e os meios utilizados para enfrentar o caos resultante da expressão da natureza humana" (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 19). A única força capaz de combater essa natureza era o poder que não tinha origem divina, mas mundana e por isso era repleta de contradições. Só o poder pode combater essa natureza humana simuladora, mas sem garantia de permanência total da ordem. Logo, a política é a constante procura por estabilidade que venha criar uma correlação de forças. 

Da escolha por democracia ou principado, Maquiavel era adepto da ideia de que onde existisse descentralização política era preciso um governo forte que teria na monarquia uma maior segurança. No principado o príncipe não seria um ditador, mas um fundador do Estado. Mas fundado esse Estado e criada as bases estáveis, o caminho para a República pode ser tomado. Para a Itália da época, Maquiavel era convicto da necessidade da figura de um príncipe para que lançasse as bases de uma estabilidade. Por fim, o texto encerra debatendo o conceito de virtú e fortuna em Maquiavel. Enquanto que para os idealistas como Platão e Aristóteles a virtú é uma deusa para "homens virtuosos", em Maquiavel se configura como uma qualidade que um governante deve adquirir para se manter no poder. A honra, a riqueza, a glória e o poder são tentações mundanas e não fruto de uma bondade celestial. O bom governante não é aquele que simplesmente se mostra o mais forte, mas sim aquele que possuí virtú ou amor/respeito dos governados. A força teria sua importância na virtú, pois o governante precisa passar a imagem de que tem condições de resistir a forças externas, transmitindo uma sensação de segurança. O agir de acordo com as necessidades é outro aspecto da virtú, tendo o governante que dosar a repressão e a compaixão. A conclusão da autora é que Maquiavel funda uma nova forma de fazer política, política essa que detém uma moral própria e não vinculada ao divino. A partir de suas reflexões é aberto um novo horizonte teórico que seria desenvolvido nos séculos seguintes. 

02)  Hobbes: o medo e a esperança - Renato Janine Ribeiro - Thomas Hobbes é o primeiro autor contratualista resumido nessa obra. Os filósofos contratualistas são aqueles que entre os séculos XVI e XVIII desenvolveram teorias sobre a origem e o estabelecimento do Estado que, segundo eles, seria firmado através de um contrato social em que os indivíduos estabeleceram as regras de convívio social. Basicamente, a teoria contratualista se baseia em três aspectos. São eles:
  1. Decifrar a natureza humana;
  2. Justificar o contrato social estabelecido;
  3. Explicar como se deu o tratamento com a propriedade em seguida. 
Hobbes, seguido a linha dos filósofos pré século XVIII, não acreditava que a história mudava o homem. Pelo contrário, a natureza humana existe a priori e é imutável. No estado de natureza, onde os homens convivem sem a presença do Estado, impera os conflitos generalizados. Por que? Porque o homem é opaco, logo, não sabe e nunca saberá a ação do outro. Tendo em vista o completo desconhecimento do outro, a racionalidade aponta para que se ataque primeiro a fim de evitar ser pego de surpresa. É a lei da sobrevivência. Para Hobbes esse estado de guerra generalizado é completamente racional no estado de natureza. O indivíduo hobbesiano busca primeiramente a honra, não a riqueza. A riqueza é apenas um meio, mas não o fim último. E o que seria a honra? A honra "é o valor atribuído a alguém em função das aparências exteriores"  (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 59). É imaginando ser forte, traído ou perseguido que o homem instaura um estado de guerra generalizado. 

E como colocar fim a essa guerra? Para Hobbes, tem-se a necessidade de instaurar o Estado. Mas não um Estado qualquer, sim um Estado centralizado e todo poderoso. Para que a ordem seja instalada é preciso que o governante tenha um poder ilimitado. O contrato social surge, então, dos súditos que escolhe um monarca que venha representar o Estado forte, armado e representante da ordem. Esse monarca não participa do contrato, ele é escolhido pelos súditos e por isso não tem nenhuma obrigação para com esses. 

Instaurado o contrato social, como fica a questão da igualdade e da liberdade? A igualdade em Hobbes gera a busca por interesses e consequentemente a guerra generalizada. Logo, seria suprimida após a vigência do contrato social. Enquanto a liberdade do súbito é deixar de obedecer a seu monarca a partir do instante que esse não garantir mais sua vida. Se a igualdade (ou seja, o estado de natureza) gera conflitos e o contrato social é vigorado para assegurar a vida desses súbitos, não há mais razão de obedecer caso o direito à vida for descumprido. Eis então a liberdade hobbesiana. Com as palavras de Janine, podemos resumir a liberdade do súbito da seguinte forma: 
"O soberano não perde a soberania se não atende aos caprichos de cada súdito. Mas, se deixa de proteger à vida de determinado indivíduo, este indivíduo (e só ele) não lhe deve mais sujeição. Os outros não podem aliar-se ao desprotegido, porque o governante continua protegê-lo. E pouco importa se o soberano fere o ex-súdito tendo ou não razão (afinal, repetimos, ninguém pode julgar o soberano)" (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 70).
O Estado hobbesiano é guiado pelo medo. Ou seja, é preciso incitar medo nos súbitos para que esses se mantenham ordeiros. O terror existe no estado de natureza, onde temo pela vida tendo em vista que não posso saber a ação do outro. Com a instauração da paz, através do Estado, o súdito deve respeito ao que foi instituído e o bom súdito (aquele bem comportado) não sofrerá represálias do soberano. Por fim, a propriedade fica nas mãos do soberano. Ele que detém as propriedades e tem o direito de fazer com elas o que deseja. 

03) John Locke e o individualismo liberal - Leonel Itaussu Almeida Mello -  John Locke foi contemporâneo da Revolução Inglesa que transformaria a Inglaterra numa monarquia constitucional ou parlamentarista. Sobre a ideia de natureza humana, Locke se distingue de filósofos como René Descartes que enxergavam uma essência humana a priori. Fundando o Empirismo, Locke afirma que o homem é uma tábula rasa e que por isso todo conhecimento deriva de experiência. 

O estado de natureza em Locke é completamente diferente do pensado por Hobbes. Para Locke, o indivíduo antecedeu a sociedade sendo o estado de natureza a condição plena de liberdade e igualdade entre homens. Porém, o estado de natureza não estava isento de conflitos e por isso fez-se necessário o Estado para resolvê-los. Os conflitos tem início em Locke: começa a partir do advento do dinheiro, quando a concentração de riqueza e a desigual distribuição dos bens maximiza os conflitos. 

Para resolver esses impasses, surge o contrato social que "é um pacto de consentimento em que os homens concordam livremente em formar a sociedade civil para preservar e consolidar ainda mais os direitos possuíam originalmente no estado de natureza" (WEFFORT, Francisco. 2006, Ática, p. 86). Entre as ideias de Locke sobre a instituída sociedade civil, temos: livre consentimento para escolher a melhor forma de governo, controle do executivo pelo legislativo, controle do governo pela sociedade e proteção aos direitos naturais dos homens (a vida, propriedade privada e a liberdade). Por fim, caso o governo descumpra seu papel de proteger a propriedade, o indivíduo tem o direito de se rebelar e formar um novo contrato social. 

04) Montesquieu: sociedade e poder - Guilhon Albuquerque - O autor inicia destacando a importância que Montesquieu teve. Sua teoria, inspirada nos ideais iluministas, tiveram relevância até os dias atuais. Sua famosa teoria dos três poderes serviu como base para a maioria das constituições regidas mundo afora. 

Montesquieu parte de uma perspectiva diferente dos filósofos contratualistas. Enquanto os contratualistas se preocupavam com as razões que deram origem a formação do Estado e a sociedade civil, Montesquieu discute as formas de governo e como essas devem se postar na manutenção da estabilidade. Em suma, a teoria política de Montesquieu se resume em dois eixos: 
  1. Discutir os tipos e a natureza dos governos;
  2. A forma que esses governos devem encontrar na manutenção da estabilidade. 
Antes de entrar em sua teoria política em si, o autor destaca o conceito de lei para Montesquieu. Para o filósofo francês, as leis não são expressões divinas, mais representam relações necessárias entre diversas classes em que se divide a sociedade civil. Montesquieu revoluciona, assim, o conceito de lei. Em sua Teoria dos Três Governos, Montesquieu parte da natureza e princípio desses tipos. A natureza de um governo diz respeito a quem detém o poder e o princípio a justificação. Eis as formas de governos em sua teoria: 
  • A monarquia, regida pelo princípio  da honra. Seria um governo de um só, governando através de leis fixas;
  • A república, regida pelo princípio da virtude. Seria o governo do povo (se tratando de uma democracia) ou de parte dele (se tratando de uma república aristocrática);
  • O despotismo, regido pelo princípio do medo. Seria o governo de um único déspota que governa com base em suas paixões. 
Dentro da monarquia, em caso de corrupção, tínhamos uma tirania. Já dentro da república, em caso de corrupção, tínhamos uma oligarquia. A demagogia seria outra forma de corrupção da república. Em Montesquieu, a república teria difícil implementação pois se baseia na virtude dos homens e no máximo teria êxito num território pequeno. Na república os grandes não a querem e o povo não sabe conduzi-la, depende assim e republicanos virtuosos que são minoria. O despotismo gera constantes rebeliões e consequentemente instabilidade política. Frente a isso, Montesquieu como membro da nobreza francesa, enxerga no regime monárquico como o ideal. Mas não a monarquia absolutista defendida por Thomas Hobbes, sim uma monarquia parlamentar ou constitucional aos moldes ingleses. Por fim, Montesquieu enxergava a república como o governo do passado, a monarquia do presente a o despotismo a ameça que pairava sobre o futuro. 

05) Rousseau: da servidão à liberdade - Milton Meira do Nascimento - Último contratualista estudado, Jean-Jacques Rousseau é o autor que aparece ser o mais coletivista desses filósofos. De imediato Rousseau considera a essência humana boa, entretanto, o meio a corrompe. Ou seja, o homem é produto do meio social em que está inserido. 

Enquanto ao estado de natureza, Rousseau imaginava ser tranquila onde imperava a paz e a igualdade entre os homens. Essa felicidade seria recorrente a ausência de propriedade, sendo essa coletiva e à serviço de todos. O surgimento e avanço da propriedade privada colocaria fim a esse estado de natureza, decorrendo disso o surgimento da divisão social do trabalho. Essa mudança dividiu os homens entre proprietários e não proprietários, subordinados e poderosos, ricos e pobres. Com o surgimento das desigualdades, surgem os conflitos e o aparecimento do Estado é a institucionalização do poder de um punhado de poderosos que utiliza dessa nova instituição o meio de proteger sua propriedade privada. Logo, Rousseau critica o contrato social instituído e propõe outro que realmente sirva a maioria. 

O Estado deve representar a maioria, então soberanas. As leis devem da voz a vontade geral, sendo a expressão dessa soberania. Para Rousseau a vontade geral não pode ser representada, é o próprio povo que deve participar das leis constituintes. O legislativo e o executivo apenas praticam as leis pensadas coletivamente pela maioria. Coletivista, propõe o fim da propriedade privada como meio de combater a desigualdade e instituir a liberdade. Apesar de um grande visionário, Rosseuau era pessimista as suas propostas. Para ele, os homens perderam sua liberdade desde o fim do estado de natureza e com isso as chagas como o individualismo e o egoísmo tornaram-se hegemônicas. Isso dificilmente seria revertido. Suas ideias foram bastante seguidas pelo setor mais revolucionário da Revolução Francesa, os chamados Jacobinos. 

06) "O Federalista": remédios republicanos para males republicanos - Fernando Papaterra Limongi - O capítulo trata dos teóricos chamados de federalistas que ajudaram na construção da primeira Constituição dos EUA, logo após a guerra civil que libertou o país do jugo inglês. Alexander Hamilton, James Madison e John Jay são os teóricos federalistas abordados. Madison é o autor mais focado, tendo em vista sua maior influência que os demais. Hamilton, centralizador, não teve muitas de suas ideias postas em prática. A base filosófica dos federalistas foi o filósofo francês Montesquieu, já resumido aqui. 

O federalismo norte-americano nasce através de acordos políticos entre os estados, representando a convivência desses estados com a União Federal. Para Madison, a natureza humana era ambiciosa e por isso a razão da presença de um Estado era primordial na manutenção da ordem. Esse Estado, todavia, não pode ser centralizador pois daria brecha para que os homens usurpassem do poder. Segundo ele, os homens são governados por outros homens e não por anjos, sendo então necessário regular a máquina estatal. Essa descentralização política ocorreria com base na separação dos poderes pensada por Montesquieu. A diferença é que nos EUA não se tinha condições de instaurar um "governo misto" aos moldes ingleses, onde o Estado fosse dividido entre nobreza, oligarquia e povo. Nessa separação de poderes é preciso cautela para que nenhum deles se sobreponha ao outro. Numa república, o legislativo tende a ter uma autonomia maior sendo necessário a criação de mecanismos como o Senado além de um fortalecimento do judiciário. A lógica é que um poder regule o outro. 

Outro ponto discutido pelos federalistas são as facções, ou seja, a formação de oposição. A oposição é natural, tendo em vista a diversidade do pensamento humano e a desigual divisão da propriedade. Madison acreditava ser essencial dar voz a maioria, porém, governar para a maioria também seria uma forma de tirania. Logo, o remédio para males republicanos é buscar aumentar a área e o número de cidadãos sob a tutela do governo impedindo o desenvolvimento de qualquer extremismo. 







Getúlio Vargas e o Triunfo do Nacionalismo Brasileiro



  • Sobre o autor: Ludwig Lauerhass nasceu em Los Angeles (EUA) em 1935. Foi um teórico brasilianista, ou seja, estrangeiro que procurou estudar e se aprofundar sobre a História do Brasil. A presente obra foi resultado de sua tese de doutorado em História pela Universidade da Califórnia em 1972. Ele está ao lado de Thomas Skidmore e Joseph Love como autores brasilianistas. 


Getúlio Vargas e o Triunfo do Nacionalismo Brasileiro: estudo do advento da geração nacionalista de 1930 - Ludwig Lauerhass, Jr. - Editora Itatiaia



Introdução - A introdução feita pela historiadora Celina Moreira Franco que vem destacar a essência da obra. Segundo ela, Lauerhass analisa o Brasil com o recorte no nacionalismo que para ele ganha destaque a partir da Proclamação da República em 1889. A partir de 1930, a preocupação em volta do nacionalismo deixa de ser exclusiva da intelectualidade para ser uma questão de Estado. Nesse livro o autor traça a gênese das ideias nacionalistas no Brasil, seu desenvolvimento durante a Primeira República (1889-1930), sua nova forma entre 1930-1937 e seu auge a partir da instauração do Estado Novo em 1937. Essa breve introdução remonta de janeiro de 1985. 

Capítulo 01 - O Problema do Nacionalismo Brasileiro

Esse primeiro capítulo é subdivido em 06 partes que serão brevemente resumidas abaixo. Seguem as partes: A) O Problema Delimitado - Vargas, Nacionalismo e o Surgimento da Geração de 1930; B) Definições - Revolução e Nacionalismo; C) Natureza e Características do Nacionalismo Brasileiro; D) Qualidades e Características da Revolução no Brasil; E) Principais Componentes do Nacionalismo Brasileiro - A busca da identidade nacional, o ardor patriótico, o combate ao regionalismo, a exigência de legitimidade e moralidade políticas e luta em prol do desenvolvimento econômico; F) Grande Variedade do Nacionalismo Brasileiro - Liberal-democrático, autoritário-do-centro, progressista-conservador e pragmático. 

Lauerhass inicia sua obra se questionando o porquê Getúlio Vargas, político gaúcho que chegou ao poder após a Revolução de 30, conseguiu estabilizar o país tornando-se árbitro de tendências políticas antagônicas. Para ele, a resposta de que isso foi resultado de sua habilidade política (existente para o autor) é simplista e desconsidera aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais que tem no fenômeno do nacionalismo sua causa principal. Em suma, a força do nacionalismo desenvolvida por Vargas contribuiu para a manutenção do seu poder. O objetivo da obra seria traçar um desenvolvimento do nacionalismo brasileiro, tanto antes de Vargas quanto durante seu governo. A análise histórica do fenômeno se encerra em 1945, após a queda do Estado Novo que foi o período onde o nacionalismo brasileiro encontrou seu auge. A obra busca trazer as implicações que o nacionalismo trouxe na política brasileira, após a Proclamação da República em 1889, em meio a uma sociedade que estava em constante processo de transição de uma sócio-economia tradicional para uma moderna. 

Antes de entrar nas nuances do desenvolvimento nacionalista brasileiro, o autor conceitua "revolução" e "nacionalismo". Revolução seria um processo político abrupto e violento onde um grupo dominante é retirado do poder sendo instalado um novo grupo que contém forte apoio popular. As principais ações dos revolucionários é revitalizar o Estado, fortalecendo-o. Isso tudo no plano político. No plano econômico, a sociedade passa a ser palco de uma redistribuição da propriedade tornando-a mais equitativa. Já o nacionalismo, consiste tornar o Estado-nação o elemento central da ordem social devendo ser o foco da lealdade dos cidadãos. Nesse ponto de vista, o Estado-nação é responsável pelas principais decisões que rodeiam os negócios humanos. No plano externo, busca sua independência política de forças externas e no plano interno se esforça para desenvolver e integrar o país. O nacionalismo se mostra em três aspectos, são eles: 
  • Ideológico - a nível ideológico o nacionalismo se mostra através de escritos que buscam criticar a sociedade existente, apontando para a necessidade da construção de uma nova; 
  • Institucional - a nível institucional o nacionalismo se mostra não através de uma instituição em si, mas de uma gama de instituições que estão à seu serviço como partidos políticos, constituições, escolas, esportes e que podem ser personificadas nessas instituições através de instrumentos simbólicos como bandeiras, monumentos, festividades, canções e heróis nacionais; 
  • Popular - a nível popular o nacionalismo se manifesta através de um sentimento supremacista da nação que em tempos de crise são ovacionados por diferentes atores políticos. 
Para além desses aspectos, o nacionalismo é encontrado em diferentes espectros políticos. Conservadores, liberais e socialistas utilizam aspectos nacionalistas citados acima em suas atividades políticas. Logo, o nacionalismo não é fruto de um único espectro político. Ele surge no Século XVIII, combinando patriotismo (a ideia de defender sua terra natal) e as ideias de nacionalidade (a ideia de fazer parte de um grupo social culturalmente distinto a todos os outros). Seu objetivo é a independência e a igualdade, combatendo o cosmopolitismo e o universalismo. O único valor considerado é o Estado-nação. Não sendo patrimônio de nenhum espectro político, o nacionalismo navega tanto pela reação quanto pela revolução a depender do contexto histórico. 

Após esse aparato mais geral, o autor entra na caracterização do nacionalismo brasileiro. É feita uma breve síntese da História do Brasil. Diferente dos demais países da América Latina, a independência política do Brasil não foi resultado de uma revolta armada mais de um jogo de negociações que deu ao nacionalismo brasileiro um papel secundário ou quase inexistente. Durante o período regencial, os que comandaram o país não utilizaram símbolos pátrios próprios. Já no Brasil Império, os interesses nacionais foram substituídos por interesses pessoais e regionais fazendo o nacionalismo não ter espaço para seu desenvolvimento. Só a partir da Proclamação da República é que aspectos do nacionalismo começam a aparecer, principalmente, no plano ideológico. O resultado de tudo isso foi um nacionalismo retardatário, destacado pelo autor da seguinte forma: 
"A natureza característica do nacionalismo brasileiro deriva, em parte, de seu aparecimento retardatário. Não se associou, primordialmente, à conquista da independência e à hostilidade aos portugueses. Não reviveu como reação direta ao domínio político estrangeiro ou outras ameaças vindas do exterior, mas antes como reação a crises internas. Tal fato, combinado com a prolongada ausência de séria ameaça política externa durante o Século XX, contribuiu para reduzir a um mínimo seu conteúdo de hostilidade ao estrangeiro politicamente inspirada" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 21)
É só a partir de 1930 que o nacionalismo ganha um vulto maior, ganhando expressão todos os seus aspectos vistos acima. A busca a partir de 1930 foi de um desenvolvimento interno que buscasse fortalecer um Estado-nação moderno, junto com uma cultura nacional. Como podemos observar, não se trata de um nacionalismo xenófobo, bélico e expansionista como observamos na Europa.

Passada a análise das suas características o autor trás os objetivos que se encontram no nacionalismo brasileiro. Destacaremos abaixo cada um desses objetivos:
  • A busca da identidade nacional - Afinal, o que é o Brasil? O que é ser brasileiro? Essas respostas só foram esboçadas a partir da Proclamação da República. No Brasil Colônia, durante o domínio português, o foco na família era mais presente que a ideia de nação. No Império, já pode-se observar a ideia de um desenvolvimento nacionalista, mas ainda restrito a um grupo seleto de intelectuais e políticos. É apenas na República que essa busca pelo conceito de Brasil ganha desenvoltura, sendo o processo acelerado após 1930 onde "observou-se uma identificação mais ampla e mais geral com o Brasil, a nação, como entidade sócio-psicológica e cultural, relacionada com o mundo lusitano, mas dotada de personalidade própria, desenvolvida através de uma experiência histórica sui generis" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 24);
  • Impulso patriótico - Esse aspecto teve no Brasil menos desenvolvimento em comparação com outros países latino-americanos. A falta de intervenção externa e a conquista da independência política por meio de negociatas, tornou o amor ao país passivo e o resultado disso é a carência de heróis nacionais como San Martin, Simón Bolívar etc. A figura vista historicamente como "patriarca da independência" é José Bonifácio, político que mais representa o racionalismo político das negociatas que propriamente um patriota ardoroso e revolucionário. Esse impulso patriótico só veio ser estimulado a partir de 1930, seja contra o estrangeiro (o japonês, o italiano e principalmente o alemão) antes da Segunda Guerra Mundial seja o entreguista a favor do capital estrangeiro e o comunista após a Segunda Guerra Mundial;
  • Ataque ao regionalismo - O combate ao regionalismo foi peça-chave no desenvolvimento do nacionalismo brasileiro, tendo em vista a "extrema fragmentação social do Brasil, resultante do próprio tamanho do país, dos padrões históricos de sua colonização, de sua pronunciada diversidade geográfica, da predominância da sociedade rural e da falta de um único foco centralizador" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 25). Entre as propostas dos nacionalistas para combater o regionalismo, estavam a melhoria do sistema de transportes e comunicação do país e uma consequente promoção do desenvolvimento econômico de regiões atrasadas como o Nordeste e a Amazônia. O combate as oligarquias políticas de estados dominantes, como as paulistas e mineiras, também foi pauta presente; 
  • Legitimidade política, moral e eficiência política - Entre as ideias contidas nesse aspecto, temos a busca em retirar o poder das mãos de uma minoria oligárquica se apoiando em bases sociais mais amplas e populares. Para que tivesse legitimidade era preciso servir a todos os grupos presentes no país. Inclusive, grupos historicamente negligenciados. O âmbito moral ficava por conta da transparência e honestidade. Tudo isso dentro de uma constituição que não fosse uma mera cópia de países estrangeiros, mas que trouxesse mecanismos compatíveis com as especificidades do país. Como fazer tudo isso? Chamando o povo, fazendo campanhas civilistas que desenvolvessem nas massas o dever cívico;
  • Justiça Social - Por fim, a ideia de justiça social está presente em todas as vertentes do nacionalismo brasileiro. Deve-se desenvolver a nação para que todos possam dela desfrutar condições de vida satisfatórias. A partir de 1930, a preocupação com os mais pobres vira caso de preocupação do Estado-nação que garante uma série de direitos políticos, sociais e econômicos para grupos sociais historicamente esquecidos. Porém, limitações são vistas como a completa ausência de políticas para o trabalhador rural que permaneceu ignorante e a mercê do poder dos grandes proprietários de terra. Além disso, antigos valores sociais encontrados no campo foram transferidos para os centros urbanos, retardando seu completo desenvolvimento. 
Por fim, Lauerhass mostra a variedade de vertentes do nacionalismo brasileiro que se expressaram durante o Brasil República. São elas: 
  • Liberal-democrático - civis, anti-militaristas, legalistas, parlamentaristas e porta-voz das classes médias; 
  • Autoritário do centro - militarista, golpista, positivista, bonapartista, defensora das classes médias; 
  • Progressista-conservador - civis, católicos, tradicionalistas, pró-portugueses, defensores das classes altas e médias; 
  • Pragmático - civis, personalistas e defensores das classes médias. 
De forma bem resumida seriam essas as 04 principais vertentes encontradas no nacionalismo brasileiro entre 1889 e 1937. As diferenças entre essas vertentes são "vinculada ao grau de mudanças desejáveis da estrutura social, e a outra relacionada com a amplitude da centralização do poder necessária para a consecução de tal objetivo" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 30). Porém, se juntam quando nenhuma de suas vertentes alcançou um estágio extremista, sendo todas caracterizadas por sua moderação política. Adiantando o que vai ser visto durante toda a obra, Lauerhass mostra que analisará o desenvolvimento do nacionalismo brasileiro dentro de uma ordem cronológica que foi assim pensada: 
  1. Primeira geração de nacionalistas (1880-1914)
  2. Nova geração de nacionalistas (1915-1929);
  3. Predomínio nacionalista (1930-1937);
  4. Nacionalistas intrusos (fascistas e comunistas)
  5. Triunfo do nacionalismo (1937-1945)
Capítulo 02 - O despertar do nacionalismo - A primeira geração nacionalista (1880-1914)

Esse segundo capítulo é subdivido em 03 partes: A) Tendências gerais; B) Intelectuais nacionalistas inovadores - Sílvio Romero, Euclides da Cunha e Alberto Torres; C) Surgimento dos principais tipos de nacionalismo - Liberal-democrático (Rui Barbosa), Autoritário-do-centro (Florianismo e Hermismo), Progressista-conservador (Eduardo Prado e Dom Luís) e Pragmático (Pinheiro Machado). 

A primeira geração nacionalista surge em fins do século XIX em consequência de uma variedade de mudanças sociais que vinham ocorrendo no país. O desprestígio do Império era só a ponta do iceberg. O progresso na integração do país, a abolição da escravatura, o urbanismo, o incipiente processo de industrialização, a imigração europeia e entre outros fatores ajudaram a formar uma nova mentalidade nacional que se questionaria em entender o Brasil. Uma nova classe de intelectuais surgia buscando criticar os problemas nacionais existentes e ao mesmo tempo formular uma ideologia para o florescimento do nacionalismo brasileiro. Para esses intelectuais era preciso entender o país para alterar os padrões culturais existentes com o intuito de torná-los nacionais e de alcance popular. Desses intelectuais pioneiros, três se destacaram: A) Sílvio Romero; B) Euclides da Cunha; C) Alberto Torres. 

Sílvio Romero - influenciado fortemente pelo Darwinismo Social - buscou compreender os princípios da nacionalidade brasileira para assim enxergar com mais clareza os problemas enfrentados pelo país. Sua influência evolucionista levou a crer que o Brasil era um país ainda atrasado e em processo para tornar-se uma nação. A integridade nacional seria alcançada após uma completa integração entre as diversas etnias existentes no país. Por isso era de extrema importância espalhar o branco europeu para todas as regiões, pois sua concentração no Sul criava uma divisão nacional. Outras propostas de cunho social e econômico eram propostas por Sílvio como reforma agrária, reforma educacional e maior inserção do proletariado na sociedade. Era um crítico tanto dos conservadores centralizadores que advogavam o Império, quanto dos republicanos federalistas que queriam transferir a constituição norte-americana para a realidade brasileira. 

Euclides da Cunha foi outro grande intelectual pioneiro. Com sua célebre obra "Os Sertões", ele adverte para a falta de unidade nacional e aponta a necessidade de sua integração. Os dois Brasis existentes, travam o embate entre o sertanejo bárbaro e o litorâneo civilizado que é representada pela Guerra de Canudos que ele dar cobertura jornalística. Sua crítica vai ao litoral civilizado que, tomando uma cultura emprestada, exclui da sua missão civilizadora o sertanejo. Apesar de tudo, Euclides era otimista e acreditava na construção de uma civilização futura onde "o sertão seria civilizado e o litoral nacionalizado, eliminando-se, destarte, os "dois Brasis" e tornando realidade uma cultura nacional mais vigorosa" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 42). A ciência e a Sociologia em específico teriam um papel primordial no processo de entendimento do país e também de sua transformação. Para isso, era necessário investimento governamental que patrocinasse cientistas preocupados com o entendimento do país. 

Alberto Torres foi outro intelectual preocupado na construção de uma nacionalidade. Diferente dos outros dois, ele sai da pura acusação para a formação de uma ideologia nacionalista bem estruturada. Em suas ideias afirmava ser necessário construir um caminho que não fosse a pura repetição de receitas externas. O Brasil era preciso ser palco de um governo forte que protegesse o país das ameaças imperialistas. Esse governo forte passaria pela construção de um Poder Coordenador, responsável pela integração entre os vários órgãos governamentais. Então, 
"O projeto constitucional de Torres incluía, portanto, inúmeros dispositivos específicos, destinados a integrar os indivíduos em uma nova sociedade nacional e combater as forças dispersivas do regionalismo, de grupos econômicos e do imperialismo estrangeiro" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 44)
Em suas soluções políticas, Torres apontava para um Senado corporativista com cada candidato tendo que apresentar um programa de âmbito nacional a fim de se tornar elegível. No plano econômico, as restrições ao imperialismo deveria ser expressa pela nacionalização de setores estratégicos. No plano intelectual, propunha a formação de um instituto para estudar os problemas nacionais. Como podemos observar, as ideias de Torres se mostraram mais organizadas e estruturadas que a dos anteriores. Mesmo assim, a ação política de todos era restrita ou quase nula. Suas ideias sobre o Brasil ficavam então presas ao campo puramente intelectual e abstrato.

Debatido o pioneirismo da obra desses três autores, Lauerhass passa para a formação das principais vertentes políticas do nacionalismo brasileiro. Começando pela vertente liberal-democrática, o autor trás a importância de Rui Barbosa. Sua figura foi representante dessa vertente na primeira geração de nacionalistas. Rui foi figura ativa no processo que resultou na Proclamação da República, sendo peça-chave no governo provisório que sucedeu a queda de D. Pedro II. Diferente de Sílvio, Euclides e Torres ele teve uma participação política mais ativa sendo de fato mais um político que um intelectual. Diferente dos intelectuais, que buscavam encontrar a natureza da brasilidade em suas abstrações, Rui tinha outras preocupações como "problemas mais concretos de legitimidade, eficiência e moralidade políticas; desenvolvimento econômico; justiça social, e preservação da unidade e do prestígio da Nação" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 46). Sua ação no governo provisório, logo o diferenciou das outras vertentes do nacionalismo como os autoritários-do-centro e também dos conservadores. Sua preocupação era eliminar os resquícios da monarquia que privilegiava castas, mas combatendo o autoritarismo militar para que esse não instalasse uma nova casta no poder. Em combate a essas vertentes, Rui defendeu medidas como separação da Igreja do Estado, sufrágio mais amplo, expansão do ensino público, garantia das liberdades civis, igualdade perante a lei, controle civil dos militares etc. Essa sua fase anti-militarista se intensifica após o rompimento que teve com Deodoro da Fonseca, seguido pela oposição ferrenha realizada a Floriano Peixoto. Em 1910, lidera a chamada Campanha Civilista em que disputa e perde as eleições presidenciais do mesmo ano para Hermes da Fonseca.

Após sua segunda derrota presidencial, em 1919, Rui passa a defender com clareza a inserção do proletariado urbano e rural aos benefícios concedidos pela modernidade. Porém, "não pela adoção de uma forma doutrinária de socialismo, mas pelo esforço conjunto de todos os elementos produtivos da sociedade, de maneira a estabelecer uma democracia social cristã de verdade" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 48). Além dessa percepção, Rui passa a defender alianças com setores militares à semelhança da ocorrida em 1889, tendo em vista sua completa desilusão com a democracia oligárquica dominante. O objetivo dessa aliança era "republicanizar a República", se afastando com isso de sua antiga posição anti-militarista.

A vertente liberal-democrática é o lado civil do processo de 1889. O lado militar é quem vai dar origem, segundo o autor, da vertente autoritário-do-centro. Ao contrário dos liberais-democráticos, os autoritários-do-centro minguavam de lideranças. As que surgiam estavam a mercê dos interesses de civis, nacionalistas ou não-nacionalistas. Se configura, inicialmente, como uma vertente inexperiente politicamente e sem um norte ideológico bem definido. Um fator para essa falta de lideranças é "a tradicional concepção dos militares de que a sua missão institucional era protetora e essencialmente apolítica" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 48). Apesar de tudo isso, o nacionalismo de vertente autoritário-do-centro foi uma expressão política presente nos primeiros anos da República tendo em vista dois fenômenos pontuados pelo autor: o Florianismo e o Hermismo.

O Florianismo é visto como o período que corresponde ao Governo de Floriano Peixoto (1891-1894). Suas ações centralizadoras e autoritárias foram de extrema relevância para a consolidação da República, reprimindo grupos separatistas regionais e monarquistas restauradores. Basicamente conseguiu controlar a instabilidade que tentava se estabelecer sob intervenções militares e federais nos estados. Em suma, "o florianismo ficou como um vago sentimento, ardentemente patriótico, antilusitano e, de um modo geral, contrário dos estrangeiros, defendendo a nacionalização da política e do comércio, assim como a proteção da unidade cultural e maior integração da sociedade" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 50). Além do florianismo, o Hermismo foi outro fenômeno político dessa primeira geração de nacionalistas autoritário-do-centro. Atacando o poder das oligarquias regionais ao nomear governadores, Hermes mexeu com os interesses das oligarquias regionais e acabou saindo do poder.

Tanto a vertente liberal-democrática, quanto a autoritário-do-centro têm-se semelhanças e por isso alianças entre esses setores foram possíveis. Ambos estavam preocupados com a unidade nacional, a estabilização da República e o combate as forças monarquistas que tentavam restaurar a antiga ordem. Porém, suas diferenças se encontravam nos meios para realizar tais tarefas. Enquanto os liberais só aceitavam um governo autoritário em situações emergenciais, os autoritários-do-centro enxergavam na ditadura a maneira viável de alcançar os objetivos. Esse pensamento segue uma forte influência positivista que essa última vertente teve, principalmente de figuras como Benjamin Constant e Júlio de Castilhos que no Rio Grande do Sul chegou a institucionalizar uma constituição estadual com forte influência positivista.

Essas duas vertentes, porém, estavam em completa oposição ao nacionalismo conservador que tinham nos monarquistas restauradores suas principais figuras. O objetivo dessa vertente era desenvolver o país, mantendo a ordem social que foi derrubada em 1889. Em suas concepções, acreditavam que a monarquia estava nas raízes identitárias do Brasil e a República não poderia superar os problemas nacionais. A principal liderança monarquista dessa primeira geração de nacionalistas conservadores é Eduardo Prado. No âmbito internacional, Prado criticava duramente a influência norte-americana que começava a crescer no país, sendo a Constituição de 1889 uma prova real e concreta disso. Essa aproximação, afastava o Brasil de suas origens lusitanas e católicas. Outra figura desse tipo de nacionalismo foi o Príncipe Dom Luís de Orleans e Bragança. Os nacionalistas conservadores não conseguiram superar os seus rivais liberais, autoritários e muito menos as oligarquias regionais que tomaram o poder executivo após a vitória eleitoral de Prudente de Moraes.

Já o nacionalismo pragmático, foi representado nessa primeira geração por Pinheiro Machado. Político gaúcho, ele buscou articular habilmente os variados interesses políticos existentes nos anos iniciais da República. Perspicaz, percebeu que um confronto aberto entre forças nacionalistas e não nacionalistas era inviável tendo em vista a desorganização e incipiência dos primeiros. Ademais, "de um modo geral, contudo, devido aos seus antecedentes gaúchos e à sua inclinação para o castilhismo e para o florianismo, procurou promover um forte governo central e combater o monopólio de fato exercido por São Paulo e Minas Gerais" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 52). A sua morte prematura, porém, fez com que o nacionalismo pragmático não tivesse vida orgânica na segunda geração a ser analisada no próximo capítulo.

Capítulo 03 - Um nova geração - agitação nacionalista e rebelião (1914-1929)

Esse terceiro capítulo é subdividido em 03 partes: A) Tendências gerais; B) Desenvolvimento intelectual - Revista do Brasil, Semana de Arte Moderna, Movimento Modernista, Paulo Prado e À Margem da História da República; C) Desenvolvimento político - Liberal-democrático (Ligas Patrióticas e Partidos Democráticos), Autoritário-do-centro (Tenentismo) e Conservadores (Grupos Nacionalistas e Centro Dom Vital).

O que pensava e em que contexto sócio-político se encontrava essa segunda geração de nacionalistas? Se a primeira durou de 1880 a 1914, a segunda durou de 1914 até 1929 e foi bastante influenciada pela Primeira Guerra Mundial. No plano internacional, a Primeira Guerra Mundial fazia surgir o ardor patriótico após a entrada do Brasil no conflito. Além disso, também serviu para mostrar que a economia brasileira era dependente e limitada assim como fez-se duvidar uma suposta superioridade européia sobre o país. Enquanto que no plano interno, o espírito de rebeldia e mudanças se aglutinavam contra as forças que hegemonizavam a República Velha. O pensamento de valorização dos aspectos da modernidade mais à crítica as velhas forças dominantes era a base ideológica dessa nova geração, marcada pelo Modernismo e Tenentismo. Nesse período a vertente autoritário-do-centro ganha mais força que as demais, principalmente, pelo prestígio dado ao Exército Brasileiro após sua participação no conflito mundial.

No plano intelectual, tivemos o desenvolvimento da preocupação em entender o país. Dentre as expressões dessa tentativa, o autor destaca as seguintes:
  • Revista do Brasil - chefiada por Monteiro Lobato, buscava ser "um núcleo de propaganda nacionalista, estimulando os jovens escritores a apresentarem estudos sobre os principais problemas do país e as raízes históricas da cultural brasileira" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 62). O papel da revista era entender o país, compreender a natureza da brasilidade e assim se aproximar da realidade brasileira. Vários eram os pontos de vista dos autores que nela trabalhavam, seja o estudo da história do país ou um enfoque mais antropológico em que visava entender a variedade étnica e regional do país. A preocupação de Euclides com o sertão foi personificada na obra de Monteiro Lobato que criou o personagem Jeca Tatu, homem do campo desnutrido e supersticioso que vinha demonstrar o esquecimento do litoral sobre o interior; 
  • Semana de Arte Moderna e o Movimento Modernista - no plano artístico, tivemos a semana de arte moderna em 1922. A ideia era demonstrar, através das artes, à crítica ao velho e a busca pela construção do novo que deveria ser baseado numa reconstrução cultural. Porém, o movimento modernista que dessa semana de arte resultou, não tinha engajamento político suficiente para intervir na realidade. Além disso, passou por uma cisão. De um lado os antropofágicos, posteriormente vinculados ao pensamento político de esquerda, que inicialmente trabalharam com a idealização do nativo passando para uma defesa dos mais pobres tanto da vida urbana quanto da vida rural. Do outro os verde-amarelo ou anta, posteriormente vinculados ao pensamento político de direita, que estavam preocupados na união dos vários elementos constitutivos da sociedade brasileira a fim de construir uma nação. A educação das massas e a acusação de que os antropofágicos eram cosmopolitas, também eram ideias presentes nessa vertente do Modernismo; 
  • À Margem da História da República - assim como a Revista do Brasil, buscava compreender o país e seus desafios. Porém, acrescenta-se sua preocupação com o engajamento político da nova geração que surgia. O estudo objetivista do país, baseado nas novas metodologias científicas das Ciências Sociais, era outra ideia presente. As mudanças que o país deveria passar não eram a base de nenhuma revolução armada, pelo contrário, a reconstrução pautada deveria ser dentro de uma "revolução branca". Após o estudo adequado do país, "apresentava uma fórmula de medidas "cientificamente" determinadas que levariam a uma espécie de Estado nacional cooperativo, sindicalista, que preservaria os direitos da liberdade privada, mas exigiria a justificação como função social" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 69). Para isso, era defendido um governo forte com papel ativo na sociedade e mantendo uma relação exterior nacionalista.  
No plano político, as variadas vertentes do nacionalismo brasileiro tiveram suas atuações representadas por vários movimentos. Os nacionalistas liberais-democráticos, organizados nas Ligas Patrióticas e Partidos Democráticos, representavam a oposição civil a República Velha focando suas ações políticas na educação e na propaganda. Seu objetivo era mobilizar a opinião pública contra os oligarcas. Diferente da primeira geração de liberais-democráticos, a segunda passou a firmar uma aliança com os militares tendo em vista o prestígio do Exército frente as massas após sua entrada na Primeira Guerra Mundial. Além desse motivo, os liberais-democráticos passaram a enxergar nos militares um importante meio de educar as massas, tendo em vista o serviço militar obrigatório oficializado em 1916. A instrução militar obrigatória teria papel fundamental na difusão de uma educação cívica nacionalista que almejavam, sendo um forte aliado do sistema educacional primário e profissional. Descentralizados, os nacionalistas liberais-democráticos não conseguiram construir nessa conjuntura uma organização ou uma liderança que unisse suas pautas. Dentro dessa vertente, encontramos uns mais conservadores que objetivavam apenas uma participação eleitoral maior das classes médias urbanas até mais revolucionários que superavam as propostas de Rui Barbosa no que tange a inserção dos mais pobres aos benefícios da sociedade brasileira. Porém, o que mais predominou nessa corrente foi a presença dos moderados que se organizaram tanto no Partido Democrata de São Paulo quanto no Partido Libertador do Rio Grande do Sul, mais tarde unidos no Partido Democrático Nacional. Nos programas desses partidos, porém, encontramos "pouca atenção à questão social, preocupando-se, acima de tudo, com a necessidade de uma reforma formal da Constituição, que quebrasse o monopólio político de fato exercido por diversas oligarquias estaduais" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 72)

A vertente autoritário-do-centro teve no tenentismo sua expressão política. Herdeiros do florianismo e hermismo, o movimento tenentista durou toda a década de 20 apesar de sua desorganização e não definição ideológica. Os tenentes se viam como restauradores da ordem e sua pauta se resumia a moralização da vida política, então afetada pelos oligarcas. Por estarem ligados aos meios militares, o tenentismo representou uma crítica mais contundente a República Velha em comparação com os liberais-democráticos. Enxergavam na possibilidade de tomar o poder pela força, caso fosse necessário, rompendo com as formalidades democráticas dos liberais. Foram ponta-de-lança das principais revoltas na década de 20 contra a República Velha, sendo os principais responsáveis pela chamada Revolução de 30. 

Por fim, os nacionalistas conservadores finalmente aceitaram a República e passaram a propor outras medidas que não fossem a volta ao sistema monárquico. Agora a busca era pelo fortalecimento da República, tendo em vista o estado anárquico estabelecido nos anos de 1920. Para manter a unidade nacional e a estabilidade era preciso recorrer a antigas identidades do país. A principal delas era o Cristianismo, representado pela Igreja Católica. Vinculados ao Catolicismo e não chegando a formar um partido político, os conservadores fizeram de espaços como o Centro Dom Vital seu palco para agirem politicamente. A principal figura do nacionalismo conservador foi Jackson de Figueiredo, então fundador do Centro Dom Vital. Atacando a "satânica" revolução, os conservadores atacavam liberais, socialistas, comunistas, maçons, protestantes e anarquistas. Apesar de pouco representativos na conjuntura política da época tomada pelo ardor revolucionário, os nacionalistas conservadores "criaram, pela primeira vez no Brasil, uma escola claramente definida de pensamento nacionalista de direita, como serviram de ligação entre duas facções políticas mais engajadas na política: os monarquistas da geração anterior e os integralistas de sua própria geração" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 77)

Capítulo 04 - Predomínio nacionalista - Fluidez e confusão (1930-1937)

Esse quarto capítulo é subdividido em 03 partes: A) Tendências gerais; B) Desenvolvimento intelectual - A "Brasiliana", Gilberto Freyre, A "Coleção Azul" e "Problemas Políticos Contemporâneos"; C) Desenvolvimento político - Liberal-democrático (Aliança Liberal, Partidos Democráticos e Facções); Autoritário-do-centro (Tenentismo); Progressista-conservador (Ação Católica) e Pragmático (Getúlio Vargas). 

Como ponto de partida, o autor destaca que na conjuntura pós-1930 ocorreu uma união entre intelectualidade e atividade política estando os primeiros mais envolvidos nos problemas nacionais. Além disso, os políticos profissionais agora buscavam base ideológica na intelectualidade para agirem na esfera política. Logo, encontramos uma conjuntura diferenciada tendo em vista que durante toda a República Velha os intelectuais se mostraram distantes da política no seu sentido institucional do termo. A causa de tudo isso foi a Revolução de 30, acontecimento histórico que levou à cena política o embate entre Regionalismo x Nacionalismo. O primeiro representado por São Paulo e o segundo pelas oligarquias dissidentes. Os nacionalistas se juntaram num bloco eleitoral chamado Aliança Liberal que uniu tanto liberais-democráticos (com seus Partidos Democráticos) quanto autoritários-do-centro (representados pelos tenentes). O pós-30 ofereceu, tanto aos intelectuais quanto aos políticos, vários desafios. Na esfera econômica, o recém imposto Governo Provisório chefiado por Getúlio Vargas precisava estancar a crise no país tendo em vista a alta produção de café acumulada a queda do seu preço no mercado internacional. No plano político e cultural, era preciso combater as velhas forças regionalistas que se movimentavam para uma reação, assim como inibir o desenvolvimento de ideologias estrangeiras como o comunismo e o fascismo que começavam a se expressar no país. Tudo isso deu maturidade aos intelectuais e políticos daquela conjuntura, sendo o começo dos anos dourados do nacionalismo brasileiro. 

No plano intelectual, o autor começa destacando o papel exercido pela "Coleção Brasiliana" que tinha como editor Fernando de Azevedo. O objetivo "era popularizar o sério exame da realidade nacional proposto inicialmente por Euclides e a que mais tarde fizeram eco, coletivamente, os membros da nova geração sem se limitarem a quaisquer disciplinas particulares e sem adotar um só e único ponto de vista nacionalista" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 87/88). A preocupação desses autores era mais com a crítica social, tendo os fundamentos das Ciências Sociais em voga, que com as formas literárias que marcaram os anos de 1920. Entre os autores que contribuíram estiveram Oliveira Vianna, Azevedo Amaral e Afonso Arinos. Obras de precursores como Alberto Torres, José Bonifácio e Tavares Bastos eram debatidas. Relatos de viagens e textos do tempo colonial também foram traduzidos. 

Ainda no campo da intelectualidade, encontramos a obra do pernambucano Gilberto Freyre. Freyre, que também contribuiu para a "Coleção Brasiliana", tinha em suas preocupações encontrar as raízes da identidade nacional. Em busca disso, mostrou em seus obras uma imagem positiva dos brasileiros. O choque de diversas etnias e culturas durante a história do país, possibilitou uma forma característica de sociedade no qual deveríamos nos orgulhar. Para ele, "a miscigenação racial e o amálgama cultural haviam criado o núcleo de um novo tipo de sociedade "luso-tropical" na América, como lançado as bases de uma variedade sui generis de democracia étnica e social" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 89). Segundo a teoria freyriana, a identidade nacional brasileira só seria encontrada se ocorresse primeiramente um sistemático estudo das realidades regionais do país. A partir dos estudos regionais, "a essência da cultural nacional poderia ser compreendida com maior clareza, quando o movimento nordestino e outros novos movimentos regionalistas se unissem e concentrassem a sua atenção nos valores culturais que ultrapassassem o plano regional para assumirem uma significação mais largamente nacional" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 90). O formador dessa civilização brasileira diferenciada é, em Freyre, a região Nordeste que permanece sendo um forte centro dinâmico de mistura cultural. 

Defendendo uma espécie de "panlusitanismo" (termo utilizado por Ludwig Lauerhass), Freyre afirmava que era incontestável a presença lusitana e católica na unidade nacional. Essa essência, bem típica na sociedade tradicional nordestina, deveria ser preservada e protegida da influência germânica que crescia com os imigrantes. Sobre a política nacional, sua visão era de que era preciso instituir um governo que respeitasse as tradições e estivesse atento as necessidades sociais do país. A figura de Vargas era elogiada pelo antropólogo, pois ele conseguia conciliar um governo central com um respeito as diversidades regionais. 

Outra manifestação intelectual nacionalista do tempo foi a "Coleção Azul" que durou de 1932 até 1933 sob edição de Augusto Frederico Schmidt. Entre algumas ideias desses intelectuais, podemos citar: a preocupação com o caos causado pós-30, a necessidade de impor um governo forte que acalmasse os ânimos, a preocupação do engajamento intelectual na vida política e a crítica a qualquer solução externa como o fascismo italiano, o comunismo internacional e o sistema liberal democrático baseado no federalismo norte-americano. A ideia era criar uma solução genuinamente nacional a problemas nacionais. O principal intelectual da "Coleção Azul" foi o sociólogo Virgínio Santa Rosa que procurava dar valorização à ordem política mesmo que ela custasse à liberdade. Entre suas propostas estava uma maior centralização do governo federal que deveria combater as oligarquias estaduais servindo como árbitro em prol da nação. Com isso, 
"Os trabalhadores deveriam ser organizados em sindicatos e os seus direitos protegidos pela legislação social. Poderiam ser organizados cooperativas de produção e consumo, e seriam nacionalizados os recursos naturais de importância vital, como as minas. Além disso, Santa Rosa considerava a reforma agrária como absolutamente indispensável para completar a revolução, não somente com a melhoria social e a integração econômica das massas rurais, como também na luta contra o poder das oligarquias" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 93).
Por fim, "Problemas Políticos Contemporâneos" editada por José Olympio, tinha como objetivo analisar a conjuntura da época sob base da teoria política. Mais parcial que as demais, aglutinava teóricos conservadores e ligados ao movimento integralista. Os caminhos democráticos eram rechaçados, assim como o crescimento do movimento comunista. Os intelectuais reunidos aqui se mostraram com um posicionamento autoritário e anticomunista.

No plano político os nacionalistas liberais-democráticos aglutinaram-se na Aliança Liberal que, em sua plataforma, basicamente seguia o pensamento político de Rui Barbosa principalmente a sua última fase onde encontramos uma preocupação maior com o proletariado. Após a Revolução de 30, alguns setores dessa vertente se afastaram de Vargas por ele não reconstitucionalizar o país. Foi o caso do Partido Democrático de São Paulo que já em 1932, estaria nas fileiras contra-revolucionárias. Faltava, naquela conjuntura, lideranças e maior unidade ideológica entre os liberais-democráticos que se mantiveram a mercê das ações políticas das outras vertentes. Em contraste, os autoritários-do- centro se viram melhor posicionados após a Revolução de 30 que os liberais-democráticos. Por transmitirem mais confiança a Vargas, receberam cargos importantes no governo e acabaram se consolidando. Tentaram radicalizar o processo, organizados no Clube 3 de Outubro que tinha uma forte inspiração nas ideias de Alberto Torres, mas após o fracasso das forças regionalistas de São Paulo o grupo foi enfraquecido por Vargas. Mesmo assim, a lealdade dos autoritários permaneceu até o fim do Estado Novo.  Já os nacionalistas conservadores, agora liderados por Alceu Amoroso Lima, mantinha sua aproximação com a Igreja Católica e apesar de manter boas relações com os integralistas não se vincularam publicamente ao movimento. Opondo-se ao liberalismo e ao socialismo, reunia as ideias políticas de Jacques Maritain com o programa econômico de Alberto Torres. Sua tarefa, "visava à pacífica e gradual instituição de um regime moderno, neotomista, baseado em uma união funcional da Igreja e do Estado" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 100).

Getúlio Vargas representou então o ressurgimento do nacionalismo pragmático. Agindo habilmente, utilizou de ideias políticas de várias vertentes, mantendo alianças com diversos setores do nacionalismo brasileiro. A plataforma da Aliança Liberal em que defendeu como candidato a presidência, tinha uma forte presença das ideias dos liberais-democráticos. Após 1930, porém, ele expressa suas tendências autoritárias na construção e manutenção do Governo Provisório. Entre suas ações, observamos uma maior sensibilidade com os problemas sociais dos mais pobres, garantindo uma série de direitos trabalhistas e sociais a esses setores. O autor destaca algumas medidas pré-1937 que foram construções para o futuro Estado Novo, como: reorganização do Exército, fortalecimento da polícia, centralização administrativa e a fundação do Departam0ento Nacional de Propaganda (DIP).

Capítulo 05 - Nacionalistas intrusos: comunismo e fascismo

Esse quinto capítulo é subdividido em 03 partes: A) Tendências gerais; B) Desenvolvimento intelectual - Caio Prado Júnior, Leôncio Basbaum, Plínio Salgado e Gustavo Barroso; C) Desenvolvimento político - Comunismo, Nacionalismo e a Frente Popular (ANL) e Nacionalismo Integral.

Desiludidas com a democracia liberal e inspirados em ideologias vindas do exterior, duas vertentes radicais se desenvolveram no Brasil dos anos 30. A primeira tinha inspiração na esquerda, influenciada pela URSS e o Socialismo Científico de Karl Marx, aglutinada no Partido Comunista do Brasil (PCB) e na Aliança Nacional Libertadora (ANL). A segunda tinha inspiração na direita, admiradora do Fascismo Italiano e aglutinada na Ação Integralista Brasileira (AIB). Em ambas correntes, encontramos um forte teor dogmático em suas ações e interpretações. Ambas tiveram um crescimento significativo após a Constituição de 1934 que não resolvera os problemas políticos e sociais do país. Sendo assim, a polarização entre essas vertentes radicais vão marcar o campo do nacionalismo brasileiro até o triunfo do Estado Novo em 1937. Bem organizados, esses movimentos tinham uma forte e disciplinada organização partidária que os colocaram à frente das demais correntes do nacionalismo brasileiro. O envolvimento de intelectuais também foi comum, passando esses de meros pensadores para dirigentes políticos.

No campo intelectual, o autor começa fazendo uma análise dos envolvidos com o nacionalismo radical de esquerda. O historiador Caio Prado Júnior é o primeiro a ser mencionado. Caio procurou em suas obras, sob um ponto de vista marxista, trazer uma análise diferente do Brasil que não fosse limitada a mera enumeração de acontecimentos. O período colonial tem grande importância para esse autor na busca de entendimento do Brasil, sendo o embate entre a aristocracia nacional e a burguesia burocrática portuguesa o principal palco de conflitos. Essa aristocracia, organizada no Partido Brasileiro, será a responsável pela Independência do Brasil em 1822 e as revoltas durante o Império mostram a disputa pelo poder de outras classes sociais como os setores médios urbanos. Outro intelectual ligado à esquerda foi Leôncio Basbaum. Esse, mais doutrinário que Caio Prado, não escondia suas simpatias pela URSS e o marxismo-leninismo. Em sua interpretação, o Brasil era um país semi-feudal dominado por latifundiários aliados das forças imperialistas. A burguesia industrial existente também estava aliada a interesses internacionais. Logo, "o imperialismo estava impedindo a natural luta de classe feudal-burguesa" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 115). Restava, pois, ao proletariado urbano e rural vencer tanto o imperialismo quanto os seus representantes no país. O caminho para a revolução socialista estava na construção de um Partido Comunista forte que fosse vanguarda da luta dos oprimidos.

Saindo dos intelectuais ligados à esquerda, o autor vai para Plínio Salgado, então fundador do movimento Integralista. Diferente dos seus adversários, Plínio foi bem menos cosmopolita. Entre suas influências, temos: Jackson de Figueiredo, Alberto Torres, Euclides da Cunha. De fora, trouxe influências do evolucionismo, neotomismo, neo-romantismo e irracionalismo. Os erros do Brasil para ele giravam em torno do racismo, cosmopolitismo, regionalismo e sentimento de inferioridade. Tudo isso deveria ser combatido com base num novo estado de espírito, uma espécie de transformação moral nacionalista que unificasse a mentalidade nacional. A mudança viria primeiro de uma mudança moral para depois ser material. A ordem, o equilíbrio e a não luta de classes eram ideias presentes em Plínio. Seu combate ao liberalismo e comunismo também merece destaque, sendo ambos frutos da decadente sociedade burguesa. No outro pensador integralista, Gustavo Barroso, vemos altas doses de anti-semitismo. O capitalismo, o comunismo e o judaísmo são forças destruidoras da sociedade brasileira que merece combate. Em sua visão, "as principais tarefas do integralismo consistiam em denunciar aquela conspiração, desmascarar os traidores nela envolvidos, apontar os erros básicos do liberalismo e do comunismo e criar uma nova democracia orgânica, corporativa e cristã, baseada na trindade Família, Pátria e Deus" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 119).

No plano político, os nacionalistas radicais de esquerda se organizaram no Partido Comunista do Brasil (PCB) que fora fundado em 1922 mas só ganhou importância nacional após a filiação do ex-tenentista Luís Carlos Prestes. Após o seu "Manifesto de Maio", Prestes se aproximou de dirigentes políticos marxistas e logo depois se converteu ao marxismo. Após a entrada de Prestes e sua volta do exílio, fundou-se a ANL que tinha como intuito ser uma grande frente popular anti-fascista que combatesse o avanço do integralismo e também do Governo Vargas. Entre as propostas da aliança, temos: "suspensão do pagamento de todas as dívidas externas imperialistas, a imediata nacionalização das empresas imperialistas, a redistribuição dos latifúndios e proteção aos pequenos e médios proprietários rurais, o livre exercício das liberdades públicas e a criação de um governo verdadeiramente popular" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 122).

A Ação Integralista Brasileira (AIB), não tinham uma relação direta e oficial com o exterior, apesar da simpatia dos seus integrantes pelo fascismo italiano. Italianos e alemães que buscaram exercer influência sobre os integralistas, apesar de criarem seus próprios movimentos no país. A simpatia pelo fascismo ocorreu por conta de Plínio Salgado que chegou a visitar a Itália. O anticomunismo e o nacionalismo conservador representados pelo Centro Dom Vital, Jackson de Figueiredo, Alceu Amoroso Lima e Oliveira Vianna são as principais inspirações ideológicas da AIB a nível nacional. Entre suas ideias estavam a criação de um Estado forte, respeitando a propriedade privada e assegurando os direitos sociais dos trabalhadores. A família era reverenciada, tendo em vista sua forte influência no Catolicismo e sua concepção de que representavam toda à nação os colocavam acima de um partido político. Suas ações se voltavam para o campo cultural, combatendo acima de tudo a conspiração comunista.

Capítulo 06 - O triunfo do nacionalismo - O Estado Novo (1937-1945)

Esse quinto capítulo é subdividido em 03 partes: A) Tendências gerais; B) Desenvolvimento intelectual - Francisco Campos, Azevedo Amaral e Cultura Política; C) Desenvolvimento político - Razão de ser e natureza geral do Estado Novo, Eficiência política e centralização do Estado, Combate ao regionalismo, Protecionismo e desenvolvimento econômico, Patriotismo, Justiça social e Identidade nacional.

Com o golpe de Estado em novembro de 1937, o nacionalismo brasileiro chega a seu apogeu. Ele deixa de ser apenas uma reflexão intelectual ou um programa governamental isolado para se tornar a base do governo rumo a um desenvolvimento sócio-econômico mais amplo. Os constantes conflitos das vertentes nacionalistas radicais, representados pela ANL/PCB e AIB, foram a justificativa para o golpe. O nacionalismo do Estado Novo reunia aspectos do florianismo, hermismo, tenentismo e do pragmatismo político de Getúlio Vargas. Entre as condições internas e externas que contribuíram para o Estado Novo, temos:
"A rápida urbanização, o impulso para a industrialização, o crescimento do proletariado, as ameaças de subversão o colapso político, a maior desilusão com os processos democráticos, a popularidade pessoal de Vargas, a apatia pública, o sucesso dos regimes autoritários na Europa e na América Latina e a crescente rivalidade entre o Eixo e as potências ocidentais" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 134).
O Estado Novo reprimiu a intelectualidade radical, tanto à esquerda quanto a direita do espectro político. Permitiu o desenvolvimento da literatura nacionalista que se alinhasse, totalmente ou parcialmente com o novo regime. Permitiu um grande espaço para ideólogos oficias ou quase oficiais como Francisco Campos e Azevedo Amaral. E, usando o DIP, organizou a revista "Cultura Política" com o intuito de movimentar outros intelectuais simpáticos ao regime. Pelo rádio e outros meios de propaganda, buscou divulgar a população as façanhas conquistadas por Vargas. Assim sendo, "o autoritarismo do Estado Novo, não provocou, pela subversão ou pelo terror, o eclipse da produtividade intelectual nacionalista" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 135). Houve, então, um amadurecimento do nacionalismo brasileiro e Vargas conseguiu conquistar um alto grau de consenso ao vincular o nacionalismo com os necessários processos modernizantes que o país passava.

No plano intelectual, Francisco Campos representa para Lauerhass o teórico mais contribuinte com a ideologia nacionalista do Estado Novo. Atuante durante o processo revolucionário de 30, Campos chegou a ocupar o cargo de primeiro Ministro da Educação do Brasil. Justificando o golpe de novembro de 1937, Campos afirmara que o clima de desordem instaurado pelas disputas entre extremistas (comunistas e integralistas) era um problema do dia que os dispositivos constitucionais legitimados em 1934 não davam conta da sua solução. O medo de uma guerra civil, tendo em vista a conspiração comunista em 1935, foi a causa principal do surgimento do Estado Novo que contou com o apoio das Forças Armadas e também da opinião pública. Porém, o Estado Novo não representava apenas a momentânea tranquilidade ao país. Também representava, finalmente, as retardadas esperanças dos revolucionários de 30 em pôr em prática suas esperanças. Campos, "tentou incorporar as realidades e aspirações brasileiras a um plano teórico de Estado, cujos atributos principais eram a força, a disciplina e a eficiência" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 137).

Campos ainda acreditava que era preciso substituir uma democracia "formal" por uma "substantiva", tendo em vista que os dispositivos da democracia liberal não resolvia a crescente instabilidade política no país. Logo, "a nova constituição estava lançando uma forma mais direta de democracia, responsável perante o povo em seu conjunto e na qual os direitos individuais seriam limitados e equilibrados com os direitos de toda a comunidade nacional" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 137). A vontade na nação estaria acima de interesses individuais ou de pequenos grupos. As ideias de Campos se aproximam das proferidas, anos antes, por Alberto Torres em considerar de extrema importância a instauração de um governo forte e nacionalista como pré-condição do desenvolvimento econômico e social brasileiro. Na economia, Campos defendeu um sistema corporativista onde a intervenção estatal fosse alargada. Embora jamais posto em prática, a Constituição de 1937 previa a criação de um Conselho Econômico Nacional, órgão responsável pela regulamentação da economia nacional. Enquanto que no plano educacional, Campos propunha um sistema educacional integrado a sociedade civil. Em suma, a educação puramente intelectual de origem liberal deveria ser substituída por outra mais completa que abarcasse uma instrução moral e cívica de cunho nacionalista. Campos enxergava na educação, "um meio de preparar cidadãos para cumprirem as suas obrigações para com a nação e proporcionar-lhes os instrumentos para cumpri-las com a eficiência exigida pela sociedade moderna" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 138).

Azevedo Amaral, outro apologista do Estado Novo, seguia o argumento de Francisco Campos na justificativa do regime. Acreditava que estava de acordo com o desenvolvimento histórico do Brasil e representava a junção entre nação e Estado. A inspiração que o Estado Novo deveria ter para Azevedo, era o "New Deal" de Franklin Roosevelt. O objetivo era preservar o sistema capitalista, suas ideias de individualismo econômico, mas defendendo também os interesses públicos. Seguindo um posicionamento diferente do hegemônico, Azevedo não enxergava com bons olhos os dispositivos constitucionais que limitavam à imigração e também a presença de capital estrangeiro na economia brasileira. Outro destaque dado por Azevedo é a figura política de Getúlio Vargas, considerado como "Chefe da Nação". O consenso angariado por Vargas tinha como causa "a sua não vinculação a um sistema ideológico e à ausência de fanatismo doutrinário - o que lhe dava a necessária flexibilidade para lidar efetivamente com qualquer que fosse o problema específico do momento. Assim, Getúlio tornou-se o mais consumado realista político e ao mais pragmático líder nacionalista de seu tempo" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 141).

A revista "Cultura Política" também representou grande importância no aparato ideológico do Estado Novo. Ao contrário de outras revistas já mencionadas, a "Cultura Política" representava uma criação direta do governo com o intuito de aprofundar os estudos sobre o Brasil. Sob direção de Almir de Andrade, a revista foi cria direta do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Logo se tornaria o principal órgão teórico do novo regime. A "Cultura Política" mostrou não só divulgar os feitos do novo regime como conscientizar a nação dos rumos fundamentais que o Brasil precisava passar, mostrando ao mesmo tempo que as ações políticas do momento nada mais eram que a concretização de ideais nacionalistas anteriores como as formuladas por Alberto Torres. Dentre as temáticas abordadas pela revista, destaca-se uma variedade de temas nacionais:
"Esses assuntos corriam toda a escala das questões nacionais - da mudança do papel da mulher na sociedade à necessidade de uma nova capital para o país, do bem-estar social à preparação militar, das relações raciais à reforma do serviço público civil, do folclore à produção siderúrgica, da educação primária à abertura da navegação no Amazonas - mostrando assim que Vargas e o seu governo se preocupavam com todos os aspectos da vida nacional" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 142)
Em seus artigos na revista, Almir de Andrade mostrava a necessidade de unir política à cultura, fato então negligenciado pela fracassada democracia liberal que ruía com o advento do Estado Novo. Essa junção, permitia vigorosa consciência política que permitiria a uma afirmação cultural mais incisiva do brasileiro.

Na última parte do capítulo, onde o autor destaca as implicações do Estado Novo no plano político opto por destacar suas ações em tópicos que o próprio autor utiliza no sumário para um melhor entendimento. Segue em voga:
  • Razão de ser e natureza geral do Estado Novo - A justificativa do Estado Novo girava em torno das ideias já expostas por Francisco Campos e Azevedo Amaral. O golpe era a instauração da paz social, contra as disputas políticas extremistas, o desenvolvimento da luta de classes e a neutralização do comunismo. O novo regime se sustentava em ideias de intelectuais brasileiros, não aceitando receitas prontas do exterior. Apenas a preservação da ordem poderia ser pré-requisito para o desenvolvimento econômico e social do país;
  • Eficiência política e centralização do Estado - A centralização política do novo regime colocou um poder gigantesco nas mãos de Getúlio Vargas que, basicamente, governou por meio de decretos. O monopólio sobre a administração pública foi sancionada através da criação do Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) que tinha como objetivo formar uma elite técnica e apolítica que combatesse a velha burocracia nepotista e criasse uma nova moral na gestão pública. A formação de novos burocratas, elevados moralmente sob um espírito nacionalista, seria outra tarefa do DASP além da administração pública em si; 
  • Combate ao regionalismo - Vargas reduziu o poder dos estados ao trazer de volta à tona as figuras dos interventores, nomeados diretamente pelo Poder Executivo Federal e devendo a ele responsabilidade. Além disso, desmembrou o DASP para os estados a fim de racionalizar e nacionalizar as funções administrativas estaduais. Eram os apelidados "daspinhos". Simbolicamente, proibiu o uso de bandeiras estaduais (artigo 02 da Constituição) e apenas símbolos de cunho nacional eram permitidos. Apesar disso, nunca deixou de salientar a necessidade de desenvolver regiões historicamente atrasadas como o Norte e o Nordeste. Sendo a personificação do novo regime, Vargas rodou o país durante os anos do Estado Novo, feito nunca visto antes na história do país; 
  • Protecionismo e desenvolvimento econômico - No campo econômico, o Estado Novo se preocupou com o desenvolvimento do mercado interno e a diversificação da economia nacional então limitada  alguns produtos agrícolas. Para isso, medidas protecionistas foram tomadas como: suspensão do pagamento da dívida pública, controle cambial, prioridades para as importações, crédito expandido e incentivos tributários ao desenvolvimento industrial e agrário. A substituição das importações era política oficial do Estado Novo e apesar da intervenção estatal na economia, os industriais apoiaram à ditadura. O combate ao capital estrangeiro também foi muito presente durante o Estado Novo. A indústria siderúrgica nacional desenvolvida pelo novo regime teve capital misto, contendo investimento público e privado. Porém, estritamente capital nacional. A proporção de empregados brasileiros também foi posta em prática, combatendo os imigrantes. A construção da Usina de Volta Redonda foi o marco principal do regime, sendo usado por Vargas como o grande símbolo do desenvolvimento econômico nacional. A obra, "representou o alvorecer de uma nova era industrial, que iria sobreviver ao Estado Novo, e atestou, simbolicamente, a capacidade do Brasil tornar-se, no campo econômico, um moderno Estado nacional" (LAUERHASS, Ludwig. São Paulo, 1986, Itatiaia, p. 147)
  • Patriotismo - O ardor patriótico foi desenvolvido pelo Estado Novo contra os imigrantes europeus instalados no país. Objetivando inibir esses setores, Vargas tomou medidas como: proibição de atividades políticas de estrangeiros, controle da imigração, deportação em caso de participação em atividades políticas, proibição de colônias de imigrantes isoladas, proibição de jornais e aulas em língua estrangeira, proibição de nomes estrangeiros em localidades e maior assimilação dos filhos desses imigrantes por parte do serviço militar obrigatório. A consciência nacional e sua integridade passava pelo combate as influências estrangeiras; 
  • Justiça social - A justiça social, de cunho paternalista e assistencialista segundo o autor, foi garantida após uma série de direitos trabalhistas garantidos como: salário mínimo, direito a férias, melhores condições de trabalho, assistência médica, expansão do ensino técnico e profissional etc. Ao mesmo tempo, Vargas buscou eliminar a influência radical (comunista, principalmente) no movimento sindical e centralizou no Ministério do Trabalho a sanção de fiscalizar os sindicatos; 
  • Identidade nacional - Buscando criar uma consciência nacional, o Estado Novo entre várias iniciativas implementou: o Instituto Nacional do Livro, ação do Ministério da Educação chefiado por Gustavo Capanema, que buscava popularizar escritos sobre a cultura nacional. Além disso, desenvolveu nas escolas a importância em desenvolver valores cívicos como a nacionalidade, o vigor físico, a moralidade, o trabalho etc. O DIP também exerceu forte influência na construção dessa identidade, seja em filmes ou através do rádio. O rádio foi, inclusive, a ferramenta principal utilizada por Vargas para alcançar a maior parte dos brasileiros. 
Capítulo 07 - O triunfo comprometido: o fim do Estado Novo

Por fim, Lauerhass encerra o livro comentando aspectos que deram fim ao Estado Novo como faz análises sobre o que ocorreu depois. Com o fim do Estado Novo, o poder estadual voltou a ser exercido com a volta dos governadores eleitos. O DASP foi fortemente atacado, perdendo sua antiga hegemonia. Na economia, os antigos valores liberais voltaram à tona, acompanhada de um enfraquecimento das políticas protecionistas. A moral nacionalista incentivada, foi substituída por um cosmopolitismo e os esforços pela garantia da justiça social foi novamente negligenciado pelo Estado. Sem o apoio dos militares, Vargas caiu através de um golpe em outubro e 1945. No plano intelectual, os marxistas surfando no prestígio da URSS pós-guerra cresceram sua influência em espaços como "Revista Brasiliense" e "Estudos Sociais". Grupos mais heterogêneos de estudos sobre o país foram aglutinados no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), sob patrocínio do Governo Federal. No plano político, o autor destaca o crescimento do nacionalismo conservador capitaneado pela figura de Carlos Lacerda, a morte do nacionalismo pragmático após o suicídio de Vargas em 1954, o enfraquecimento da vertente liberal-democrática e o isolamento dos autoritários na Escola Superior de Guerra só voltando a cena política após 1964. 

















segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Evolução Política do Brasil: colônia e império


  • Sobre o autor: Caio Prado Júnior nasceu em 11 de fevereiro de 1907 em São Paulo. De origem abastada, Caio formou-se em Direito pela Faculdade do Largo de São Francisco em 1928. Decepcionado com a Revolução de 30, filiou-se ao Partido Comunista do Brasil (PCB) em 1931, onde teria uma longa atividade política. Presidiu em São Paulo a Aliança Nacional Libertadora (ANL) e após o fim do Estado Novo seria eleito deputado estadual pelo PCB. Junto com Monteiro Lobato, fundou a Editora Brasiliense e durante a Ditadura Militar foi perseguido e preso pelas forças reacionárias. Como intelectual, foi um dos pioneiros na análise da sociedade brasileiro com base na teoria marxiana. Dentre suas principais obras, além desta que resumiremos abaixo, podemos citar: a) Formação do Brasil Contemporâneo; b) A Revolução Brasileira; c) História Econômica do Brasil; d) O que é Filosofia. Caio Prado faleceu em São Paulo no dia 23 de novembro de 1990. 


Evolução Política do Brasil: colônia e império - Caio Prado Júnior - Editora Brasiliense




Introdução - O presente livro foi publicado em 1933 e tinha como objetivo fazer uma síntese da história do Brasil. A obra revolucionou à historiografia brasileira ao trazer uma perspectiva onde o protagonista dos acontecimentos não eram mais os grandes personagens que representavam as classes dominantes, mas as massas com suas pautas reivindicatórias. Livro fino, é dividido em 04 capítulos. São eles: 01) A Colônia, analisando o país de 1500 até os conflitos contra os holandeses; 02) A Colônia, analisando o país dos conflitos contra os holandeses até à Independência em 1822; 03) A Revolução, analisando o país da vinda a partir da vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil até o Segundo Reinado; 04) O Império, analisando todo o Segundo Reinado até a Proclamação da República em 1889. 

Já no prefácio (correspondente a sua 1º edição em 1933), Caio Prado afirma não ser à obra uma história do Brasil. Por seu pequeno tamanho, seria um simples ensaio sobre os principais acontecimentos históricos que marcaram o país. Esse ensaio trás uma perspectiva histórica diferente, sua análise não se baseia na simples descrição de fatos históricos enaltecendo figuras ligadas as classes dirigentes. O formato de ensaio, curto e resumido também é interessante por conseguir abarcar uma maior variedade de leitores que uma obra mais específica, grande e com riquezas de detalhes não poderia alcançar. 

Capítulo 01 -  A Colônia

Esse primeiro capítulo é dividido em quatro partes, resumidas abaixo: 
  • Caráter Geral da Colonização - Burguesia comercial portuguesa; rápido abandono; Capitanias Hereditárias; Governos Gerais; Sesmarias; Inexistência de Feudalismo. 
  • A Economia Colonial - Predomínio rural; Grande propriedade agrícola; Comércio frágil e ambulante; Industria frágil e necessidade de importar dos engenhos; Combate a pequena propriedade rural. 
  • A Sociedade Colonial - Senhor de engenho; Pequenos proprietários; Semiescravos; Escravos.
  • Estatuto Político da Colônia - Senhores de engenho; Câmaras Municipais. 
Em Caráter Geral da Colonização, Caio Prado vai debater os primeiros anos da colonização brasileira, indo de 1500 até a instituição do Governo Geral. De imediato, o autor destaca a dificuldade encontrada por Portugal (país pequeno, pouco populoso e que vivia do comércio) em explorar um grande e desconhecido território como o Brasil. A expansão portuguesa, liderada por sua burguesia comercial, não tinha como motivo principal o excesso populacional. Pelo contrário, a burguesia portuguesa saía do país em busca de lucro que no seu próprio território não era possível obter. O início da hegemonia portuguesa começa em 1415, quando ocupam Ceuta em África. De lá, chegam na Ásia e são nas Índias onde encontram produtos valiosos. Logo, o objetivo de Portugal era dominar o comércio com as Índias. O achado de Pedro Álvares Cabral não era a prioridade portuguesa e por isso os 30 primeiros anos foram de total abandono da região. Porém, por conta das ameaças francesas que já contrabandeavam na costa brasileira, Portugal decide finalmente ocupar o Brasil mesmo que servisse apenas como território reserva para possíveis necessidades futuras. 

A coroa portuguesa instala então o sistema das Capitanias Hereditárias, dando a colonos oriundos de Portugal a responsabilidade para explorar e defender o território. O mesmo fizeram nas colônias de Açores e Madeira, entretanto, diferente desses locais aqui as Capitanias Hereditárias não deram certo. O território brasileiro era extenso para uma empreitada privada dar conta de sua preservação e exploração. Por isso, "quando é instituído o governo geral (1549) pode-se dizer que praticamente só vingara a colonização em Pernambuco, ao norte, e São Vicente, ao sul" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 13). Para Caio Prado, o sistema de Capitanias Hereditárias tinha semelhanças com o feudalismo tendo em vista que o donatário não poderia obter direito sobre à terra que era apenas cedida pela coroa. (Caio não aprofunda no texto, mas antes de receber a terra, o donatário assinava a Carta de Doação que dava a ele o direito de passar a sesmaria recebida para seu filho mas sem o direito de venda. Em troca, deveria fundar vilas, estabelecer a ordem e construir engenhos no local. E também assinava a Carta Foral, onde legitimava um conjunto de impostos a serem pagos para a coroa). Porém, esse ensaio de feudalismo foi morto com o fim do sistema das Capitanias Hereditárias e com a implantação do Governo Geral que teria a Bahia como sede.

E o que exploraria o colono nesse novo território? Basicamente a superfície do solo e seus recursos naturais, tendo em vista que não tínhamos um avanço civilizatório parecido com as Índias que detinha um forte desenvolvimento do comércio. Logo, os portugueses que até então se dedicavam majoritariamente ao comércio se voltam para à agricultura e à pecuária. Já sob o Governo Geral, Caio afirma que as relações feudais existentes nas Capitanias Hereditárias são extintas, pois a sesmaria tornara-se alodial ao proprietário saindo de qualquer tipo de relação dependente. A obrigação era explorar a terra doada e pagar simples impostos como a Ordem de Cristo. E quem eram os colonos que recebiam as terras? Eram colonos abastados, aqueles que tinham condições de explorar a terra sendo esse o interesse da coroa. Logo, diferentemente do ocorrido no feudalismo na Europa, a mera posse da terra não significava muita coisa. Enquanto que lá o poder era centrado na posse da terra, aqui era centrado nos meios de se explorar essa terra ganhando assim uma formação diversa da européia. 

A Economia Colonial, se baseava na grande propriedade agrícola mantida sob trabalho escravo e objetivando a exportação de seus produtos. Como exemplos dessa grande propriedade agrícola, Caio cita: as lavouras de cana, os engenhos de açúcar e a pecuária nos latifúndios. Tudo isso mantido sob o trabalho escravo, primeiro do indígena e posteriormente do negro. A pequena propriedade não teria espaço fértil no Brasil Colônia e por um conjunto de motivos. O principal é que "o trabalho livre de pequenos lavradores não podia concorrer na rude tarefa do desbravamento de uma terra ainda virgem e nas primitivas culturas e produções aqui adotadas com o grosseiro trabalho escravo" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 13). O alto custo para montar um engenho, por exemplo, que necessitava de grande investimento (mão-de-obra e equipamentos) impossibilitava o crescimento desses pequenos produtores. Por fim, os pequenos produtores ainda encontravam um mercado interno pífio que impossibilitava o consumo dos seus produtos. Nos anos iniciais do Brasil Colônia, a população residente era majoritariamente composta por escravos ou semiescravos. A grande propriedade rural produzia de forma suficiente para seu consumo, não necessitando de abastecimento externo. Para completar, a comunicação arcaica (onde basicamente se vivia num certo isolamento); inexpressividade dos centros urbanos contribuía para a ruína do pequeno produtor e constantes conflitos com os indígenas e grandes proprietários formam uma teia de dificuldades para os pequenos produtores aqui reunidos. 

Seguindo os princípios do materialismo histórico e dialético de Karl Marx, o autor constata que A Sociedade Colonial é apenas um reflexo da produção material. Logo, quem está no topo da sociedade colonial não poderia ser outra classe a não ser os senhores de engenho, donos das grandes propriedades agrícolas e que lucravam bastante com o privilégio do Brasil ser até então o único exportador de açúcar do mundo. A massa popular era composta pelos escravos, indígenas e depois negros. O trabalho escravo indígena foi a primeira forma encontrada pelos colonos, tendo algumas tribos até se voluntariado ao trabalho. Sobre a mão-de-obra escrava indígena, Caio destaca um pouco mais. Primeiro relatando o papel das chamadas "bandeiras", onde os portugueses adentraram no interior do Brasil com o intuito de forçar os índios a trabalharem. Depois ele debate o surgimento dos jesuítas - religiosos que queriam inserir o índio na civilização de forma pacífica - que irão entrar em conflito com os interesses dos senhores de engenho. É instituído uma "proteção" legal aos índios, sendo esses escravizados só por meios de "guerras justas". A verdade é que o trabalho indígena, antes mesmo de ser proibido por Pombal no Século XVIII, já era evitado nas grandes propriedades rurais tendo em vista a indisciplina do índio para o trabalho escravo. Ele era pouco resistente, indisciplinado e facilmente conseguia fugir. Com isso, a mão-de-obra negra ganhou hegemonia no trabalho escravo. 

Sobre a mão-de-obra negra, não se sabe ao certo quando começou sua instalação. Mas sabe-se que foi desde os primeiros anos do Brasil Colônia, tendo em vista o uso do negro como escravo em Portugal. Diferente dos índios, o negro não tinha a proteção da Igreja e eram comparados a bestas. Além do pequeno proprietário (raro) que já mencionamos, temos os chamados agregados. São homens pobres, escravos libertos ou mestiços livres, que vivem em função da grande propriedade agrícola. Eles ocupam atividades que vão desde mensageiros até seguranças do latifúndio. Dentre esses agregados encontramos os rendeiros, homens que alugam as terras do senhor de engenho pagando em dinheiro ou em produtos e sendo totalmente dependentes destes. Ainda encontramos os assalariados, pessoas com um mínimo de conhecimento técnico e que trabalhavam nos engenhos como os feitores. Como podemos observar, a estrutura social do Brasil Colônia era simples e fruto de uma economia agrária e fundada na grande propriedade agrícola. Temos, 
"De um lado os proprietários rurais, a classe abastada dos senhores de engenho e fazenda; doutro a massa da população espúria dos trabalhadores do campo, escravos ou semilivres. Da simplicidade da infra-estrutura econômica - a terra, única força produtiva, absorvida pela grande exploração agrícola - deriva a estrutura social: a reduzida classe de proprietários, e a grande massa que trabalha e produz, explorada e oprimida" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 28/29). 
O Estatuto Político da Colônia não poderia estar em outras mãos a não ser dos senhores de engenho, aqueles que dominavam a economia e estavam no topo da sociedade colonial. Seu domínio político seria apenas uma consequência, sendo legitimado pela completa omissão ou desinteresse que a metrópole tinha do Brasil. O que bastava a metrópole era ter portugueses aqui, explorando o território e defendendo-o de estrangeiros. Não era a prioridade da coroa a exploração do Brasil e por isso os senhores de engenho terão carta-branca nos anos iniciais da colonização. Era uma espécie de reconhecimento por aqueles que "desbravavam o território - ou faziam-no desbravar - conquistando-o palmo a palmo aos indígenas e aventureiros de outras nações que aqui se instalavam" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 30). A principal e única instância de poder do Brasil Colônia eram as Câmaras Municipais, descentralizadas por toda colônia e completamente dominadas pelos senhores de engenho que eram os únicos que tinham o direito a voto. Nessas Câmaras eles decidiam basicamente tudo relativo a colônia, até mesmo proporem ou recusarem impostos reais. Essas Câmaras não tinham uma unidade, tendo cada região a sua. Encerrando o primeiro capítulo, Caio conclui que nessa fase inicial da sociedade colonial então em formação a principal característica política era a descentralização, tendo apenas um domínio comum na teoria. 

Capítulo 02 - A Colônia

Esse segundo capítulo é dividido em duas partes:
  • Novas Condições Econômicas - Crescimento econômico; descoberta do ouro; Portugal em crise; parasitismo lusitano.
  • Novas Formas Sociais e Políticas - Declínio dos latifundiários; crescimento da burguesia comercial; declínio das Câmaras Municipais; ascensão dos Governadores; aguçamento das rivalidades entre brasileiros e portugueses.
Em Novas Condições Econômicas, podemos observar as mudanças econômicas que sofreram Brasil e Portugal no fim do Século XVII. A paz que reinou no início do processo, tendo em vista o inimigo comum que eram os indígenas e em seguida a ocupação holandesa, acabou com a expulsão dos últimos em 1654. As diferenças entre os brasileiros e os portugueses começam a se acentuarem, primeiro pelo crescimento econômico da colônia não só com a exportação do açúcar mais também pela descoberta do ouro em fins do Século XVII. E segundo pela crise que vivia Portugal, fracassado o comércio com as Índias de que tanto dependiam. O crescimento da colônia e a crise da metrópole, faz com que surja o fenômeno do parasitismo lusitano.

Buscando sugar a colônia em crescimento, Portugal passa a aumentar as restrições comerciais do Brasil que já existiam desde o início da colonização. Não só ocorreu um aumento quantitativo, mais também qualitativo com uma maior fiscalização do que saía e entrava em solo brasileiro. Em 1661, Portugal proíbe que o Brasil comercialize com estrangeiros. Em 1684 proíbem a ida de qualquer navio brasileiro a portos estrangeiros. E em 1711 chegam a proibir que brasileiros vão a países estrangeiros. A coroa, com essas ações, limitava o comércio brasileiro a Portugal que passava a ser o intermediário de todas as negociações. O controle da coroa aumenta no decorrer do século XVII e tem seu auge após a descoberta do ouro e depois do diamante. Destaca o autor que "o regime das minas era o mais opressivo possível. Proibia-se a qualquer pessoa a entrada e saída dos distritos dos mineiros sem expressa licença das autoridades; as perquisições  nos domicílios dos moradores para a descoberta de desvios eram constantes; havia um regime especial para fiscalizar a extração e condução do ouro; fechavam-se todas as estradas que levavam às minas..." (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 37). Para completar a asfixia, a metrópole impedia qualquer desenvolvimento industrial do Brasil, evitando os prejuízos dos manufatureiros lusitanos. 

É claro que essas mudanças econômicas, trariam consigo mudanças sociais e políticas. É o que Caio debate em Novas Formas Sociais e Políticas. As mudanças econômicas ditas acima, terá como resultado imediato a formação de uma nova classe social na colônia: a burguesia comercial que foge da crise vivida na metrópole. Essa burguesia comercial passa a concorrer com os já instalados proprietários rurais. Esse conflito fica nítido quando observamos o crescimento da cidade do Recife, vinculada ao comércio, em detrimento de Olinda que era onde se concentrava a aristocracia. Nessa conjuntura, o comércio do açúcar sofre uma queda pela concorrência que o Brasil passa a sofrer de outras colônias. A América Central, sob domínio espanhol ou inglês, também passava a produzir o produto. Era a queda dos grandes proprietários rurais. Já a nova burguesia comercial que surgia, se distanciava da agricultura e não tinha capital suficiente para arcar com as despesas que essa produção exigia. Essa leva de imigrante partiam para as recém-descobertas minas ou rumavam para o comércio onde tinham mais contato. No comércio, esses imigrantes encontraram privilégios estabelecidos pela coroa e logo dominariam a atividade. Essa situação onde os estrangeiros dominam o comércio do Brasil permanece até a Independência, sendo os comerciantes nativos prejudicados pela coroa. 

Surge então uma oposição entre comerciantes reinóis, representantes e principais beneficiados do reino que proibia a atuação de comerciantes estrangeiros no Brasil, e os grandes proprietários de terra outrora dominantes na colônia. A concorrência internacional do açúcar, o foco na recém-descoberta mineração e os prejuízos causados pelas guerras holandesas foram os fatores principais do declínio dos latifundiários que se viam endividados. Os credores? Os comerciantes reinóis. O conflito mor que exemplifica bem essa oposição é a Guerra dos Mascates (1710-1711) que ocorreu na capitania de Pernambuco envolvendo os proprietários rurais ligados à Olinda e os mascates (comerciantes portugueses) ligados a Recife. 

No plano político, os grandes proprietários encontram de imediato o crescimento da influência dos comerciantes reinóis nas Câmaras Municipais. Mas o destaque desse período é a queda de influência das Câmaras Municipais que vão dar lugar a representações mais incisivas da coroa sobre a colônia, sendo os governadores seus representantes diretos. Esses governadores, antes omissos, aparecem como figuras mais ativas e autoritárias a partir de fins do século XVII. "Já não são mais os humildes funcionários que se curvam ante as câmaras, atendendo prontamente a seus desejos, e usando da maior diplomacia para não melindrar os colonos todo-poderosos" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 43). Estava posta o conflito que permearia o Brasil Colônia e que teria na Independência, em 1822, seu desfecho final. Com as próprias palavras do Caio, podemos resumir essa segunda fase da era colonial: 
"A nossa evolução política segue portanto passo a passo a transformação econômica que se opera a partir de meados do século XVII. Esta transformação, que se define pela maior penetração econômica da metrópole, repercute no terreno político pelo desaparecimento gradual da nossa autonomia local do primeiro século e meio da colonização. Desloca-se a autoridade das mãos dos proprietários territoriais, a antiga classe dominante, para as da Coroa portuguesa. E é nesta que ela vai se consolidar. Despojam-se as câmaras sucessivamente, como vimos, de todas as suas prerrogativas, e a elas se substitui a onipotência dos governadores" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 44).
Capítulo 03 - A Revolução

O mais longo dos capítulos, Caio Prado divide-o em sete partes: 
  • D. João VI no Brasil - Vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil; Abertura dos portos para os ingleses; Revolução do Porto; formação do Partido Português e Brasileiro.
  • Organização do Estado Nacional: a Assembléia Constituinte de 1823 - Monarquia como instrumento da classe dominante; projeto constituinte de 1823; fechamento da Assembléia Constituinte por D. Pedro I.
  • O Primeiro Reinado - Constituição de 1824 e poder nas mãos do Partido Português.
  • A Menoridade - Abdicação de D. Pedro I; Isolamento dos que querem a recolonização do Brasil; disputa política entre grandes proprietários rurais x setores populares sem propriedade; período regencial.
  • A Revolta dos Cabanos no Pará e a Regência de Feijó
  • A Revolta dos Balaios e a Agitação
  • A Trajetória Reacionária de 1837 a 1849 - Golpe da Maioridade; trono assumido por D. Pedro II.
A vinda da família real portuguesa é debatida por Caio Prado em D. João VI no Brasil, sendo esse acontecimento central na Independência do Brasil. Para o autor, nos diferenciamos dos demais países do continente pois nosso processo de independência surgiu através de um acordo, pacífico e não foi oriundo de uma luta armada. Nossa independência surge de um processo capitaneado pelo próprio governo metropolitano e o começo desse processo acontece em 1808 com a vinda da coroa portuguesa ao Brasil. Na conjuntura internacional, tínhamos Portugal em franca decadência. A fuga da família real portuguesa das tropas napoleônicas é o exemplo claro dessa fragilidade lusitana. Inversamente, a Inglaterra se erguia como a principal potência mundial e desejava a abertura do comércio brasileiro, então monopolizado pelos portugueses. Após abandonar sua terra natal e rumar para sua colônia com ajuda inglesa, o governo lusitano se viu cada vez mais dependente da Inglaterra. Com isso, após embarcados em solo brasileiro, a primeira iniciativa dos portugueses foram abrir os portos brasileiros para "nações amigas", vulgo, a Inglaterra. Por isso, Caio considera que "a independência brasileira seria antedatada de quatorze anos, e se contaria justamente da transferência da Corte em 1808" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 47)

As ações de D. João VI, beneficiando os ingleses e praticamente selando a Independência do Brasil, gerou inconformismo em Portugal. Protestando contra essas medidas, estoura a chamada Revolução Constitucional do Porto, que teria "uma de suas preocupações máximas consistirá em reconduzir o Brasil ao antigo regime de colônia" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 48). A frágil indústria portuguesa, não teria a mínima chance de concorrer com a sofisticada e desenvolvida indústria inglesa que agora tinha liberdade para atuar no Brasil. Era o fim do parasitismo lusitano. No Brasil, a burguesia comercial ligada aos interesses coloniais e que imigraram para à colônia após o fim com o comércio nas Índias, se levantaram a favor da Revolução do Porto e contra as medidas de D. João VI. Com a eclosão e repercussão da Revolução do Porto, as forças políticas no Brasil se organizaram da seguinte forma: 
  • Partido Português - setores vinculados aos benefícios causados pelo regime colonial, basicamente composto pela burguesia comercial portuguesa e todas as forças residentes na metrópole; 
  • Partido Brasileiro - setores prejudicados pelo regime colonial, basicamente composto pelos grandes proprietários de terra residentes no Brasil e que se mostrou contra as ideias da Revolução do Porto. 
As massas populares, composta por escravos ou semiescravos, ainda não tinham organização suficiente para se rebelar contendo pautas próprias. Já no embate entre o Partido Português e Brasileiro, "a reação recolonizadora, embora contando com o apoio da metrópole e das cortes portuguesas, será levada de vencida porque não era mais possível deter o curso da História" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 50). E é nesta conjuntura que avançará a emancipação política do Brasil e só apenas ela, sem qualquer tipo de reforma mais profunda que venha a beneficiar os setores populares da rígida sociedade colonial. O instrumento político do Partido Brasileiro será D. Pedro, filho de D. João VI que por conta da Revolução do Porto teve que retornar a metrópole.

Saindo dos antecedentes e partindo para o processo transitório que resultaria na Independência formal do Brasil em 1822, Caio debate em Organização do Estado Nacional: a Assembléia Constituinte de 1823, os meandros que resultaram na formação do Império Brasileiro. Respeitando sua concepção materialista e marxista da história, Caio adverte para o fato de que "é a superestrutura política no Brasil-Colônia que, já não correspondendo ao estado das forças produtivas e à infra-estrutura econômica do país, se rompe, para dar lugar a outras formas mais adequadas, às novas condições econômicas e capazes de conter a sua evolução" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 51/52). A Independência do Brasil que surge nessa evolução, é tratada por Caio Prado como resultado de um "arranjo político" negociado entre os setores dominantes da sociedade colonial, sem qualquer participação e benefício para os setores populares. Logo, a monarquia brasileira que surge com D. Pedro é um mero instrumento do Partido Brasileiro e por isso consiste numa formação histórica totalmente diferente da dada na Europa após o fim do Feudalismo. O Estado Nacional não é base para a monarquia, pelo contrário, a monarquia que vira instrumento desse Estado. 

Em 1822, o ocorre a Independência do Brasil da forma ordeira e negociada já debatida. E o que ocorre depois? Em 1823, ocorre a chamada Assembléia Constituinte que teria como função debater a constituição a ser vigorada no mais novo país independente. Caio Prado analisa os debates que brotam dessa Assembléia Constituinte, reforçando o caráter classista de sua análise sobre os acontecimentos. A Assembléia Constituinte foi fortemente influenciada pelas constituições inglesas e, principalmente, francesas. As ideias de Jean-Jacques Rousseau eram moda na elite nacional à época. O que os brasileiros pretendiam eram soberania nacional e liberdade econômica, princípios básicos das constituições burguesas e liberais que surgiram na Europa no século XVIII. Porém, diferente da Europa, os legisladores aqui eram formados por proprietários rurais e não pela burguesia industrial ou comercial. Dentre os pontos do projeto constitucional debatido em 1823, temos a forte xenofobia. Era preciso rechaçar o estrangeiro, principalmente o português, como forma de fortalecer o processo de emancipação política. Se não bastasse as tropas portuguesas resistentes na Bahia, Pará e Província Cisplatina, D. Pedro que era português e herdeiro direto do trono lusitano. Logo, era mais que necessário para os representantes do Partido Brasileiro se distanciar cada vez mais de sua antiga metrópole. Como resultado, tivemos no projeto constitucional "naturalização limitada, incompatibilidade dos naturalizados para os cargos da representação nacional" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 55). Limitar os poderes do imperador e do direito de voto, basicamente restringindo aos grandes proprietários de terra, também eram ideias em voga. Em suma, a nova constituição pensada no projeto constitucional de 1823 centrava suas forças em: afastar-se de Portugal, silenciar as classes populares e a burguesia comercial então beneficiada pela antiga estrutura colonial, concentrar o poder nas mãos do parlamento reduzindo assim as atribuições do imperador. Era o liberalismo aos moldes dos latifundiários escravistas. 

Essas ideias proferidas pelos brasileiros no projeto constitucional não agradou D. Pedro que, com medo de virar figura decorativa, vira às costas para seus antigos aliados e se solidariza com seus compatriotas portugueses que passam a defender poderes absolutos ao imperador. Após a independência, as diferenças existentes no chamado Partido Brasileiro se intensificam e ocorre uma divisão entre suas fileiras. A parte majoritária e que tinha atuação forte no projeto constitucional, era a dos grandes proprietários de terra que eram figuras socialmente conservadoras. Já a parte minoritária, composta por democratas radiciais vinculados a setores das classes populares, acreditavam que o processo de independência poderia servir para a eclosão de uma revolução que viesse a destruir as heranças coloniais por meio de reformas sociais profundas. Para Caio, essa parte minoritária buscavam mais destruir que construir, não tendo sua radicalidade a construção de um projeto real de poder. 

Agora próximo dos portugueses, D. Pedro fecha a Assembléia Constituinte em novembro de 1823, ação que vem significar uma recolonização do país. Logo, eis o dilema durante do O Primeiro Reinado: a tensão da recolonização do Brasil, tendo em vista a aproximação entre D. Pedro e os portugueses ligados aos interesses metropolitanos. Fechada a Assembléia Constituinte, D. Pedro chama uma comissão para elaborar um projeto constitucional em 40 dias. E "o novo projeto conservou em linhas gerais o sistema do anterior e do comum das constituições da época, de que aliás fartamente se inspirou. Constituiu sua única inovação de vulto a introdução de um quarto poder, o moderador, ao lado do executivo, legislativo e judiciário" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 61). As funções do Poder Moderador eram basicamente outorgadas sendo poder do imperador nomear senadores, ministros e vetar qualquer proposta do Poder Legislativo. Basicamente, a constituição outorgada em 1824 implantava uma espécie de governo absoluto do imperador. O Partido Português, então, governa durante o Primeiro Reinado implantando a supressão da liberdade de imprensa, loteando os cargos públicos e dominando o Banco do Brasil fundado em 1808. A tensão da recolonização e à farra dos portugueses, fizeram toda a opinião pública se voltar contra D. Pedro que - mesmo tentando acalmar os ânimos da oposição brasileira, oferecendo pastas em seu ministério - não arrumou outra saída a não ser abdicar para que assim se evitasse uma revolução no país. 

Em A Menoridade, Caio vai debater a conjuntura do país após a abdicação de D. Pedro I em 07 de abril de 1831. Primeiramente, Caio Prado trata o Primeiro Reinado como um período de transição onde as antigas forças coloniais resistem à nova situação política no país, mas são derrotadas pelas forças nativistas que com a abdicação de D. Pedro I se veem vitoriosas rumo a construção do Estado Nacional Brasileiro. A partir da abdicação, os que querem a recolonização se isolam da cena política, pois suas ideias de volta ao passado se tornam completamente irrealizáveis. Com isso, a disputa política é transferida para uma briga interna do Partido Brasileiro: o embate entre os grandes proprietários de terra x os setores populares sem propriedades. Passado o 07 de abril, as classes proprietárias e majoritárias do Partido Brasileiro passam a reprimir as ações políticas radicais dos setores populares sem propriedades. E, dentro desses setores populares, encontramos uma classe média ponta de lança na abdicação do imperador que se distancia dos movimentos iniciados por sua ação política quando esses ganham simpatia e participação das camadas mais baixas da sociedade brasileira. Por isso suas ações se limitam a tomada de poder local, não ganhando nenhuma dimensão nacional. Enquanto as camadas mais baixas da sociedade colonial, era impossível por suas condições objetivas de vida, que viessem a liderar de forma responsável um movimento. E, apesar de representarem 50% da sociedade brasileira:
"Os escravos, além de seu baixo nível intelectual - grande parte vinham diretamente das selvas africanas, e por isso em nada se diferenciava das populações ainda em completo estado de barbárie de que provinha - eram divididos por profundas rivalidades tribais do seu habitat de origem; muitas vezes nem ao menos falavam o mesmo idioma. Não formam por isso uma massa coesa, e não raro vemo-los tomarem armas uns contra os outros" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 67).
Já no dia seguinte a abdicação do imperador, os proprietários de terra se viam tendo que combater duas frentes: primeiro as possíveis reações dos portugueses e segundo as revoltas populares que assolaram o país. Mesmo que desorganizados, esses movimentos contestatórios causavam alvoroço e representavam uma ameaça revolucionária a setores que estavam satisfeitas com a simples emancipação política do Brasil de Portugal. Logo se cria a Sociedade Defensora da Liberdade e da Independência Nacional e em 03 de maio de 1831 se institui a regência, tendo o autoritário padre Diego Antônio Feijó como Ministro da Justiça. Entre as pautas dos revoltosos, estavam: reformas na constituição com o intuito de torná-la mais inclusiva, suspensão de funcionários públicos de origem portuguesa, exoneração do Ministro da Justiça e proibição da imigração portuguesa por 10 anos. Em meio as revoltas populares, os restauradores se organizam na Sociedade Conservadora (caramurus, como ficaram conhecidos) e tentam tirar proveito da instabilidade política do período regencial. Fracassados seus planos, são duramente reprimidos e que significa a exclusão quase que completa de suas forças na cena política nacional.

Em A Revolta dos Cabanos no Pará e a Regência de Feijó, Caio Prado trás pela primeira vez na historiografia brasileira o acontecimento político da Cabanagem. Em A Revolta dos Balaios e a Agitação Praieira, o autor também revoluciona ao trazer a Balaiada e a Revolução Praieira para a análise histórica. Eram, até então, acontecimentos esquecidos pela historiografia oficial. Em resumo, elencarei abaixo os principais pontos desses acontecimentos destacados por Caio Prado:
  • Cabanagem - Apesar de um movimento desorganizado, Caio destaca a Cabanagem pela amplidão que tomou. O Pará, sempre se mostrou rebelde por se manter sob domínio português após a Independência do Brasil. Apenas em agosto de 1823 é que o governo imperial consegue tomar o poder dos lusitanos na região. Após todo o Primeira Reinado de paz, surgem as revoltas. Com a regência em voga, os primeiros homens nomeados pela mesma não conseguem sequer embarcar em Belém para governar. Apenas na segunda tentativa, se instala Lobo de Sousa que de forma autoritária e propondo alistamento em massa, logo daria as bases para a eclosão do movimento. Das agitações pela retirada de Lobo de Sousa, logo a classe média se afasta do movimento por sua radicalidade, mas isso nada impedi do movimento tomar o poder. Tomado o poder em Belém, nomeiam Félix Malcher que logo se inclinaria para as forças regenciais. Deposto e executado, Malcher dar lugar a Francisco Vinagre que logo repetiria seu antecessor. Novamente traídos, os cabanos tomam novamente o poder, mas logo seriam trucidados pelas forças regenciais. Apesar da derrota, Caio Prado destaca a Cabanagem como "o mais notável movimento popular do Brasil. É o único em que as camadas mais inferiores da população conseguem ocupar o poder de toda uma província com certa estabilidade" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 77)
  • Balaiada - Diferente da Cabanagem, a Balaiada que estourou na província do Maranhão não conseguiu tomar o poder se limitando apenas em dominar regiões. Sua base social eram de trabalhadores rurais, ligados à pecuária. Porém, o movimento se inicia nas cidades através dos conflitos entre latifundiários e classe média urbana. Foi através do jornal Bem-Te-Vi que a classe média incendiou a província, mas logo se afastaria do movimento que causou por conta da simpatia ganha dos setores mais baixos da sociedade. Em vez de organizar uma centralização, a Balaiada logo se enveredou pelo caudilhismo onde ocorria "a cristalização de grupos sertanejos em torno de chefes, formando assim apenas bandos armados que percorrem o sertão em saques e depredações" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 79). O resultado desse tipo de ação foi a distância das massas com o crescimento desse "bandoleirismo" e a fácil desarticulação do movimento que se encontrava desarticulado em pequenos grupos armados. Junto a isso, os balaios não souberam aproveitar os constantes levantes de escravos na região, podendo o movimento ganhar uma adesão quantitativa maior do que apresentou. Em 1840, logo seria totalmente reprimida pelo novo presidente da província: Luís Alves de Lima e Silva, mais conhecido futuramente como Duque de Caxias; 
  • Revolução Praieira - Em Pernambuco, imperava um forte concentração de terra onde a família dos Cavalcantis detinham a maior das posses. Junto a essa classe de proprietários rurais, somava uma burguesia comercial portuguesa que usava o intenso comércio na província como meio de enriquecimento. Aos brasileiros e, em específico, para as classes médias urbanas sobraria apenas descontentamento. Organizados na Rua da Praia, através do jornal Diário Novo, a classe média logo toma o poder da província com Chichorro da Gama que é indicado ao cargo de presidente em 1845. Começa uma série de repressões, tanto aos grandes proprietários rurais quanto aos comerciantes portugueses. Articulados, a reação reacionária logo retorna ao poder só restando aos revolucionários a resistência armada. Porém, diferente dos demais movimentos, a Revolução Praieira em Pernambuco tinha um programa (com luta pelo voto livre e universal, liberdade de imprensa, garantia de trabalho para brasileiros, limitação da ação dos comerciantes portugueses, extinção do Poder Moderador etc) mas não obtiveram homens suficientes e por isso foram facilmente reprimidos quando tentaram radicalizar. 
Por fim em A Trajetória Reacionária de 1837 a 1849, Caio Prado debate em como se comportaria a classe dominante após a repressão total dos movimentos populares que marcaram o período regencial. Passado esse período e dado o golpe da Maioridade, onde assume o trono D. Pedro II, a estabilidade reina no país com o silenciamento das classes populares. A centralização do poder e a reforma eleitoral que segregou ainda mais o direito ao voto, permitiram que as disputas políticas na segunda metade do século XIX se limitassem a classe dominante, então divididas entre "liberais" e "conservadores". 

Capítulo 04 - O Império

O último capítulo do livro é dividido em duas partes:
  • O Segundo Reinado - Fim do tráfico negreiro; disputas entre grandes proprietários rurais x burguesia comercial; debate pela abolição da escravidão. 
  • O Fim do Império - Inclinação do Império as pautas conservadoras em declínio. 
Em O Segundo Reinado, Caio Prado debate o reinado de D. Pedro II que vem assumir o Brasil após o Golpe da Maioridade deflagrado em 1840, pondo fim ao então período regencial. O Segundo Reinado será permeado pelo debate da abolição da escravidão que começa a ter fim com a inicial proibição do tráfico negreiro, exigido pela Inglaterra. O modo de produção estabelecido no Brasil, necessitava do trabalho escravo para sobreviver. Interesse antagônico aos dos ingleses que, já em outra fase do capitalismo, enxergava a importância de substituir trabalho escravo por trabalho assalariado. A partir de 1850, a Inglaterra exige o fim do tráfico negreiro no Brasil chegando a ameaçar atacar o país militarmente em caso de descumprimento das recomendações. Ela foi seguida pelo ministro Eusébio de Queirós que, num prazo de 02 anos, estancou o tráfico negreiro no país. Com o combate à prática, os capitais passaram a se transferir do tráfico de seres humanos para o comércio. A consequência disso foram "as emissões bancárias, de pouco mais de 1.000 contos em 1850, crescem para quase 20.000 em 1854" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 93). Junto a isso, temos o contato do Brasil com algumas invenções criadas durante a Revolução Industrial. As estradas de ferro chegam aqui em 1854, ligando Mauá a Fragoso. E telégrafo chega em 1852. Caio admite ser simplista vincular a proibição do tráfico negreiro ao contato do país com traços da modernidade que se desenvolvia na Europa, porém, é fato que a obediência às ordens ingleses fez o Brasil adentrar cada vez mais na economia mundial ganhando com isso benefícios. A partir de 1850, começa a se desenvolver no país uma burguesia endinheirada que aproveitava o momento de prosperidade econômica para juntar fortuna. 

A principal disputa no Segundo Reinado se configura entre: latifundiários dependentes do trabalho escravo de um lado e comerciantes burgueses de outro. Esses burgueses, eram donos do chamado "capital móvel" e tinham se adaptado as novas feições do capitalismo internacional. Por isso enriqueciam, o contrário dos proprietários rurais presos e dependentes do trabalho escravo que sofria forte impacto após o fim do tráfico negreiro. O debate trabalho escravo x trabalho livre, permeará todo o Segundo Reinado sendo o primeiro um empecilho para o desenvolvimento do país. Uma das consequências da permanência do trabalho escravo, eram os baixos índices de imigração que tinha o Brasil naquela época. Os latifundiários faliam, aos poucos. Sem o tráfico negreiro, o escravo tornava-se mercadoria cara e apenas os proprietários ligados ao café (produto agrícola em alta) conseguiam capital suficiente para se manter. E o café se concentrava no Sudeste (São Paulo e Rio de Janeiro), ocorrendo uma transferência de escravos para essas regiões. Logo, "não é pois de se admirar a primazia que teve o Norte na Abolição, quer alforriando seus escravos em massa, quer decretando-a como o Ceará e o Amazonas em 1884" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 98)

Após a Guerra do Paraguai, a situação do trabalho escravo no Brasil se torna insustentável e apenas nas regiões do café permanecia o regime. Isolados, minoria e se rendendo a nova conjuntura esses latifundiários escravocratas se viram varridos pela marcha da História tendo a Lei Áurea dado um ponto final apenas formal. Como Caio destaca, a libertação dos escravos aqui não surgiu de uma luta emancipatória e humana, mas de interesses puramente econômicos que exigiam das classes dominantes novos comportamentos. Era preciso modernizar a economia e ela foi modernizada com o fim do tráfico negreiro e a consequente fim da mão-de-obra escrava. Porém, as reformas deveriam se espalhar para o âmbito político e isso implicava uma reestruturação do Estado Nacional totalmente atrasado frente as novas demandas nacionais e internacionais. Estava chegando a hora de acabar com o Império... 

Em O Fim do Império, Caio Prado encerra sua obra debatendo rapidamente as razões de sua derrocada frente as forças republicanas. O Império se mostrou impotente frente a nova conjuntura e, baseado em estrutura arcaicas, apenas trabalhava com redução de danos retardando o avanço do país que mais cedo ou mais tarde viria. D. Pedro II é descrito pelo autor como uma figura comandada, um instrumento dos setores conservadores da sociedade brasileira e que "nunca passou de um bom, e mesmo se quiserem, de um ótimo burocrata" (JÚNIOR, Caio Prado. São Paulo, 1994, Brasiliense, p. 101). Entre avançar nas reformas progressistas propostas por setores da classe dirigente que se beneficiavam com a nova conjuntura, o Império optou por agradar os conservadores em declínio. Os liberais levantavam suas bandeiras de reformas das instituições de 1866, porém, foi opção de D. Pedro II seguir com a agenda conservadora em 1868. E isolado, resistente a marcha da História, só bastaria uma passeata militar para que a República fosse proclamada.